POV: LUANA
Diante de mim estava apenas um homem faminto, sujo, machucado pela vida, mas que precisava de ajuda. Eu não sabia seu nome nem sua história, mas, naquele momento, tudo que eu queria era ajudá-lo.
Quando chegamos em frente à ONG, ele parou, olhou para mim e deu um passo para trás.
— Não precisa ter medo. Venha, aqui vão cuidar de você — falei sorrindo, tentando transmitir confiança.
Ele apertou minha mão de volta e entrou comigo. Pedi que ele se sentasse em um banco e esperasse um pouco. Fui até a sala da diretoria, bati na porta e, quando abriu, sorri:
— Tia Vera, posso entrar? — perguntei, colocando apenas a cabeça para dentro.
— Claro, Lua, entre e fique à vontade — disse ela, se levantando para me abraçar. — O que houve? Mudou de perfume? — perguntou, sorrindo, ao se afastar.
Olhei para minhas mãos sujas, olhei para ela e respirei fundo.
— É sobre isso que quero falar, tia… — disse, enquanto ela voltava a se sentar. — Conheci um morador de rua agora há pouco, quando vinha para cá, e o trouxe comigo. Tem algum problema? — perguntei, sentando em sua frente. Ela respirou fundo antes de responder.
— Estamos superlotados, Lua… — disse ela, torcendo os lábios, enquanto eu abaixava a cabeça, desapontada. — Mas… daremos um jeito — completou, sorrindo, embora apreensiva.
Abri um sorriso largo, aliviada.
— Muito obrigada, tia! — disse com gratidão.
— Onde ele está? Qual o nome dele? — perguntou curiosa.
— O nome eu não sei… Mas ele está lá fora, esperando. Ele precisa de comida… e de um bom banho — respondi, com um sorriso sereno e uma sensação de missão cumprida, mesmo sabendo que aquela era apenas a primeira de muitas vezes em que eu tentaria salvar o mundo, uma vida de cada vez.
— Sim, querida, eu percebi só pelo cheiro que está em você… e logo veremos isso. Mas antes, preciso te dar um conselho. — Ela me olhou séria, e eu a encarei atentamente. — Lua, querida, muito cuidado. Você não pode simplesmente encontrar pessoas na rua e trazê-las para cá ou para qualquer outro lugar. Sei que você tem um coração enorme e puro, mas nem todo mundo é como você. A maldade das pessoas não está estampada no rosto… Por sorte, esse homem é só um morador de rua que precisa de comida e abrigo, e não te fez nada, mas poderia ter machucado você. Prometa que não vai mais se expor assim, querida. — Tia Vera disse firme, e eu abaixei a cabeça.
— Tudo bem, tia, a senhora tem razão. Isso não vai mais se repetir, eu prometo. Mas… nunca ninguém tinha me abordado na rua pedindo comida. Eu senti que ele era diferente… Não sei explicar, tia, eu só queria ajudá-lo, e não apenas com dinheiro que garantiria algumas refeições. Eu queria dar a ele um pouco mais de dignidade e talvez um lar, nem que fosse temporário. E aqui é o melhor lugar que conheço para isso. — Falei olhando em seus olhos. Ela suspirou, pensativa, e sorriu de leve.
— Então vamos até ele e vamos ajudá-lo a ter o que precisa. — disse, se levantando. Caminhamos juntas até a porta.
Seguimos até onde eu o havia deixado. Ele continuava sentado, com o olhar assustado e confuso, talvez até com medo. Nos aproximamos e tia Vera o observou atentamente.
— Olá, meu rapaz. Boa tarde. Qual o seu nome? — tia Vera perguntou gentil, olhando para ele.
Ele apenas a encarou rapidamente e abaixou a cabeça. Tia Vera me olhou, e eu me aproximei dele, me ajoelhando à sua frente.
— Ela só quer te ajudar… A partir de hoje, aqui será como um novo lar para você. Todos vão cuidar bem de você. Não precisa ter medo. — falei suave, tentando tranquilizá-lo.
Ele então levantou os olhos, que encontraram os meus, e depois desviaram para tia Vera.
— Eu… me chamo João. — disse com a voz rouca e arrastada, ainda cabisbaixo.
— Muito bem, João. — ela sorriu, se aproximou e colocou a mão em seu ombro. — Eu sou Vera Saldanha, diretora deste lugar. Aqui faremos tudo que estiver ao nosso alcance para te ajudar. — disse com simpatia, antes de sair, provavelmente para buscar alguém da equipe.
Ela me olhou antes de se retirar, balançou a cabeça com um sorriso orgulhoso e seguiu em frente. Fiquei ali com ele por alguns segundos.
— Eu vou ver as crianças agora… — disse, me levantando. — Mas tenho certeza de que nos veremos depois. Estou sempre por aqui. — falei, me virando para sair.
Quando comecei a me afastar, senti sua mão segurar a minha. Virei-me, e nossos olhares se encontraram.
— Obrigado… — ele disse baixinho, com timidez.
— Não há de quê, João… Fique bem. Logo nos encontraremos novamente. — respondi, sorrindo, antes de soltar sua mão e caminhar até o refeitório, onde ajudaria com as crianças.
Deixei João esperando por tia Vera e fui ajudar no que fosse necessário. O trabalho que essa ONG faz salva vidas. Aqui, existe toda uma equipe preparada para lidar com qualquer situação. Eles não apenas alimentam e dão abrigo, mas também preparam todos para uma vida nova fora dali.
As crianças permanecem até serem transferidas para orfanatos. Enquanto isso, aprendem a ler, escrever, têm aulas de música, dança e são acompanhadas por psicólogos e psiquiatras incríveis.
Com os adultos, não é diferente. Eles também recebem acompanhamento psicológico e psiquiátrico para enfrentar seus traumas, entenderem como chegaram ali e aprenderem a não retornar para a rua. Muitos chegam dependentes químicos; alguns conseguem se livrar do vício, outros, infelizmente, acabam voltando para as drogas e desaparecem pelo mundo. Aqui, eles aprendem profissões básicas como corte de cabelo, manicure, confeitaria, marcenaria, eletrônica e mecânica. Assim, têm a chance real de recomeçar, conseguir emprego e reconstruir suas vidas. Tia Vera tem feito um grande trabalho aqui.