Mundo ficciónIniciar sesiónGabriela
Por incrível que pareça, passei a viagem de volta inteira dormindo tranquilamente, e senti como se um peso gigantesco tivesse saído das minhas costas, e até acredito que isso realmente aconteceu, já que agora terei como pagar minhas contas, sendo essa uma preocupação terrível.
No fim das contas, cheguei em casa sem sono algum, e me dediquei a colocar tudo de cabeça para baixo, e colocar na mala somente o necessário.
Valéria disse que terei um quarto para mim na ala de hóspedes, e que não vou precisar dividir com ninguém. Pelo o que entendi o quarto é padrão da região, então tem um banheiro grande e é espaçoso.
Não estou em busca de conforto, e sim de um trabalho, mas se a vida me oferecer a chance de dormir em um quarto com uma cama um pouco mais confortável que a minha, eu aceitarei de bom grado.
É engraçado ver como a minha vida gira rápido. Até ontem a angústia estava me devorando, e hoje estou cantarolando feliz, limpando a casa, lavando roupas e fazendo uma mala enorme.
Valéria disse também que usarei um uniforme, com uma cor que indica que sou humana. Sei que eles sentem cheiro, mas como ela mesma disse, é bom distinguir.
Terei alguns seguranças também sempre que estiver com o pequeno Vic, para a nossa proteção e para a minha.
Por mais que Victor seja um bebê, ele pode ser muito mais forte do que eu caso fique irritado, e posso acabar machucada. Sei que é um risco enorme, ter que lidar com shifters, ainda mais com um filhote de alfa, mas sinto que Vic é uma criança mal compreendida, e talvez a mãe faça muita falta para ele. Sei como é sentir solidão, tristeza e sentimento de saudade incessante. Dizem que os shifters já criam apego com as mães desde a barriga, e provavelmente, mesmo não a conhecendo, ele sente falta da mulher.
Achei meio estranho essa história, porque pelo o que sei, as fêmeas dessa espécie podem ter quantos filhos quiserem, pois seus corpos são resistentes e os filhos nascem extremamente fortes.
Há muito tempo ouvi falar dessa família, e todos os rumores que ouvi foram horrorosos. Quero acreditar que não é bem assim, que são apenas boatos mal ditos, apenas isso, porque se eu parar para pensar, vou querer passar bem longe da mansão.
Parei meus afazeres para fazer um lanche, e enquanto fritava um ovo minha campainha tocou. Assim que me dirigi à porta e olhei pelo olho mágico, achei estranho.
Era um homem que nunca vi. Por alguns instantes fiquei receosa, mas lembrei que ontem mais cedo havia um caminhão de mudanças aqui do lado, e provavelmente esse deve ser o novo vizinho.
Abri a porta, ainda com um pé atrás.
_ Boa noite, vizinha! _ Disse ele sorrindo estranhamente.
_ Boa noite… você é o novo vizinho, certo?
_ Sim, me mudei ontem… peço desculpas pelo horário, mas a câmera da lateral da sua casa está fazendo um barulho… extremamente irritante! _ Ele tentou soar o mais normal possível, mas na mesma hora eu vi o dourado misturado com laranja em seus olhos.
Observei mais um pouco, e realmente, não são todos os dias que se conhece alguém alto, do tamanho da porta, e com ombros e braços largos o bastante para me engolir.
_ Oh… de-desculpa… eu não sabia… _ Murmurei envergonhada e com medo.
_ Por favor, não me entenda mal… é que o barulho é realmente irritante, e desde ontem está me incomodando muito. _ Ele coçou a cabeça, desviando o olhar. _ Eu não queria chegar dessa forma, mas não consegui dormir a noite inteira, e trabalho em casa, então estou praticamente enlouquecendo!
_ Tudo bem, eu vou desligar a câmera, aí você me diz se melhorou, ok? _ Ele assentiu.
Deixei o homem na porta e corri até o interruptor das câmeras, e desliguei a câmera da lateral.
Eu sei a qual barulho ele está se referindo, e acredito que seja alguma interferência na câmera, mas o barulho é tão baixo que acabei nem ligando mais, porém parece que os ouvidos sensíveis do meu vizinho quase o deixaram maluco.
_ Pronto, melhorou? _ Perguntei assim que voltei para a porta da sala.
Ele fechou os olhos e ficou um instante em silêncio, esboçando um sorriso e suspiro aliviado.
_ Nossa… muito obrigado! Eu juro que tentei, mas não consegui aguentar! _ Disse ele envergonhado.
_ Tudo bem, eu sei de qual barulho você está falando, se eu soubesse que você é um shifter teria desligado a câmera antes, sinto muito!
_ Está tudo bem, nessa região há apenas humanos, e minha raça acaba ficando do outro lado da cidade..
_ E por que você veio pra cá?
Infelizmente sou curiosa, e cara de pau às vezes.
_ A internet é melhor. Em áreas com muita vegetação a internet é terrível. Mas ficarei aqui somente durante a semana, nas minhas folgas vou voltar para a minha casa. _ Assenti. Ele estendeu a mão em minha direção e apertei. _ Muito prazer, meu nome é Adryan. _ Disse ele sorrindo, deixando que suas presas aparecessem.
_ E o meu Gabriela!
_ Muito prazer, Gabriela. Então acredito que nos veremos bastante durante a semana
_ Ah… na verdade não. Estou indo trabalhar em outro local, e vou passar a semana fora. _ Falei enquanto lembrava da mala que teria que fazer.
_ Tem algo queimando! _ Disse ele enquanto seu nariz dilatava.
Sem pensar duas vezes corri até o fogão e desliguei.
_ Droga… quase coloquei fogo no meu ovo. _ Murmurei chateada.
Peguei a panela e coloquei debaixo da água, e a fumaça tomou conta da cozinha.
_ Desculpe, me esqueci que estava fazendo comida. _ Falei envergonhada.
_ Tudo bem, sou péssimo na cozinha, não posso julgar. _ Disse ele rindo.
Continuei conversando amenidades com o desconhecido, e em nenhum momento ele deu um passo sequer para dentro da minha casa.
Depois de alguns minutos de papo, me despedi de Adryan, que demonstrou ser extremamente receptivo.
Voltei a arrumar a mala enquanto aguardava um lanche que encomendei, já que minha comida virou carvão.
Peguei uma foto da minha família, sentindo uma saudade imensa da minha mãe.
No fim das contas, derramei algumas lágrimas enquanto arrumava a mala. E não importa para onde eu vou, sempre vou acabar levando essa bagagem do passado comigo, principalmente as cicatrizes que ainda habitam o meu corpo.







