O silêncio da tarde repousava sobre a casa como uma colcha espessa. Eleanor sentia o peso do tempo deslizar entre os dedos enquanto folheava, pela décima vez, as páginas do dossiê que tinham reunido nas últimas semanas. Ao seu lado, Theo organizava documentos sobre a mesa de jantar com precisão quase obsessiva.Eles já haviam visitado Rupert Wallace. A conversa com o ex-investigador não saía da mente de nenhum dos dois. Wallace tinha sido evasivo em alguns momentos e, em outros, sugerira mais do que revelara. Dissera que havia mais por trás do desaparecimento de Amélia Ravenscroft do que qualquer um ousara investigar. Que ele próprio fora afastado por seguir pistas que desagradaram figuras de influência.Agora, com os novos documentos encontrados entre os pertences antigos de Edgar Ravenscroft, algo voltava à tona com força: um bilhete, assinado por Wallace, agradecendo ao pai de Theo por uma “intervenção delicada”. Não havia detalhes. Apenas uma linha enigmática, escrita à mão, e dat

O caminho de volta para casa foi silencioso. O carro seguia pela estrada estreita serpenteando entre os campos, mas nenhum dos dois parecia notar a paisagem. O ar entre eles estava carregado de tudo o que ainda não haviam conseguido digerir.Theo mantinha as mãos firmes no volante, mas seus olhos estavam distantes, como se ainda estivessem presos ao banco de madeira no jardim de Wallace. Eleanor, no banco do passageiro, segurava o bilhete plastificado entre os dedos. Como algo tão pequeno podia abrir uma fenda tão grande?— Você está bem? — ela perguntou, finalmente quebrando o silêncio.Ele demorou alguns segundos antes de responder. — Eu não sei mais o que pensar sobre meu pai.Ela não respondeu de imediato. Sabia que aquele tipo de dor não precisava ser consolada. Precisava ser ouvida. Acompanhada.— Às vezes — disse ela, com a voz baixa — a gente cresce idealizando os pais. Acreditando que tudo o que fizeram foi por amor, por proteção, por um bem maior. E quando descobrimos que ta

A decisão de procurar por Miss Ellory surgiu quase como um sussurro partilhado, algo que, até então, havia permanecido à sombra dos documentos e bilhetes. Ela era apenas um nome mencionado de passagem, uma antiga professora de Elijah e Theo nos registros escolares que Eleanor encontrou entre os pertences de Vivienne — mas havia algo em sua caligrafia firme, no modo como anotava “preocupações com o comportamento emocional de Elijah” nas margens dos boletins, que fez com que se tornasse uma peça a mais naquele quebra-cabeça incompleto.Miss Ellory já devia estar aposentada há tempos, mas uma busca rápida nos arquivos do vilarejo revelou que ela ainda morava na mesma casa onde vivera por décadas, a poucos quilômetros dali, numa rua tranquila na extremidade de Yorkshire.O caminho até lá foi silencioso, pontuado apenas pelo som das pedras sob os pneus do carro de Theo. Eleanor olhava pela janela, absorvendo a paisagem que alternava entre o verde intenso das colinas e o cinza suave das cas

A tarde estava cinzenta em Yorkshire, e o vento parecia sussurrar entre as árvores como se a própria terra quisesse contar uma história há muito esquecida. Eleanor e Theo estavam sentados à mesa da biblioteca da casa, cercados por documentos, recortes e anotações. Mas havia uma coisa que não saía da mente de nenhum dos dois: a fotografia encontrada dentro do diário da tia Vivienne. Celia, Rupert e Amélia — verão de 1993.Celia. A mulher da carta. A mesma que estivera próxima demais dos pais de Theo, de Rupert Wallace. E, de alguma forma, próxima o bastante de Vivienne para que esta guardasse aquela imagem.— Você acha que minha tia sabia de tudo? — perguntou Eleanor, finalmente quebrando o silêncio.— Se ela não sabia de tudo... sabia o suficiente para se calar. Ou para proteger alguém — Theo respondeu, recostando-se na cadeira. — Aquela foto não foi guardada por acaso. Ela queria que alguém a encontrasse, um dia. Talvez você.Eleanor assentiu. As conexões eram delicadas, tênues, mas

O interior da casa de Celia era diferente do que Eleanor imaginara. Havia uma simplicidade melancólica nos móveis antigos, no tapete gasto sob o sofá, nas cortinas floridas que mal filtravam a luz cinzenta daquela tarde nublada. Mas havia também um cuidado. Um silêncio acolhedor. Como se o tempo ali tivesse deixado marcas, mas não feridas.Ela os conduziu até uma pequena sala com lareira, onde pilhas de livros, retratos emoldurados e xícaras de porcelana coexistiam em harmonia tênue. Theo permaneceu em pé, atento. Eleanor se sentou devagar, os olhos vasculhando cada canto, como se a história da tia estivesse escrita nas paredes.Celia sentou-se de frente para eles, tirando o chapéu de aba larga que usava no jardim. Seus cabelos grisalhos caíram soltos pelos ombros, revelando um rosto ainda belo, marcado por anos de silêncio.— Eu imaginei que seria você — disse, olhando diretamente para Eleanor. — Desde que soube da morte de Vivienne… imaginei que alguém da família viria. Mas confesso