Mundo ficciónIniciar sesiónEthan
Os dias longe de casa estavam me matando. Ficar longe da minha matilha, em um país completamente diferente do meu é como uma tortura, como se a deusa quisesse me castigar por meus pecados.
Respirei fundo, ouvindo os homens humanos falando de dinheiro, de negócios, e de mais dinheiro.
Não consigo entender essa fascinação por coisas inanimadas. Entendo que é necessário para ter uma existência digna, mas eles são tão soberbos, tão pequenos, que sinto vontade de esmagá-los todas as vezes que preciso trocar palavras com esses seres desprezíveis.
Eu sei que é retrógrado, mas eu odeio humanos. Os poucos que simpatizo são os que trabalham para mim, são os companheiros ou companheiras destinadas dos membros da minha matilha, que vivem na minha propriedade, e apenas.
O restante dos humanos, para mim, são insignificantes e idiotas, que só pensam em dinheiro, só pensam em luxúria.
Bom, a parte da luxúria não posso negar que faz parte da nossa raça muito mais do que a deles, principalmente em noite de lua cheia e em épocas de cio.
O cio é a melhor parte do ano, e sempre vem na primeira lua cheia da primavera, e é a época essencial para a procriação da minha espécie.
Lembro-me de quando completei idade o suficiente para me transformar, e depois disso tudo ficou mais intenso, e eu comecei a me sentir mais e mais vivo.
Geralmente, os shifters podem começar a mutação do corpo completamente aos dezesseis anos, e os odores começam a ficar mais intensos, por mais que não estejamos em nossas formas primitivas, nós ainda conseguimos sentir o cheiro das fêmeas há uma boa distância, principalmente se estiverem no cio.
Precisei lutar muito na minha primeira primavera quando estava pronto para procriar, pois a vontade de sair fodendo todas as lobas da matilha quase falou mais alto. Porém, tive a sorte de ter meu pai, meu irmão e minha mãe para me auxiliar. Claro, Zion era bem mais novo, porém sempre teve um corpo mais forte que o meu, e até hoje não consigo entender como aquele garoto teve uma transformação tão precoce. Acho que foi por isso que ele acabou se afastando da matilha e renunciando ao cargo. Meu irmão acabou deslocado, e por mais que eu tentasse incluí-lo na nossa matilha, ele não conseguia controlar o lobo dentro de si.
No fim, minha mãe e meu pai acabaram morrendo em um acidente de avião poucos anos depois, e a única coisa que me manteve vivo e lutando foi Dandara.
No fundo, eu sabia bem que aquela loba não era minha alma gêmea destinada, eu tinha plena certeza que não, porém, ela sempre conseguia me decifrar, sentir o que eu sentia, e falar as coisas certas na hora certa. Isso me fazia crer que ela era a minha alma destinada, nem que fosse só um pouco. Eu me agarrei a ideia de que Dandara me faria completo, feliz de um jeito que eu nunca havia me sentido. E foi assim durante oito anos. Ela era intensa, submissa e fazia todas as minhas vontades, exatamente do jeito que eu queria.
Depois dela nunca mais tive atração por nenhuma loba, e a marquei, fiz dela a minha luna.
Nosso casamento era perfeito, nossa união foi feito sob o primeiro luar da primavera, e depois disso vieram os cios.
Porém, Dandara não engravidava de jeito nenhum, e uma luna que não carrega o filhote do seu alfa é substituida por outra, ou pode escolher que o filhote seja gerado em outro ventre, e seja criado por ela.
Obviamente eu nunca deixaria que outra fêmea deitasse em minha cama, muito menos que carregasse o meu filhote. Tentei a todo custo tranquilizar minha companheira sobre isso, mas notei que com o passar dos anos Dandara ficava mais e mais obcecada pela ideia de carregar um filhote meu. E no fim, ela conseguiu.
Depois de tantas tentativas, finalmente ela tinha um bebê em seu ventre.
Porém, o destino nos surpreende de maneiras negativas as vezes.
Nosso filhote, Victor, nasceu antes do que deveria, e Dandara adoeceu após o parto, deixando-me só com aquela criança.
Sei que deveria amar meu filhote acima de tudo, e protege-lo, mas não consigo olhar para ele e sentir amor paterno, pois foi por causa dele que minha luna acabou me deixando.
Eu tentei durante um ano inteiro, tentei cria-lo, me aproximar dele, mas nem Vic gosta de mim, e nem eu dele. Ele me morde, rosna e arranha sempre que pode, e isso é sinal que o filhote está incomodado com algo.
Deixei tudo de lado apenas para cria-lo, para sentir um pouco de Dandara nele, mas parece que o desejo da minha falecida luna acabou se concretizando completamente o contrário. Era para Vic ser cheio de amor, mas consigo enxergar uma dor imensa nos olhos do pequeno, e raiva também. Honestamente não sei como é possível, mas eu tenho certeza que meu filhote de um ano me odeia.
_ Senhor Ethan? _ Um dos machos humano chamou minha atenção, como se eu não estivesse prestando atenção nas besteiras que está dizendo.
_ Pode aprovar, será um bom investimento. _ Falei ao me levantar.
Ele fechou a cara, e escutei seu coração acelerado. Esse babaca me odeia o tanto que eu odeio ele.
Virei minhas costas e saí a passos largos. Poucas horas depois embarquei no avião, finalmente indo para a minha casa, para a minha matilha e espero que Valéria tenha contratado uma babá para o filhote, pois a última coisa que quero agora é vê-lo.
(...)
Assim que desci do helicóptero, no pequeno heliporto da mansão Black Wolf, senti o aroma das flores e da grama.
Fiz uma longa viagem de avião, e para economizar um pouco de tempo saí do aeroporto de helicóptero. Confesso que odeio voar, prefiro o chão, a terra, mas às vezes abro uma exceção.
Andei a passos lentos até a mansão, e assim que entrei me deparei com tudo escuro. Olhei no relógio para ter certeza, e são quatro horas da manhã.
Enquanto passava pelo escritório senti um odor diferente. Parei, farejei novamente, e o odor pareceu acariciar minhas narinas e meu corpo. O cheiro de canela, rosas e pimenta…
Meus pelos ficaram eriçados, e meu lobo começou a uivar na minha mente, me ensurdecendo completamente.
_ Droga… _ Murmurei sentindo meus ossos doerem.
Voltei a farejar o cheiro, e ele estava por toda casa. Segui até o quarto de Vic, mas parei na porta. Apesar do cheiro estar mais forte nessa região, não pretendo entrar.
Voltei a farejar pela casa, mas aos poucos o cheiro sumiu. Alguém com um odor muito agradável esteve aqui, e meu lobo gostou tanto a ponto de ficar descontrolado.
Com a energia tomando conta do meu corpo corri até o inicio da floresta, me despi e sem pensar em nada, meu corpo tomou a forma do lobo de pelo negro e eriçado.
Minha visão ficou ampla, os cheiros também, incluindo o cheiro bom que me deixou assim.
Sem que eu conseguisse controlar, comecei a correr pela floresta, sentindo a terra entrar no meio das minhas patas enquanto elas batiam com força no solo úmido, e quando parei em frente a cachoeira, observei meu reflexo na água, que ficou nítido com a iluminação da lua. Um uivo saiu da minha garganta, ecoando por toda a região.
E a pergunta que não quer calar tomou meus pensamentos, mesmo na forma de lobo: de quem é aquele cheiro?







