Janete Castilho é uma das três herdeiras de uma família que enriqueceu no ramo da construção civil, mas é a única dos filhos de seu pai que está disposta a seguir seus passos na construtora Suares & Castilho. Enquanto conclui o Ensino Médio, ela tem que aprender a dividir seu tempo entre estagiar na empresa da família, badalar e treinar no time de vôlei da escola. Nessa rotina movimentada, a garota acaba conhecendo Eduardo H. Faustini, um jovem estudante de TI que a conquista por seu bom humor e charme. Os dois acabam se apaixonando e Janete logo engata um namoro envolvente com o rapaz. Em meio à sua já atribulada vida, a herdeira descobre que seu pai esconde segredos escusos no mundo dos negócios e que a sua afamada herança pode ser fruto de atividades ilegais envolvendo espionagem industrial. Numa trama repleta de erotismo, paixão e desejos proibidos, Janete terá que escolher se sua herança é uma benção ou uma maldição, trilhando assim um caminho de muitas aventuras. Mas em quem ela pode realmente confiar?
Ler maisA ILHA DE FERNANDO DE NORONHA em Pernambuco estava recebendo uma das etapas nacionais do WSL Latin America naquele início de ano e Janete Castilho estava ali para prestigiar o irmão Jonathan. Em meio a uma plateia de pouco mais de algumas dezenas de observadores na areia da praia Cacimba do Padre, ela dividia um binóculo com a amiga Rarissa Vecchio acompanhando de longe — e empolgada — as manobras radicais que o irmão fazia naquele momento nas ondas perfeitas de Noronha. Era um dia maravilhoso na ilha pernambucana. O céu estava limpo, o sol ardia intenso um calor de quase trinta e cinco graus e o mar estava favorável para a prática do surfe.
— O Johnny embocou num tubo sensacional, agora, amiga! — berrou Janete, após dar alguns pulinhos na areia com várias pessoas ao seu redor olhando atentas o cenário azul diante delas.
Havia gritos de incentivo a Jonathan perto de onde elas estavam. O rapaz era um dos favoritos a vencer a etapa do Hang Loose Pro Contest e estava a poucos pontos de bater o primeiro lugar no ranking daquele começo de temporada. Janete passou o binóculo para a moça de pele morena e longos cabelos encaracolados ao seu lado e, a mesma vibrou ao observar o irmão da amiga completando mais uma manobra no mar de forma excepcional.
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Janete ainda estava de férias na escola onde começaria em breve o último ano do colegial. Quando Jonathan ligou em seu celular naquela noite, ela estava pintando as unhas do pé com um esmalte bordô e havia chumaços de algodão entre os dedos.
— ‘Bora viajar comigo pra Noronha?
A voz dele soava animada do outro lado da linha e parecia que ele estava em meio a uma festa. Um som abafado de uma batida musical podia ser ouvido de fundo.
— Como assim “viajar para Noronha”, seu doido? O que vamos fazer em Noronha?
— Para de ser lerda, Jane! — disse ele, em tom de deboche. — É a prova brasileira da WSL Qualifying Serie. Esqueceu que eu vou disputar o título de surfe?
Ela se lembrou na mesma hora que Jonathan não tinha parado de falar daquele evento na última vez em que estivera em São Paulo, onde ela ainda morava com seus pais e a irmã caçula Jéssica. Para o rapaz, vencer aquela etapa em Fernando de Noronha seria a coroação perfeita do seu desempenho crescente nos campeonatos mundiais e o título tiraria o gosto amargo do terceiro lugar que ele havia alcançado no ano anterior.
— Você sabe que eu não recusaria um convite desses por nada no mundo, maninho! — A garota estava bastante excitada. — Quando partimos?
— Vou mandar as passagens aqui do Rio para São Paulo ainda hoje. Já avisa a mãe e o pai que vai viajar comigo, OK?
Jonathan passava grande parte do tempo viajando para competir, mas tinha fixado residência na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, logo que completou a sua maioridade. Lá, por conta das praias e o acesso fácil ao mar — diferente de São Paulo — ele se sentia mais próximo do seu elemento preferido e, os seus pais Renato e Vânia não tinham feito objeções quanto à sua mudança, bancando inclusive um apartamento para o rapaz na cidade. Janete e o irmão eram bastante íntimos desde o início da adolescência e não era incomum que, às vezes, viajassem juntos. Já tinham ido para muitas praias nordestinas em passeios de férias e até passado uma semana sozinhos em Orlando, nos Estados Unidos, se divertindo nos parques da Disney.
Quando Janete comentou com Rarissa, uma das suas melhores amigas do colégio — e também parceira do time de vôlei — sobre a viagem à Fernando de Noronha, a outra vibrou por mensagem de áudio:
— Você não vai acreditar na coincidência, Jane! Meu irmão fechou um pacote irado essa semana pra Noronha. Eu posso conseguir uma passagem com ele sem qualquer problema para ir com você. Sou louca para conhecer Noronha! E assistir um campeonato de surfe vai ser o máximo! Que tal a ideia de irmos juntas?
O irmão de Rarissa, Ralph Vecchio, era dono de uma agência de viagens no bairro da Vila Madalena em São Paulo, o que proporcionava à menina inúmeras facilitações quanto a traslados nacionais. Suas férias eram sempre programadas com antecedência para que os pacotes de viagem que a agência Vecchio Tour disponibilizava coubessem direitinho nos lugares que ela queria conhecer e, quase sempre, as datas batiam. Ela já estava acostumada a passear por vários lugares do Brasil com as amigas de escola e de bairro durante as férias, por isso, tinha sugerido a ida a Noronha à Janete. A moça topou na hora ir em sua companhia.
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Assim que pisou na areia, Jonathan começou a receber vários cumprimentos pela excelente pontuação que alcançara junto ao júri. O seu agente, os seus patrocinadores e até mesmo Suzana, a “ficante” da vez, tinham ido felicitá-lo logo que deixou o mar. Ansioso, ele estava de olho no placar eletrônico que exibia as notas conquistadas por ele e pelos demais surfistas. Viu com empolgação que tinha batido o atleta que estava em primeiro lugar no ranking. Ainda havia mais um competidor para desafiar as ondas da Cacimba do Padre naquela tarde e, de longe, Janete e Rarissa viram o campeão do ano anterior na etapa da WSL em Florianópolis, na Praia da Joaquina, entrar no mar naquele momento. Ele ainda podia bater a pontuação de Jonathan e impedir a sua vitória.
Enquanto aguardavam ansiosas para que o último atleta do dia completasse a sua prova, Janete e Rarissa saíram pela praia e pararam num quiosque onde pediram uma água de coco. Janete estava vestida com um biquíni azul cavado e com uma canga transparente presa à cintura. Os cabelos compridos estavam esvoaçantes ante a brisa que soprava perto do quiosque e os seus olhos castanhos estavam encobertos pelas lentes grandes dos óculos de sol que usava. Quem passava por ela e pela amiga, enquanto elas aguardavam o vendedor abrir os cocos, esticava o pescoço encantado pela plasticidade magnífica das duas meninas. Rarissa tinha a pele bronzeada e usava um fio-dental branco. Foi ela quem reparou primeiro quando uma dupla de rapazes se aproximou das duas ali na barraca.
— Com licença, moça. Janete Castilho?
O primeiro deles era alto, loiro e tinha um corpo que chamava a atenção. Através dos óculos, Janete desceu os olhos para o abdômen definido que ele exibia sem camisa e estendeu a mão para cumprimentá-lo um tanto quanto distraída.
— Sou eu. — Ela estava um pouco sem jeito em ser reconhecida ali no meio de tanta gente. Caracas! Quem é esse gato? Olha esse tanquinho! pensou, quase sem conseguir desviar os olhos para o rosto dele.
O rapaz loiro então apresentou a si próprio e ao garoto que o acompanhava segurando uma câmera de vídeo.
— Eu sou o Henrique Schneider. Esse é o meu editor de vídeos Fred Weber. — O garoto acenou para Janete. Usava um boné camuflado virado com a aba para trás e vestia uma camiseta branca com um logotipo que ela não conhecia: Uma asa-delta vermelha e o nome “Sky” em branco. — Eu sou instrutor de esportes radicais no Rio e eu estou estreando um canal no Youtube sobre o tema. Você é irmã do Jonathan Castilho, não é? Você poderia nos conceder uma entrevista rápida sobre o que está achando do Hang Loose Pro Contest?
De repente, ela ficou tímida só em pensar em aparecer diante de uma câmera falando do campeonato de surfe ou sobre o irmão, mas Rarissa ao seu lado a incentivou:
— Vai, amiga. Qual é o problema?
Henrique tinha um sorriso cativante no rosto e tentou convencê-la:
— São só alguns minutos. Você pode falar da sua torcida pelo Jonathan e o que tem achado do campeonato até o momento. Bem simples.
Janete pensou por alguns instantes, mas logo estava convencida. Deixando a timidez de lado, aceitou o convite para a entrevista. Se posicionou de costas para o mar como instruiu Fred, o garoto de dezenove anos com a câmera em mãos apontada para ela e tirou os óculos. Fora do enquadramento, de frente para a moça, Henrique repetiu as perguntas programadas e ela tentou responder com naturalidade. Escorada no balcão do quiosque, Rarissa acompanhou tudo sorridente. Enquanto tomava a água de coco por um canudinho, ela não conseguiu desviar o olhar do volume entre as pernas do candidato a youtuber de esportes radicais e se sentiu ligeiramente empolgada. Ele estava vestindo apenas uma sunga preta sobre a pele bronzeada. Mordiscando o canudo, ela se viu tendo vários pensamentos libidinosos a observar o rapaz grandalhão.
Eu ia me acabar com um gostoso desse na cama!
Algum tempo depois, na praia, a expectativa foi compensada e Jonathan Castilho foi mesmo consagrado o grande campeão daquela etapa da WSL Latin America, desbancando o favorito da categoria com uma pontuação recorde. A comemoração no pódio foi emocionante e, como nos campeonatos de Fórmula 1, rolou até banho de champanhe entre os três melhores colocados. Janete e Rarissa ficaram na primeira fileira para comemorar a vitória de Jonathan e, logo que deu, ele foi receber um abraço da irmã lá embaixo após descer do degrau mais alto do pódio.
— Você conseguiu, Johnny! Você é o melhor! O MELHOR!
Ele fez um afago nos cabelos castanhos dela e, em seguida, se afastou a lembrando:
— À noite tem a comemoração no hotel. Não esquece. Quero você lá!
Janete deixou o irmão com a namorada, os patrocinadores e os seus agentes para curtir a sua vitória. Além das entrevistas com a imprensa, as poses para as fotos com o troféu em mãos e toda a bajulação costumeira ao campeão, o rapaz ainda tinha toda uma agenda de compromissos e protocolos para cumprir.
Com o irmão em boa companhia, Janete resolveu aproveitar o sol daquela tarde para se bronzear ao lado de Rarissa na praia. Elas nunca tinham viajado juntas antes e se divertiram muito na companhia uma da outra, conversando sobre vários assuntos após o banho de mar, incluindo o que queriam do futuro.
Janete já havia conseguido um estágio num dos vários escritórios da construtora onde o seu pai, Renato, era sócio e ali já tinha meta de seguir carreira como gestora de negócios. A faculdade também estava bem engatilhada para o ano seguinte e o pai fazia questão que a filha estivesse formada antes de assumir um cargo em sua empresa.
Rarissa, por sua vez, estava balançada entre tentar uma carreira no esporte, como jogadora de vôlei profissional, ou seguir os passos do irmão no turismo. Ela sabia que a agência que ele tinha em sociedade com o amigo Celso Moraes era bastante lucrativa, além de que proporcionava um universo repleto de viagens e passeios por vários cantos do mundo, o que ela considerava um grande sonho em forma de carreira.
— Tenho esse ano ainda para me decidir. Até lá, eu vejo o que faço da vida. — disse a linda garota de bruços na areia a se queimar um pouco mais. Em breve, a noite começaria a cair sobre a ilha de Fernando de Noronha e as duas tinham compromisso.
NAS FÉRIAS DE DEZEMBRO, Janete negociou um pacote de viagens com o irmão de Rarissa em sua agência Vecchio Tour e ela incluiu as duas amigas no passeio ao Rio de Janeiro que ela pretendia fazer. As três, agora maiores de idade, viajaram juntas de primeira classe na ponte aérea São Paulo-Rio e aproveitaram o pacote que incluía hotel — com café da manhã e jantar inclusos —, transporte e sete dias de passeios incríveis pelos melhores pontos turísticos da Cidade Maravilhosa. Nos três primeiros dias, as garotas fizeram questão de visitar o Cristo Redentor, o Pão de Açúcar, as praias de Ipanema e de Copacabana, e ainda tiveram tempo de conhecer a Barra da Tijuca e o Leblon. Foi num daqueles dias na Barra, que Janete se lembrou que tinha um conhecido na cidade e insistiu para que as amigas a acompanhassem até onde ele trabalhava. — O que? Voar de asa-delta? Deus me livre! Me borro toda de medo de altura! — disse Rafaela, sendo a primeira a se recusar a visitar o clube para praticantes de
TRÊS DIAS APÓS SAIR do hospital, Renato Castilho conseguiu entrar em contato com o representante de Mercur e marcou um encontro pessoalmente com o homem encarregado das negociações do traficante. À revelia do que a esposa, o irmão e a própria Janete o haviam sugerido fazer, o homem preferiu encarar de frente os seus problemas, mesmo sabendo que poderia ser emboscado no tal encontro e acabar morto. Os serviços prestados por Mercur e a sua equipe tinham custado mais de cem mil reais ao bolso do empresário entre os meses de julho e outubro e, quando Renato havia decidido encerrar o contrato verbal por conta própria, ainda faltava pagar mais sessenta mil aos bandidos. Janete exigiu que o pai vendesse o seu Mini Cooper que estava no seguro e cuja seguradora havia substituído o avariado por um novo, e o dinheiro que ele devia a Mercur seria abatido do valor de quase cento e cinquenta mil que o carro valia. O encontro tinha sido marcado em um galpão abandonado nos arredores de Itaquera, per
A FORMATURA das turmas do terceiro ano do Colégio Batista Genari aconteceu numa cerimônia cheia de pompa e circunstância num salão de festa alugado perto da Avenida Paulista e, já na colação de grau, Janete, Rarissa, Rafaela e Drica não conseguiam conter as lágrimas, vestidas de beca preta e quepe. Juju havia sido escolhida como a oradora da turma com o aval unânime do corpo docente da escola e a garota tinha escrito um discurso motivador e comovente, dando todo o tom da carreira de escritora que ela pretendia seguir. Pais, tios, madrinhas e padrinhos foram às lágrimas na plateia volumosa e alguém podia jurar que vira até mesmo o professor de Matemática, um dos sujeitos mais durões de todo o colégio, levando um lenço até os olhos. Os aplausos ao discurso de Juju foram intensos e a garota o dedicou aos pais, que a assistiam ao lado da sua amiga Lisa, do seu namorado Mario — irmão de Lisa —, da sogra Sara Cerqueira — mãe de Lisa e Mario — e dos pais de Drica, Ester e Glauco Castanho. Ti
O HORÁRIO DO FIM do expediente se aproximava e, tão logo alcançou Ednei, Janete mandou que ele se comunicasse com Alceu, o outro agente de segurança, para se certificar se o seu pai ainda estava no prédio. A comunicação foi rápida e o homem informou: — Sim. Ele ainda está em sua sala na torre sudoeste, senhorita. — Me leve até lá, Jack. Assim que me ver entrando no elevador, eu quero que você me deixe aqui e siga para esse endereço. Janete deu a Ednei um cartão de um hospital localizado a duas quadras dali e ele ficou sem entender o que aquilo significava. Ela explicou: — Quero que você faça a escolta de um paciente de lá que vai receber alta daqui a alguns minutos. Você vai abordá-lo, vai se identificar e vai garantir que ele chegue em segurança até a sua casa na Água Branca. Entendeu? Os dois caminhavam lado a lado saindo do estacionamento e já alcançavam o pátio onde as quatro torres do complexo começavam a fazer sombra sobre as suas cabeças. — Não estou autorizado a fazer iss
GABRIEL TENTOU O QUE estava ao seu alcance para ajudar Janete e tudo que conseguiu foi e-mails trocados da sala de Renato na torre sudoeste com um tal de “Mercur”, pedindo mais informações sobre invasão cibernética a servidores. Em sigilo, o assistente levou o que tinha descoberto ao seu chefe e amigo Michael, que aconselhou que ele fizesse aquilo em mais perfeito segredo. — Não conte a mais ninguém sobre isso, Gabriel. Os caras com quem o pai da Janete está metido são barra pesadíssima. Michael tinha trabalhado por anos com hacktivismo e possuía uma gama elevada de subterfúgios informáticos para driblar certas barreiras que a internet convencional proporcionava. Naqueles dois dias, eles deixaram o trabalho no setor de finanças da S&C um pouco de lado e os dois se dedicaram a mergulhar fundo na Deep Web para achar provas da existência do cartel de informação que era liderado pelo tal “Mercur”. Ninguém da sua bolha conhecia a verdadeira identidade da pessoa por trás daquele nick, mas
EDUARDO ACORDOU NO hospital no dia seguinte. Estava com o ombro esquerdo imobilizado e sentia um curativo espesso em seu nariz, além de um cheiro forte de medicação. Os seus olhos demoraram a focalizar algo, mas quando o fez, ele viu uma enfermeira ajustando um novo volume de soro em um pedestal ao seu lado. — O… Onde eu estou? Ele estava zonzo e viu um cateter preso ao seu braço direito quando a mulher respondeu: — Você está no hospital. Você levou um tiro e foi feita uma cirurgia de reconstrução em seu ombro ontem. Você está bem agora. Ele olhou em volta com a pouca mobilidade que tinha e quis saber de Janete. — A moça que te trouxe até aqui está lá fora. Ela não quis arredar o pé do hospital mesmo quando soube que você já estava bem. — Me deixa falar com ela, por favor. Não era horário de visitas, mas a enfermeira permitiu que Janete entrasse por alguns minutos, deixando-os a sós. Eduardo sorriu quando a viu entrar, mas sentiu dor no nariz e desfez o sorriso imediatamente.
Último capítulo