A dor ardente na minha bochecha se espalhou como fogo selvagem, e eu queria revidar. Mas, ao meu redor, os convidados circulavam, e de repente eu me lembrei, era a minha cerimônia de maioridade. Qualquer confusão só serviria para família Abreu virar alvo de chacota por todo a alcateia.
Lina estava escondida atrás do Caio, com um sorriso no canto de seus lábios aparente. Ela se aninhou nos braços dele.
A mão de Caio ficou parada no ar, provavelmente sentindo o fogo nos dedos da força do tapa que havia me dado. Ele engoliu a seco, tentando pensar em algo para dizer.
Até que, de repente, Lina se ergueu nas pontas dos pés e, com uma voz trêmula, disse:
— Caio, a minha perna está doendo muito. Será que nunca mais poderei andar?
Os dedos finos dela se enrolaram no pulso dele, puxando toda a sua atenção para ela.
Os murmúrios ao redor se espalharam como uma onda, e os olhares começaram a me atingir, como agulhas envenenadas, me perfurando.
— Que falta de educação! Até a irmã virou alvo de competição por um companheiro!
— E nem nota a própria índole. Como Caio, príncipe da Lua Prateada, poderia escolher ela?
Caio franziu as sobrancelhas e me lançou um olhar de desprezo, como se estivesse prestes a explodir.
— Vai ficar parada aí? Se algo acontecer com a Lina, eu não vou te perdoar. — Disse.
Os admiradores dele atrás começaram a zombar:
— Isso aí! Pede desculpas para a Srta. Lina!
— Acha mesmo que só porque seu pai protegeu o rei de uma flechada, você vai se aproveitar do nosso futuro Alfa?
De repente, eu me lembrei de como na outra realidade, eu treinava incansavelmente no campo de batalha, prometendo destruir qualquer um que ousasse olhar ou cobiçar o Caio. Naquele tempo, eu achava que, se fosse feroz suficientemente, poderia manter o amor aceso. Agora, pensando nisso tudo, só senti um vazio absurdo.
Caio deu um passo à frente, se aproximando, e seus olhos de fera estavam quase me afogando de tanto desprezo.
— Meu pai vai anunciar nosso noivado em breve. Se você for esperta, vai se manter no seu lugar. — Ele abaixou a voz de forma quase imperceptível, com um tom de arrogância. — Após o casamento, vou te dar a honra que merece, mas não pense que vou deixar você se meter na minha história com Lina.
Levantei a cabeça, encarando seu olho âmbar.
De repente, o som do trompete da cerimônia soou, cortando o barulho da sala com uma melodia longa e clara.
O lobo Beta, encarregado da cerimônia, entrou na sala.
— Srta. Eva, é hora de começarmos a cerimônia de maioridade.
Os olhos turvos do lobo Beta passaram por minha bochecha inchada, e uma pitada de piedade, quase imperceptível, brilhou em seus olhos. Atrás dele, um homem de capa preta apareceu, com o capuz para baixo, escondendo seu rosto, mas revelando os traços fortes do maxilar. A pessoa carregava uma faca curva com detalhes em prata atravessada no ombro, e o pingente de dente de lobo na bainha balançava suavemente com seus passos.
Era Carlos, o filho mais velho do Alfa, que havia retornado recentemente do treinamento na Floresta Negra.
Imediatamente, a multidão ficou em silêncio, como se o tempo tivesse parado. Os jovens que estavam mais próximos quase desmaiaram de medo. Alguns derrubaram suas taças de vinho, e o líquido se espalhou no chão, criando um estrondo e faíscas no fogo.
Até o lobo Beta tremeu levemente.
Todos sabiam que Carlos, o filho mais velho do Alfa, tinha um temperamento violento. Recentemente, ele havia esfolado um lobo da alcateia rival que o provocou. Parecia que ainda trazia com ele o cheiro de sangue.
Carlos caminhou diretamente na minha direção, girando sua faca curva na palma da mão. A bainha tocou suavemente meu braço.
— O que aconteceu com o seu rosto? — A voz dele tinha uma pressão inconfundível, e seu olhar, sob o capuz, era gélido como lâminas de gelo.
Olhei para seus olhos azuis profundos e, de repente, me lembrei que na outra realidade, ele foi o único que, na hora da minha morte, invadiu o porão sozinho e me retirou de lá. No fim, ele fez inimigos e entrou numa guerra com a alcateia Lua Prateada por minha causa.
— Está tudo bem. — Eu forcei um sorriso, tentando esconder o inchaço do meu rosto.
Caio, com um riso desdenhoso, deu um passo à frente.
— Irmão, não se preocupe com a Eva. — Ele disse se colocando entre mim e Carlos. — Logo ela será minha companheira, e será minha responsabilidade tratar disso.
Ele fez questão de se exibir, estufando o peito.
O Beta franziu a testa e estava prestes a falar, mas foi interrompido pelo olhar de Carlos.
Ele levantou a mão, retirando o capuz, e deixando seu rosto angular visível.
— O Alfa me enviou. Ele disse que a cerimônia de maioridade da filha da família Abreu é um grande evento para a alcateia Lua Prateada. Vamos começar.
Eu o segui enquanto ele seguia para dentro.
— Olha, ela ainda tem que se comportar e obedecer. — Ouvi Caio sussurrando para Lina.