A casa não dormiu naquela noite.
Não porque houvesse barulho, mas porque o silêncio estava ativo demais, cheio de pensamentos circulando como vento preso. Cada quarto guardava uma versão diferente do mesmo acontecimento, e nenhuma delas estava completa.
O visitante partira sem promessas nem ameaças. Apenas deixou palavras soltas, daquelas que continuam falando mesmo depois que a porta se fecha. A mãe recolheu as xícaras esquecidas na sala com movimentos lentos, tentando organizar algo que não era físico. O pai permaneceu sentado por mais tempo do que o necessário, os cotovelos apoiados nos joelhos, o olhar fixo no chão como se ali houvesse um mapa invisível.
— Não era assim que eu queria — disse ele, por fim.
Ela respondeu sem virar o rosto:
— Nunca é.
Não havia acusação naquela frase, apenas constatação. Eles já tinham aprendido que a vida raramente respeita o formato ideal das decisões.
No quarto ao fundo, Lyria observava a própria sombra projetada na parede. O livro recém-adquirido