Naquela noite, Aren sonhou.
Mas não era sonho.
Era o Norte sussurrando com duas vozes.
O frio entrou devagar, pela janela da tenda, arrastando um perfume conhecido — ferro, neve e lua.
Ele se levantou.
Do lado de fora, tudo parecia em silêncio, mas as sombras tinham formato.
Respiravam.
— Estás acordado — disse uma delas, surgindo da névoa.
Tinha seu rosto, mas sem luz nos olhos.
— Não mais do que tu — respondeu Aren.
— Então somos iguais.
— Não somos.
— Fomos.
O reflexo deu um passo, e o chão não o sustentou — ele flutuava, feito lembrança.
— Chamaram-me de sombra, mas sou o que o Norte cala.
Aren cerrou os punhos.
— E o que queres de mim?
— Nome.
O menino hesitou.
— Tu és o que não devia existir.
— E mesmo assim, existo. Nomeia-me.
Aren sentiu o ar pesado.
No fundo, sabia que negar não apagava.
Tudo o que não é nomeado volta com mais força.
— Então serás Kaen.
O reflexo sorriu.
— Kaen. A metade que fala quando tu te calas.
O som do nome ecoou como trovão distante