3. Proposta Adulta

Com um olhar rápido para me certificar de que não havia clientes precisando de atendimento imediato, peguei o celular e o trouxe para perto do meu ouvido, deslizando o dedo nervosamente para atender a ligação.

— Boa noite, estou falando com a Barbara Castro? Aqui é Diego Guerra, advogado do Guerra & Carvalho. Tenho tentado entrar em contato com você nos últimos dias, mas parece que nossos horários não estão coincidindo. Me desculpe por ligar esse horário. 

Diego Guerra. Advogado. As palavras ecoaram na minha mente, fazendo meu coração acelerar em antecipação. Por que um advogado estaria me ligando? Ótimo, mais problemas. 

— Sim, sou eu. O que posso fazer por você, Dr. Guerra? — Tentei manter minha voz calma, mas minha mente já estava trabalhando freneticamente para antecipar o motivo da ligação.

— Pode me chamar de Diego. Gostaria de discutir um assunto importante relacionado ao seu pai. Seria possível nos encontrarmos pessoalmente para uma conversa?

— Por favor, me diga que ele me deixou uma herança generosa ou apenas uma coleção de dívidas para eu administrar? — brinquei, mas logo uma onda de preocupação começou a se formar em meu peito.

Diego hesitou por um momento antes de responder: — Na verdade, não estou representando seu pai, mas sim um cliente para quem ele pediu um favor. Seria possível nos encontrarmos pessoalmente amanhã para uma conversa? Ou prefere que eu vá até você?

Cada palavra de Diego só alimentava minha crescente ansiedade. O que meu pai teria feito dessa vez? Minha mente começou a correr através de várias possibilidades, nenhuma delas reconfortante.

Engolindo em seco, eu respondi: — Eu posso ir até o seu escritório amanhã a tarde, umas 17h00. 

— Prefeito, vou te passar as coordenadas. Obrigada, Barbara. 

Desliguei o telefone, mas o peso das palavras de Diego ainda pairava no ar. Meu pai, apesar de relativamente bem-sucedido, tinha suas fraquezas. Com alguns restaurantes pela cidade, ele era uma figura conhecida, mas também vulnerável. A bebida e as apostas o arruinaram, e agora, mais esse baque estava por vir. 

🧜🏾‍♀️

Saí do evento naquela noite com um peso extra nos ombros. A conversa com o advogado tinha me deixado ansiosa e preocupada com o que viria a seguir. A brisa noturna, gelada e penetrante, fazia meu corpo tremer involuntariamente, enquanto eu me encolhia no casaco para tentar me proteger do frio cortante da noite.

Quando cheguei ao estacionamento, encontrei Marisa, minha chefe, parada ao lado de seu carro escuro, cujo brilho na lataria refletia a luz tênue dos postes próximos. Seu olhar sério e determinado me atingiu antes mesmo que eu me aproximasse.

— Você precisa de uma carona? — ela perguntou, uma expressão séria pairando em seu rosto.

Marisa nunca me oferecia carona, o que me deixou ainda mais desconfortável com a situação. Geralmente, eu voltava com Emily ou pegava o ônibus corujão. Sua oferta fez meu estômago revirar, pois eu sabia que havia algo mais por trás disso. Mas eu estava estressada demais para negar. 

— Sim, obrigada, Marisa. Seria ótimo. — Respondi, tentando disfarçar minha inquietação.

Enquanto entrávamos no carro e Marisa dava partida, o silêncio se instalou entre nós, tão denso e opressivo quanto a escuridão da noite ao nosso redor. A única iluminação vinha dos faróis dos poucos carros, que lançavam feixes de luz sobre o asfalto, destacando os obstáculos à nossa frente, mas deixando os pensamentos turvos que inundavam minha mente na penumbra.

— Barbara, você é uma mulher incrivelmente bonita, e eu sei um pouco da sua história. Você tem um potencial enorme neste mundo, poderia ficar nessa vida por um tempo só até se estabilizar. — Marisa olhou para mim, seus olhos transbordando de determinação. 

— Obrigada pelo elogio, Marisa, mas eu realmente não acho que essa seja a melhor opção para mim. Eu quero encontrar uma maneira mais estável de resolver meus problemas. — Minha resposta saiu mais firme do que eu esperava, como se a simples menção de meus princípios fosse suficiente para me fortalecer contra as pressões externas

— Precisa considerar todas as opções. Este mundo pode oferecer oportunidades que você nem imagina. E eu não estou falando apenas de dinheiro, estou falando de segurança, estabilidade. Você não acha que merece isso?

As palavras de Marisa penetraram minha mente como flechas afiadas, encontrando pontos fracos e vulneráveis que eu não sabia que tinha. Enquanto observava as luzes da cidade passarem rapidamente pela janela do carro, senti-me submersa em um mar de dúvidas e incertezas, lutando para encontrar um porto seguro onde pudesse ancorar meus pensamentos tumultuados.

— Claro que eu quero segurança e estabilidade. Mas não acho que seguir esse caminho seja a única maneira de alcançá-las. 

— Entendo seus princípios, mas não posso ignorar as oportunidades que estão diante de você. Muitos homens e mulheres aqui esta noite mostraram interesse em você, perguntaram se você faz atendimento. E aquele italiano, Salvatore, eu percebi como ele a olhou. Mais do que olhou para sua queridinha Emily.

Fechei os olhos e respirei fundo, sentindo o vento gelado chicotear meu rosto. Quando os abri, encarei Marisa com firmeza.

— Olhe para mim, Marisa. Eu simplesmente não sei lidar com esse estilo de vida. Se me observou esta noite, deve ter percebido.

— O eu perfil tímido é uma raridade neste meio. Você não é exagerada, é discreta, e isso é uma qualidade admirável. Saiba que seria muito bem recebida, tratada e recompensada.

— Não posso. — minha resposta saiu mais hesitante do que eu gostaria, como se minhas próprias convicções estivessem começando a se desfazer diante da intensidade do confronto.

— Mas, vamos ser sinceras, as dívidas e o mundo lá fora não se importam com princípios ou dignidade. Eles só querem o pagamento. Pense bem, o que é mais importante para você neste momento? Seguir seus princípios ou resolver seus problemas financeiros?

Marisa olhou fixamente nos meus olhos, sua expressão agora mais dura e incisiva, como se estivesse disposta a usar todas as armas à sua disposição para me convencer a aceitar sua proposta.

— Você gosta de se esconder, não é? De se esquivar da vida real, atrás do balcão do bar. Mas me diga, o que você está perdendo ao evitar encarar as coisas de frente? O que você tem a perder se der uma chance a si mesma? Pense bem, Barbara. Você já enfrentou tantas perdas, o que mais poderia temer agora? Não se iluda com essa noção de dignidade. Pense minha proposta com cuidado, mas não demore muito.

Eu estava exausta, emocionalmente exausta, e cada palavra de Marisa parecia pesar toneladas sobre meus ombros já sobrecarregados.

— Trabalhamos juntas há quatro meses e nunca me fez uma proposta desse tipo. Por que só hoje?

— Porque só hoje eu enxerguei em você.

— O que você viu em mim?

— Tudo. Eu vi Tudo. 

Aquelas palavras ecoaram em meus ouvidos, reverberando como um lembrete implacável de minhas próprias fraquezas e inseguranças. Eu sabia que Marisa estava certa em muitos aspectos, mas também sabia que ceder às suas exigências significaria comprometer toda minha vida. 

O silêncio pairou entre nós enquanto avançávamos pelas ruas até chegar à rua da minha casa. Foi então que Marisa quebrou o silêncio, segurando meu pulso com firmeza, antes que eu saisse do carro. 

— Muito dinheiro, Barbara. — Sua voz estava carregada de expectativa enquanto me encarava.  — Não responda agora, só pense sobre o assunto.

Eu fechei a porta do carro e ela partiu, deixando-me na calçada diante da minha casa. Senti um nó se formar em minha garganta enquanto observava as luzes do carro se afastarem. Suspirei profundamente, sentindo-me exausta após o longo dia de trabalho e a conversa intensa com Marisa.

Caminhei até a porta da minha casa, sentindo o peso das palavras de Marisa ecoando em minha mente. Era difícil não me deixar abalar por suas palavras persuasivas. Enquanto subia os degraus até a porta, o vento frio da noite soprava em meu rosto, como se quisesse levar embora todas as minhas preocupações.

Olhei para a pilha de livros sobre a mesa de centro, mas não tinha cabeça para estudar naquele momento. Minha mente estava repleta de preocupações e questionamentos, e qualquer tentativa de concentração parecia fútil diante da turbulência emocional que eu enfrentava.

Já era tarde da noite, e logo as primeiras luzes do amanhecer começariam a colorir o céu. Um novo dia se iniciaria, trazendo consigo uma carga de responsabilidades e desafios ainda desconhecidos. E o pior de tudo era a perspectiva de encarar esse novo dia sem sequer ter pregado os olhos.

Com um suspiro resignado, recostei-me no sofá, envolvendo-me com o cobertor que estava ao meu alcance. Sabia que precisava descansar, mas minha mente continuava agitada, repassando incessantemente os acontecimentos do dia e as palavras de Marisa.

Envolta pela penumbra da sala, deixei-me levar pela exaustão, na esperança de encontrar algum alívio temporário para as preocupações que me assombravam.

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