Ponto de vista de Vitória Clarke.
— Ei, você! — A voz cortante de uma mulher alta, com rabo de cavalo loiro, atravessou a sala. — Limpe isso. — Ela apontou para os cacos de vidro espalhados no chão. — Não sou empregada, sou a babá da Allegra. — Estou mandando limpar agora! — Bianca Ambrosio, a modelo e atriz famosa, ordenou com desprezo. — Não! — Minha voz saiu firme, apesar do nó na garganta. — Como ousa? — Ela avançou conforme me fuzilava com aqueles grandes olhos inquisidores. Antes que a tensão explodisse, um homem entrou na sala. Maximus trevisani usava um terno cinza feito sob medida, tinha uma postura imponente e um olhar gelado que paralisava qualquer um. Ele raramente aparecia, e para mim, era um chefe que jamais notou a minha existência. — Faça o que a minha noiva mandou. — Sua voz era um comando implacável. Foi só então que percebi a faixa com mancha se sangue envolta na mão do senhor Trevisani. — Anda, garota, o que está esperando? — Bianca estalou os dedos, exigindo. Meu orgulho gritou, mas a realidade esmagadora falou mais alto: precisava daquele emprego. Resignada, eu me ajoelhei para recolher os cacos de vidro. — Depois disso, vá cuidar da Allegra. A minha sobrinha não para de chorar. — Após dar ordem, ele virou as costas e saiu. Eu ainda juntava os cacos quando senti algo frio escorrer pelo meu cabelo. — Você é só uma serviçal — Bianca disse, despejando o resto do uísque sobre mim, sorrindo com crueldade. O som dos saltos da noiva do chefe ecoou até desaparecer pela porta. — Ai! — Mordi o lábio quando um pedaço de vidro cortou meu dedo. — Vitória, a governanta exige que você vá cuidar da sobrinha do chefe. — Uma colega falou, com aquele tom que indica “não estou aqui para fazer amizade”. — Ainda tenho que limpar isso... — levantei, meio tonta. — Vai cuidar desse corte e deixa que eu acabo aqui — a mulher de uniforme disse com autoridade. — Mas que cheiro é esse? Você bebeu? — Jogaram bebida em mim — respondi, segurando o dedo que sangrava. — Vai logo, antes que a governanta reclame com o senhor Trevisani. Fui para o banheiro de serviço, encarando meu reflexo. Encarei a garota que tinha só vinte e três anos, mas já tinha bolsas em volta dos olhos. Os olhos verdes cintilavam com as lágrimas. Queria sair daquele emprego desde que minha antiga patroa morreu; mas eu ainda sonhava com a faculdade de Direito, mas primeiro precisava cuidar da minha avó e pagar as contas do hospital. Lavei o corte, depois o rosto. Prendi o cabelo molhado úmido em um coque frouxo. Respirei fundo antes de encarar mais um dia naquela mansão de mármore, lustres de cristal e quadros caros. Eu era só a babá da Allegra — uma menininha de quatro anos que perdeu a mãe muito cedo... talvez fosse por isso que se apegou tanto a mim. De certa forma, também me sentia meio órfã do mundo, já que a minha mãe me abandonou com a minha vó e o meu pai se casou com outra mulher e esqueceu da minha existência. No segundo andar, o choro da pequena Allegra se intensificava. Entrei e a menina estendeu os bracinho — Oi, anjinho! — tentei pegar Allegra, mas a governanta se afastou. — Você tomou uísque antes de trabalhar? — A mulher perguntou, desconfiada. — Não, senhora Baker... Caiu um pouco em mim enquanto limpava o chão. — Tentei justificar, mas aquela mulher era irredutível. Allegra chorava desesperada, e a governanta não me deixou chegar perto. O rosto da pequena, vermelho e banhado em lágrimas, partia meu coração. — Vou contar para o senhor Trevisani que você está bêbada. — A voz fria soou quando ela cruzou a porta. Corri atrás, desesperada para explicar. Não podia perder aquele emprego.