Aquele dia não foi como os outros: presa, cheia de angústia e ansiedade. Não conseguia nem identificar se a ansiedade era inteiramente minha por não ter notícias do ômega de Wulfric, ou se ele e eu, por mais que não nos víssemos nos últimos dias, compartilhávamos dos mesmos sentimentos através da marca. Era como se não fosse sangue correndo nas nossas veias, mas sensações — e, um dia, seriam sentimentos. Aquele dia foi agitado e irritante. Esperava pelo meu desjejum como sempre, mas, ao invés de saírem após colocar a mesa, uma das lobas se aproximou de repente e avançou para cima de mim. — Está louca? — foi minha primeira pergunta quando ela tentou me pressionar contra a parede mais próxima. Apertei a mão que ela tinha contra meu pescoço, colocando a outra contra o seu pescoço também. Mas, quando acreditei que conseguiria afastá-la com um golpe de defesa, a outra loba, que sempre a acompanhava, veio ajudá-la a me manter presa. Rosnei com elas me segurando. — Vai ca***a! Rosna c
EULÁLIA— Supremo! — ambas falaram em uníssono. A voz de uma delas tremeu, mas ambas agora cheiravam a medo.Ele me olhou por mais um segundo. Algo no fundo, como se analisasse meu estado físico. Meus olhos também desceram sobre o meu próprio corpo: calça jeans intacta, blusa de alças apenas amarrotada e os saltos agulha no lugar.Para mim, eu estava bem. Alisei meus fios avermelhados com os dedos, tirando-os da frente do corpo para jogá-los para as costas. Nesse momento, senti queimar os lados do pescoço.Os olhos dele fixaram nesses pontos de queimação imediatamente. Eu senti. Então, levei as mãos até ali para tocar. As garras da primeira atacante tinham afundado um pouco na minha pele. Meus dedos vieram sujos.“Droga! Quando isso aconteceu?” Quase bufei, mas, antes, o rosnado dele fez os móveis tremerem: inclusive a cama em que eu quase me recostava.— Como ousam?As lobas baixaram as cabeças, quase chorando, até mesmo tentando explicar. Wulfric não ouviu.— Eu disse que ninguém to
EULÁLIA“Ele é o rei dos lobos. O meu rei. O meu companheiro.” Era tão bom e tão irreal ao mesmo tempo.Quando desci para sua barba feita há dois dias, ele agarrou minha mão para me impedir de traçar caminho até seu pescoço.— Esse não é o lugar, Eulália!— Por quê?“Não estamos em um quarto?” Não conseguia sentir timidez suficiente naquele momento, apenas consciência de sua presença e toque.— Tem corpos atrás de mim, o odor de sangue é repugnante.O olfato dele era muito melhor do que qualquer lobo comum ou alfa.— Eu havia esquecido. Eu nem o sinto — confessei.Mesmo que restasse algo desse mesmo material sanguíneo nos dedos dele ou debaixo de suas unhas.— Como que não sente? — novamente cheirou o ar, então apertou os olhos.— Você sente algo mais? — perguntei, quase inocentemente.— Claro que sinto. Mas não combina com esse ambiente.— Então me leve para o lugar certo! — pedi, hipnotizada, embriagada por ele.— Não foi assim que eu planejei — ele resmungou, lutando contra si mesm
WULFRICO vento frio batia no meu rosto enquanto eu corria em uma velocidade razoável, estabelecendo contato com meu ômega assim que pus os pés naquele território.De repente tive que parar. Meu olfato captou algo no ar: um cheiro estranho. Olhei ao redor das árvores, para as copas altas, deixando o vento leve soprar no meu rosto com menos intensidade que soprava as folhas nos galhos.Respirei fundo, o frescor da madrugada me proporcionava a sensação de liberdade. Mas aquele cheiro de lobo era incomum.“Alguém passou por aqui há onze horas.” Esse alguém mascarou seu cheiro com perfume e incenso.“Eu odeio incenso.” Torci o nariz. Era algo a se pensar.Ainda no mesmo lugar, comecei a deduzir, em busca das peças certas. Aquela pessoa se preveniu sobre a minha chegada, pois não faria sentido mascarar seu cheiro justamente com a mistura que me irritava.“Ele me conhece bem.” Estreitei os olhos.“Se ele é alguém tão bem informado, só pode ser alguém que me espiona desde o início…” Saí do l
WULFRIC — Soberano. — Ouvi a voz de Reymond atrás de uma das casas mais próximas. O encontrei com o olhar. Ele não havia gritado, apenas murmurado. Minha audição era melhor que a dos demais, isso ajudava a não criar alarde. Fiz um sinal de cabeça, inclinando-a para o lado oposto dele, chamando-o. Reymond quebrou a distância entre nós dentro de segundos. — Como está indo? — Primeiro perguntei a ele sobre sua saúde, seu bem-estar. Nos lábios meio rosados dele, por causa de sua pele pouco corada, quase pálida, ele sorriu com timidez. — Estou bem, soberano. — Como eles te tratam? — Fiz sinal com os dedos, pedindo para ele mostrar suas costas na minha frente. — Como um ômega sem matilha. — Revelou suas costas maltratadas. — Eles tocaram em você? — Apertei as mãos. Reymond era meu ômega. Ninguém podia tocar no meu lobo de confiança. “Cabeças vão rolar em breve.” — Eles basicamente só não deixam cicatrizar, “para me mostrar de onde vim”, segundo o que eles pensam. Ele baixou
WULFRIC Não me importava se essa pessoa era ou não muito próxima de mim, mas, se estava desde o início tramando contra mim, era a maior prova de que não devia estar ao meu lado. Reymond apertou os olhos por alguns segundos, encarando a grama abaixo de seus pés. — E então, o que descobriu além disso? — perguntei, sem desviar o olhar do casal à frente. “Eles são muito confiantes.” Percebi aquilo porque Ciro nunca sentiu minha presença, mesmo que eu já estivesse ali há muitos minutos. — Ciro mantém um dos antigos conselheiros do pai sob vigilância. Ainda é leal ao sangue do último alfa, Michel, mas finge submissão ao novo. Tive acesso a parte dos arquivos que ele esconde na biblioteca oculta da mansão. O conselheiro registrou que Rosalina tem contatos fora da alcateia. Um deles é humano. Estreitei os olhos, atento. — Humanos? — Parecia brincadeira. “Estão testando mesmo minha paciência?” Eles haviam até mesmo passado dos limites incluindo humanos no nosso mundo. “Eu deveria mes
EULÁLIA Naquela manhã, alguém bateu na minha porta. No fundo, desejei que fosse Wulfric, por isso fui ao encontro dela com certa ansiedade, dando passos apressados até. — Seu desjejum. — Desta vez não era loba nenhuma, não era empregada ou encarregado. Os olhos verdes dele me deixaram desconfortável com a intensidade com que me olhou. — Beta… Ele sorriu, adentrando o quarto como se fosse seu. — Se me der licença… “Mesmo se não desse, você entraria, não é?” penso, enquanto espiava pelo corredor, verificando se os guardas ainda estavam lá. Eu não confiava nele por causa do acontecimento do julgamento. Aquilo parecia mais um problema pessoal comigo. Voltei-me para dentro com urgência ao sentir seu olhar. Ele arrumava a pequena mesa com prática; mesmo que com certo cuidado, ainda não deixava de me observar. — Está preocupada comigo? — Um sorriso zombeteiro beirava seus lábios. — E não deveria? — perguntei, enquanto fechava a porta. — Então não deveria fechar a porta. — Sorri
EULÁLIA — Se eu quisesse matá-la, já teria feito. Sem mais delongas. — E por que não fez? — Escolhi algo para comer. — Porque ainda não sei se prefiro vê-la viva ou morta. Ou apenas fora dos limites deste castelo — respondeu com naturalidade. Aquilo não me ofendeu. Na verdade, fez minha curiosidade aflorar. — E eu nem poderia querer — murmurou. “Então eu tenho mesmo um pouco de influência sobre ele.” Ele virou-se de costas, como se a conversa estivesse encerrada. E, por um instante, pensei que fosse sair. Então se voltou para mim, assistindo à maçã chegar perto dos meus lábios. “Seria uma coisa muito estúpida lembrar da Branca de Neve agora, William.” Eu mesma recordei, mas ainda assim dei uma mordida na maçã. — Haverá um julgamento secundário. — Tem a ver comigo, suponho. — Um dos guardas foi acusado de passar informações aos rebeldes — disse casualmente. — E? — Ele jurou ter ouvido de uma loba do seu clã que havia um plano para que você fugisse daqui antes do j