O ar, de repente, ficou em completo silêncio.
Uma tensão afiada se espalhou entre os três, como lâminas invisíveis.
Isabela encarou Cristiano.
De repente, levantou o pé e chutou a cadeira ao lado, que tombou com um estrondo ensurdecedor.
O corpo inteiro dela exalava agressividade.
— Explica para a sua mãe. Que sopa eu sei fazer, hein? — Disse Isabela, com a voz cortante.
— Lílian disse que queria tomar a sopa de galinha que EU faço. Isso é provocação escancarada. Você é burro a esse ponto ou simplesmente esqueceu que eu NÃO sei cozinhar? — Continuou ela, palavra por palavra, carregada de raiva.
Cada frase vinha como uma lâmina. Cada palavra, um golpe direto.
Isabela acabara de perder um filho.
O corpo e a mente ainda estavam em choque.
Naquele momento, se alguém ousasse tocá-la, ela explodiria.
Bruna ficou tão furiosa que começou a tremer.
— Você... Você...
— Não sabe cozinhar, então não faz. É só mandar uma empregada fazer. Precisa mesmo fazer esse escândalo todo? — Interrompeu Cristiano, com o rosto sério.
De novo.
Aquele tom de "não é nada demais".
Isabela ficou em silêncio.
Mas, por dentro, o coração esfriava por completo.
Bruna já estava fora de si.
— Afinal, que pecado a família Pereira cometeu para ter tanto azar. Ela mesma não consegue ter um filho e, quando outra dá à luz, ainda vem causar confusão.
— Chega. — Murmurou Cristiano, com a voz grave.
Bruna ficou ainda mais irritada.
— Continua passando a mão na cabeça dela, então. — Cuspiu Bruna, furiosa.
Ela se virou para sair.
Mas, naquele instante, Isabela falou novamente.
— A senhora está errada, dona Bruna. Não é que eu, Isabela, não consiga engravidar. — O tom era frio e firme. — O filho que eu tive, dois anos atrás, foi perdido porque Lílian me empurrou.
O ambiente pareceu congelar.
— Não tente distorcer as coisas. Nem usar essa sua boca de sogra cruel para me carimbar como "mulher que não sabe parir". — Continuou, sem piedade.
Isabela devolveu, sem o menor respeito, o rótulo que Bruna lhe impusera por dois anos inteiros.
As palavras tornavam tudo ainda mais claro.
Pela primeira vez, Isabela traçava uma linha definitiva entre ela e eles.
Ao ouvir aquele tratamento distante, somado à expressão "sogra cruel", Bruna quase perdeu o fôlego de tanta raiva.
— Isso é um absurdo. Você passou de todos os limites. — Gritou Bruna.
Ela enlouqueceu de vez?
Bruna estava tão furiosa com Isabela que parecia prestes a explodir.
Sem conseguir se conter, virou-se diretamente para o filho.
— Essa é a mulher que você escolheu para se casar. Vê se toma conta dela direito. — Acusou Bruna.
Depois de jogar as palavras no ar, Bruna saiu pisando duro, tomada pela fúria.
Por causa daquele "sogra cruel", o olhar de Cristiano dirigido a Isabela já carregava um desagrado evidente.
No entanto, no fim, ele não disse nada.
Apenas se virou e foi embora atrás da mãe.
Observando as costas dele se afastarem, Isabela sentiu um gosto amargo, quase irônico.
Depois de tudo aquilo, ele ainda assim foi.
Seria porque o irmão tinha morrido e ele precisava cuidar de Lílian?
Ou porque, no fundo, ele sempre quis cuidar dela?
Quando os dois já tinham saído, Débora se aproximou com o rosto cheio de preocupação.
— Dona Isabela, a senhora está muito pálida. Quer que eu chame um médico para dar uma olhada. — Disse Débora, com cuidado.
Até a empregada percebia que algo estava errado, que o estado dela não era normal.
Mas Cristiano não viu.
Ou não quis ver.
Isabela fez um gesto impaciente com a mão.
— Não precisa. Desça agora.
A raiva que fervilhava dentro dela já escapava pelos gestos e pelo tom seco da voz.
Débora hesitou por alguns segundos.
No fim, apenas assentiu em silêncio e se retirou.
Quando ficou sozinha, o celular de Isabela começou a vibrar, insistente.
Era Karine Martins, sua melhor amiga.
Ao ver o nome na tela, a fúria que queimava dentro dela diminuiu um pouco.
— Karinha...
— Eu passei a tarde inteira te ligando. Onde você estava que não atendia? Você sabe que a Lílian teve gêmeos hoje? — Karine disparou do outro lado, aflita.
— Eu sei. O Cristiano estava lá acompanhando o parto. — A voz de Isabela era fria.
— Você SABIA? E deixou? A cunhada dando à luz, e ele acompanhando como se fosse o quê. A família Pereira inteira não era suficiente para servir a Lílian, não? — Karine quase gritou.
Ao ouvir que Cristiano nem se preocupava em evitar suspeitas, Karine ficou ainda mais indignada, defendendo Isabela sem reservas.
Desde a morte de Marcos, fazia apenas seis meses.
Isabela vinha engolindo uma raiva atrás da outra diante da completa falta de limites de Lílian.
Será que ele, como marido, realmente não percebia?
Ou simplesmente não se importava com o que Isabela sentia?
— E o que eu posso fazer? Aquele rosto dele, idêntico ao do Marcos, acalma o coração deprimido dela. — Respondeu Isabela, com a voz tão fria quanto o olhar.
Não era exatamente essa a desculpa que a família Pereira usava o tempo todo?
Uma vez após a outra, arrancavam Cristiano de ao lado dela com esse mesmo argumento.
Sempre que Lílian surtava, a primeira ligação era para Cristiano.
Karine sabia de tudo isso e ficou ainda mais furiosa.
— Sinceramente, essa família Pereira inteira tem problema da cabeça.
Lílian não aceitava que Marcos tivesse morrido.
Então mantinham Cristiano diante dela o tempo inteiro.
Mas Cristiano tinha esposa.
Consolar outra mulher?
Que porra era essa?
— Eu tive um aborto hoje à tarde. Quando você me ligou... Eu estava na mesa de cirurgia. — Disse Isabela, de repente.
Silêncio.
Do outro lado da linha, Karine ficou completamente muda.
"Não. Espera."
Quando a ficha finalmente caiu, Karine explodiu.
— Você perdeu o bebê... E o Cristiano estava acompanhando a cunhada no parto? — A voz de Karine tremia de indignação. — Ele enlouqueceu. Ele sabe do que aconteceu com você?
A própria ideia parecia absurda.
A esposa passando por uma cirurgia de aborto, e o marido ao lado de outra mulher dando à luz.
Aquilo não era normal.
Era doentio.
Isabela abriu os olhos, frios, vazios.
— Venha me buscar. Pegue o carro e passe aqui. — Disse de forma simples.
Ela estava exausta.
E odiava aquele lugar.
Cada canto da casa, até o ar, lhe causava repulsa.
Depois de desligar com Karine, Isabela subiu as escadas.
No quarto, com movimentos rápidos, reuniu tudo o que era pessoal.
Em seguida, recolheu também todos os objetos que, ao longo dos anos, comprara para Cristiano.
Sem exceção.
Débora a viu descer carregando uma pilha de coisas e, do lado de fora da mansão, atear fogo nelas.
Assustada, correu para tentar impedir.
— Dona Isabela, o que a senhora está fazendo. Não queime isso. — Pediu Débora, aflita.
— Se a dona Bruna ficar sabendo... — Acrescentou, nervosa. — Ela vai dizer que isso dá azar, que é mau agouro.
Depois de tudo o que acontecera antes, Bruna já estava furiosa daquele jeito.
Se visse aquilo agora, ninguém sabia até onde iria o veneno da língua dela.
— Que seja azar, então. Se eu soubesse fazer feitiçaria, eu amaldiçoaria a família Pereira inteira até a morte. — Isabela respondeu, sem qualquer freio.
A voz dela estava carregada de ódio e repulsa.
Enquanto falava, virou-se e subiu novamente as escadas.
Uma vez.
Depois outra.
E outra.
Cada ida ao andar de cima era para trazer mais coisas ligadas a Cristiano.
Roupas.
Relógios.
Objetos comprados por ela ao longo dos anos.
Tudo foi lançado, sem exceção, no fogo que crescia.
Quando Karine chegou, a cena diante dela foi brutal.
Isabela estava parada diante da mansão.
À sua frente, as chamas subiam alto, iluminando a noite inteira.
O rosto pálido dela refletia o fogo.
Sem medo.
Sem lágrimas.
Apenas frieza e indiferença.
Karine avançou sem hesitar.
Alta, envolveu Isabela inteira em um abraço firme.
Em seguida, abriu o guarda-chuva por cima das duas para protegê-la da chuva.
— Você acabou de sofrer um aborto e está tomando essa chuva toda. Quer ficar doente para o resto da vida? — Repreendeu Karine, com raiva e preocupação misturadas.
Sem dar espaço para resposta, Karine a puxou consigo.
Com o braço ainda em volta dela, levou Isabela direto para o carro.
Ao sentir o calor do corpo de Karine, depois de uma noite inteira com os nervos esticados ao limite, toda a tensão de Isabela finalmente desabou.
O corpo dela relaxou de uma vez.
Como se, só naquele instante, ela finalmente tivesse permissão para cair.
Dentro do carro, Karine pegou uma toalha seca e começou a enxugar o cabelo molhado de Isabela de qualquer jeito.
— O que você estava queimando, afinal?
— O que eu comprei para ele... E o que ele comprou para mim. — Respondeu Isabela.
Karine lançou-lhe um olhar de lado.
— Se quiser chorar, pode chorar. Eu sei que, depois da cirurgia, o ideal é não chorar muito... Mas guardar tudo por dentro faz pior. — Disse Karine, num tom suave.
Ela e Cristiano tinham sido tão bem um com o outro.
E, no entanto, em apenas seis meses, tudo tinha sido esfacelado daquele jeito.
Isabela continuou enxugando o cabelo.
Soltou uma risada baixa, sem qualquer alegria.
— Chorar? Não. Como é que eu vou chorar sozinha? — Murmurou Isabela.
Ela ergueu os olhos.
— Eu vou fazer quem deve chorar... Chorar até não sobrar lágrima. — Disse, fria.
Karine ficou em silêncio.
Quando o cabelo já estava quase seco, Isabela largou a toalha.
— Você vai ver. A família Pereira vai ter gente chorando sem parar daqui para a frente. — Disse Isabela.
Diante daquele olhar sem nenhuma temperatura, Karine assentiu devagar.
— Isso mesmo. Quem tem que chorar são eles. Não você. — Concordou.
No mundo dos sentimentos, não existe espaço para uma terceira pessoa.
Não importa de que forma ela apareça.
E, pior ainda, Lílian, nesses últimos seis meses, vinha disputando Cristiano de forma descarada.
Tão sem limites assim porque tinha certeza de que Isabela não tinha como enfrentá-la.
Karine ligou o carro e saiu da frente da mansão.
A chuva batia forte nos vidros.
O limpador de para-brisa se movia sem parar.
— Depois daquele aborto de três anos atrás... Você não conseguiu mais engravidar, né? — Karine falou de repente.
Três anos antes, Isabela e Cristiano tinham tido um filho.
Mas, antes mesmo de ela perceber que estava grávida, Lílian a atropelara com o carro.
O bebê fora perdido na hora.
Na época, Lílian chorara mais do que ela, repetindo o tempo todo que não tinha sido de propósito.
E, como sempre, o assunto acabou engavetado, sem consequência alguma.
Na época, Marcos ainda estava vivo, e Lílian não demonstrava nenhum tipo de interesse por Cristiano.
Por isso, Isabela não tinha ido mais fundo naquela questão.
Mas agora, olhando tudo em retrospecto, talvez Lílian já tivesse más intenções desde muito antes.
Ela provavelmente já sabia da gravidez naquela época.
E o que aconteceu...
Foi proposital.
Depois daquele dia, Isabela nunca mais conseguiu engravidar.
Durante esses dois anos, por não conseguir conceber, Bruna passou a tratá-la com desprezo.
Nunca satisfeita.
Nunca cordial.
Mandava que pessoas lhe entregassem, uma após a outra, sacos e mais sacos de remédios para regular a saúde.
E hoje...
Quando Lílian entrou em trabalho de parto e a empurrou com força, Isabela sentiu com absoluta clareza.
Não tinha sido um acidente.
— Naquela época eu não achei nada estranho... — Disse Karine, pensativa. — Mas nesses seis meses desde que o Marcos morreu, vendo a forma como a Lílian trata o Cristiano... Quanto mais eu penso, mais parece que aquele atropelamento foi de propósito.
A expressão "de propósito" fez o ar ao redor de Isabela esfriar ainda mais.
Dois anos atrás...
Justamente neste mesmo dia.
— Hoje também foi ela que me empurrou. — A voz de Isabela era glacial.
Na mente dela, a cena se repetia.
Cristiano carregando Lílian nos braços, passando por ela caída no chão, e aquele olhar impaciente.
— Não faça drama.
A raiva começou a circular sem controle no peito de Isabela.
— Então quer dizer que, dois anos atrás, foi mesmo intencional... — Karine concluiu, indignada. — Com o marido ainda vivo, ela já estava cobiçando o próprio cunhado. Isso não é normal... Essa mulher é doente.
Isabela permaneceu em silêncio.
Mas o silêncio dela era mais cortante do que qualquer resposta.
"Doente?
Agora, olhando tudo com clareza, sim.
Principalmente nesses últimos seis meses."
A obsessão de Lílian por Cristiano, aquela necessidade desesperada de posse, custe o que custasse, aquilo não era amor.
Era doença.
— E agora? — Perguntou Karine. — Você vai simplesmente deixar isso para lá?
"Deixar para lá?"
Isabela virou o olhar para fora da janela.
A chuva caía pesada.
Em poucos minutos, a rua já estava tomada por água acumulada.
Ela parecia o tipo de mulher que engolia tudo e seguia em frente?
Os olhos de Isabela estavam tão frios quanto aquela chuva.
— Primeiro, eu me divorcio do Cristiano. Depois... — Disse.
Depois o quê?
Ela não concluiu.
Em vez disso, perguntou, como quem muda de assunto.
— O negócio de exportação da Vanessa... Nesses últimos anos, continuou indo muito bem, né. — Disse Isabela, com calma.
Vanessa Dias.
A mãe rica de Lílian.
Se Lílian ousara tanto nos últimos dois anos, era porque se apoiava em duas pessoas.
Bruna, a sogra.
E Vanessa, a mãe bilionária.
Karine franziu a testa.
— Sim. Mas por que você está falando da mãe dela? — Respondeu. — Aquela mulher não é alguém que qualquer um consegue enfrentar.
Era um aviso sincero.
Vanessa tinha levado seus negócios a um patamar gigantesco.
Não chegara ali sendo ingênua.
— E se o negócio dela parasse? — Perguntou Isabela, com a mesma calma.
Karine ficou sem palavras.
"Parasse?"
— O material que ela exporta só tem mercado no exterior. Se isso fosse interrompido, seria praticamente tirar a vida dela. — Disse por fim.
— Amiga... Por que você está perguntando isso? Eu não tenho como peitar a família Dias. — Acrescentou, visivelmente apreensiva.
As conexões da mãe de Lílian eram profundas demais.
Ela era como uma árvore antiga em Nova Aurora, com raízes entrelaçadas por toda parte, impossível de derrubar facilmente.
Vendo que Isabela não respondia, Karine apertou a mão dela, gelada.
— Não faça nenhuma loucura.
"Loucura?"
Isabela permaneceu em silêncio.
Mas, dentro da mente dela, surgia com nitidez a imagem de um homem estrangeiro.
Aquele homem do País Y que, um mês antes, tinha ido procurá-la e a envolvera em seus braços.