A Filha do Alfa
A Filha do Alfa
Por: Lira H. River
Capítulo 1

Maeve

Me endireitei no banco do carona pela décima vez, contendo um suspiro irritado. O carro era meu, mas é claro que Robert não me deixaria dirigir com ele dentro. Afinal, ele é o Alfa e eu sou… bem, eu sou Maeve.

Gosto de me descrever como Maeve, futura pediatra promissora. Mas nesse momento eu voltei a ser Maeve, filha do Alfa e seu maior problema. Tecnicamente sou sua filha, por mais que uma ligação de aniversário por ano e um depósito simbólico por mês não me façam aceitá-lo como pai. Não que ele precise de minha aceitação. Como Robert sempre me diz, ele precisa apenas da minha cooperação.

-Estamos chegando. Fique atrás de mim o tempo todo e coopere. - sua voz áspera surgiu pela primeira vez em três horas de viagem.

Eu apenas assenti, apoiando a cabeça na janela e ignorando-o. Por mais que ele fizesse meu sangue ferver, uma coisa que eu tinha aprendido da maneira mais difícil é que o único motivo para alguém desafiar um Alfa era para matar ou morrer. Não pretendia morrer tão cedo e, sendo uma loba dormente como meu querido pai fazia questão de me lembrar sempre, matar não era uma possibilidade.

E era por esse motivo que estávamos nessa situação. Como sua primogênita, eu sou o símbolo de sua força diante de seus inimigos. E o que diriam de um Alfa que tem uma filha que não se transforma? Seus aliados aproveitaram a primeira oportunidade para desafiá-lo e nós dois sabemos que ele perderia. Porque maior do que sua sede de poder, só a sua capacidade de iludir os outros, fingindo ser um Alfa invencível.

Robert estacionou em frente a uma boate e saiu do carro, sem ver se eu o seguia. Trinquei os dentes, tentando me manter calma. Se essa fosse como nas outras vezes, em algumas horas eu estaria voltando para casa e ele me deixaria em paz pelos próximos dois ou três anos. Eu era capaz de engolir um pouco da raiva.

Era fim de tarde e a boate ainda estava vazia, apenas alguns funcionários circulavam por ali, ajeitando cadeiras e limpando o balcão de bebidas. Robert atraiu a atenção de todos ao cruzar a pista de dança, ignorando os poucos que lhe lançavam olhares desgostosos. Ele seguiu para uma porta fechada nos fundos, claramente conhecendo o local.

-Ela precisava vir junto? - uma figura surgiu das sombras perto da porta.

-Ela tem que entender a gravidade da situação. - ele me olhou como se eu fosse uma criança mal-criada.

Cerrei os punhos, encarando a mulher que me olhava com ar superior. Seus cabelos pretos caíam em leves ondas nas costas e ela vestia o uniforme de garçonete, que não parecia se encaixar bem nela. Era bonita, devendo ter por volta de quarenta anos.

-“Ela” está aqui para ouvir vocês. - zombei.

Os dois me ignoraram, voltando para sua conversa como se eu não estivesse ali.

-Onde eles estão?

A mulher desviou o olhar em direção ao salão. Acompanhei o olhar dela, mas Robert me repreendeu com uma mão firme no ombro. Ele me manteve ali como se meus pés estivessem grudados no chão. O xinguei mentalmente por isso. Ele sabia que sua influência não funcionava em mim, mas eu não tinha a força de um lobisomem, então isso não era problema para ele.

-Isole a área. - comandou ele. - Não queremos atrair a atenção de ninguém.

A mulher assentiu e desapareceu nas sombras de onde surgiu. O Alfa se colocou à minha frente, puxando-me mais para as sombras. Se estivéssemos lidando com outros lobos a proteção da penumbra não serviria de nada, mas algo no ar mudou quando entramos ali e eu soube que a mulher devia ter criado uma barreira para nos esconder. Quando a pressão no ar se normalizou, ele me virou para observar a pista de dança.

Como nas outras viagens que fizemos, ele estaria ali para conquistar algo e me mostrar mais uma vez que tinha total controle sobre mim antes de me mandar de volta para minha vida pacífica. Eu nunca me importei de verdade, já que depois ele sumia. Mas algo nessa viagem parecia diferente.

-Observe nossos alvos de hoje, Maeve. - ele se abaixou um pouco, aumentando a pressão sob meu ombro. - Aqueles dois são filhos de meu maior inimigo. - eu pude sentir o sorriso em sua voz, enquanto olhava para os dois jovens limpando o chão. -E hoje eles vão me conhecer.

Aquelas palavras caíram em mim como um balde de água fria, me levando de volta para a primeira vez que ele as tinha dito para mim. Eu tinha recém completado dezesseis anos e minha transformação não tinha acontecido. Ele apareceu em meu aniversário, dizendo que já tinha passado da hora de conhecê-lo. A princípio não entendi o que ele queria dizer, mas então Robert quebrou minha perna, alegando que isso iria me obrigar a me transformar -  o que obviamente não aconteceu.

Observei os jovens brincando um com o outro despreocupados, enquanto limpavam a pista. Eles tinham terminado a área mais afastada de nós e agora continuavam o trabalho, vindo lentamente em nossa direção. Não pude deixar de notar como a cena toda parecia uma piada de mal gosto, com o lobo à espreita, apenas esperando suas presas virem em direção à morte.

Meu coração apertou quando eles se aproximaram e pude vê-los com nitidez. O mais novo tinha cabelos castanhos despenteados, olhos verdes e braços definidos por horas de academia. Ele ria com leveza, não parecendo ter muito mais de vinte anos. O mais velho o olhava com diversão, os cabelos pretos caindo levemente na testa molhada. O queixo era forte e os olhos de um azul profundo diziam que ele deveria fazer sucesso com as mulheres.

-O que você vai fazer com eles? - sussurrei, um nó se formando em minha garganta.

Robert riu.

-Não vá dizer que gostou deles? - ele baixou o tom, sua voz ficando mais grave e dura. -Não vai gostar deles quando souber o que tenho reservado para vocês.

Meu coração parou por um instante com aquela simples palavra.

Vocês.

-Eu faço qualquer coisa, mas me leve para casa. -eu implorei, segurando as lágrimas antes que perdesse o que me restava de dignidade.

O rosto de Robert escureceu, os olhos brilhando amarelos. Soltei seu braço como se queimasse em brasa e me afastei, ficando no limite das sombras. Sua voz saiu densa de poder, a transformação já começando.

-Pode acreditar que eu vou te levar para casa. - ele rosnou. -E você vai me agradecer por isso.

Meu coração disparou e o tempo pareceu parar. Olhei de volta para os irmãos, ainda alheios a tudo. Por um segundo o homem mais velho olhou em nossa direção e eu podia jurar que nossos olhos se encontraram. Robert já se agachava ao meu lado, a transformação prestes a terminar.

Eles não tinham mais tempo.

Disparei para fora da barreira, gritando para que eles corressem. Confusos eles levaram um segundo para reagir, tentando entender o que eu dizia.

Mas eles não tinham um segundo.

Porque o Alfa estava pronto.

E eles iriam morrer.

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