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Capítulo 7 — O Peso do Instinto

(POV Selene)

O depósito parece diferente à luz da manhã.

As sombras não escondem tanto, mas o ar continua pesado, como se os tijolos soubessem o que aconteceu ali na noite passada.

Ivy deve estar desesperada, pensando que eu sumi, mas eu não tenho coragem de ligar. O que eu diria? “Oi, tia, descobri que sou um tipo de monstro, beijos”?

Dorian está encostado na parede oposta, braços cruzados, olhar fixo em mim como se pudesse ler meus pensamentos. Ele não diz nada. Não precisa. O silêncio dele é tão incômodo quanto as verdades que ele já me jogou.

— Não vou conseguir dormir nunca mais — murmuro, mais para mim mesma do que para ele.

— Vai — ele responde, como se fosse um fato. — Depois que seu corpo entender quem você é.

Reviro os olhos.

— Ah, claro. Porque isso é tão simples.

Ele dá um meio sorriso que não tem humor nenhum.

— Nunca disse que seria simples.

Antes que eu possa retrucar, passos pesados ecoam pelo corredor. Ronan entra, carregando uma caixa grande de madeira. Ele não fala comigo, não me olha — só coloca a caixa no centro da sala com um estrondo que me faz pular.

— Vai começar agora? — pergunto, tentando soar firme, mas minha voz denuncia o nervosismo.

— Se quiser sobreviver, sim — Ronan responde, seco, abrindo a caixa e revelando armas, pedaços de metal e coisas que parecem mais ferramentas de tortura do que de treinamento.

Meu estômago revira.

— Eu não sei usar nada disso.

— Vai aprender — ele diz, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.

Dorian se afasta da parede, o olhar duro em direção a Ronan.

— Ela não precisa disso agora.

— Precisa sim. — Ronan não baixa a voz. — Ela matou dois caçadores na noite passada. O cheiro dela está em toda parte. Se não souber se defender, vai acabar morta antes do fim da semana.

As palavras dele são frias, mas verdadeiras. Eu sinto isso.

— Então me ensina — digo, antes que o medo me faça calar. — Se todo mundo quer me matar, eu não vou ficar parada esperando.

Ronan finalmente me encara. Os olhos dele são de um tom estranho, um castanho tão escuro que parece negro. Ele me olha como se me medisse, como se estivesse calculando cada centímetro da minha coragem.

— Vamos começar devagar — ele diz, pegando dois bastões de madeira e jogando um para mim. — Se não aguentar, desiste agora.

Eu pego o bastão, o peso dele estranho nas minhas mãos.

— Não vou desistir.

Ele arqueia uma sobrancelha, como se não acreditasse em mim, mas não comenta.

— Pés firmes. — Ele se posiciona à minha frente, corpo sólido, olhar atento. — Ombros relaxados. Se tensionar, vai perder equilíbrio.

Eu tento imitar a postura dele. Não deve estar nem perto do certo, mas ele não corrige. Só começa a se mover, devagar, batendo o bastão no meu, testando meus reflexos.

— Você pensa demais. — A voz dele é baixa, mas não é um insulto. — Se pensar, perde.

— Desculpa se eu não nasci sabendo lutar — rebato, a raiva escorrendo na voz.

Ele para. Por um segundo, acho que exagerei. Mas então ele dá um meio sorriso, rápido, quase imperceptível.

— Pelo menos tem fogo — murmura, antes de avançar de novo, mais rápido dessa vez.

O impacto dos bastões ecoa pelo depósito. Eu quase caio, mas me seguro. Ele gira, bloqueia, e eu tento acompanhar, cada músculo do meu corpo gritando em protesto.

— Respira — ele ordena. — Sente antes de se mover.

Eu fecho os olhos por um segundo, tentando não pensar. Tentando só... sentir. E algo muda. O barulho ao redor diminui, o cheiro de metal e poeira fica mais intenso, e os passos dele... lentos, quase previsíveis.

Quando ele avança de novo, eu consigo bloquear. O impacto dói, mas não caio.

— Melhor — Ronan admite, com um aceno de cabeça.

— Ela não está pronta para isso. — Dorian, agora mais perto, a voz carregada de frustração. — Ela precisa de controle antes de força.

Ronan não olha para ele.

— Controle vem com prática.

— Controle vem com confiança — Dorian rebate, a tensão entre eles cortando o ar.

— Então talvez você devesse ensiná-la a confiar em alguém que não mente o tempo todo. — Ronan finalmente se vira, e por um segundo o olhar dos dois é pura guerra silenciosa.

Eu fico ali, no meio dos dois, como se fosse uma corda esticada prestes a arrebentar.

Caelan surge no corredor, apoiado no batente da porta, com aquele sorriso insolente.

— Adoro quando vocês brigam por causa dela — ele comenta, com um brilho divertido nos olhos. — É quase romântico.

— Sai, Caelan — Dorian rosna, sem desviar os olhos de Ronan.

— Só estou observando — ele responde, erguendo as mãos em rendição. — O cheiro dela está mudando. Vocês sentem?

Meu coração dispara.

— Cheiro? — Minha voz sai mais alta do que deveria. — O que tem de errado comigo agora?

— Nada de errado — Caelan sorri mais. — Só está... ficando mais nossa.

— Caelan! — Dorian dá um passo em direção a ele, mas o outro já está se afastando, rindo baixo.

Eu largo o bastão com força no chão.

— Chega. — Minha voz corta o ar, mais forte do que eu esperava. — Eu não sou “de vocês”. Eu não sou nada de vocês.

O silêncio que se segue é pesado. Ronan me observa, sério, os olhos escuros como a noite. Dorian, parado, parece prestes a dizer alguma coisa, mas não diz.

E, no fundo do corredor, a risada de Caelan ecoa como um lembrete cruel: eu posso tentar negar, mas algo em mim já começou a mudar.

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