Karine queria levar Isabela para a sua casa.
Mas Isabela insistiu em ir para o Residencial Prime, na Rua das Acácias, o apartamento que ela mesma tinha comprado três meses antes.
Aquilo, por si só, já dizia tudo.
Naqueles últimos seis meses, ela vinha se preparando para deixar Cristiano.
— Eu falo para você ir para a minha casa e você não vai... — Reclamou Karine. — Você precisa de alguém cuidando de você agora. Quando foi que você comprou esse apartamento?
Enquanto falava, Karine pegou uma manta e a colocou sobre Isabela.
Depois, foi até a cozinha e começou a preparar uma sopa de frango.
Isabela ajeitou a manta sobre o corpo.
— No segundo mês depois da morte do Marcos.
"Segundo mês?
Era cedo demais."
Karine ficou em silêncio por um instante.
— Então, naquela época você já estava pensando em se divorciar do Cristiano?
Isabela respondeu apenas com um "sim" baixo.
Ela estava exausta.
Deitou-se direto no sofá.
No mês em que Marcos morreu, Cristiano quase não voltava para casa.
Passava os dias inteiros na mansão da família Pereira.
Mesmo quando aparecia, bastava uma ligação de lá por causa de Lílian, e ele ia embora imediatamente.
Uma relação distorcida daquele jeito, quem aguentaria?
O celular vibrou.
Era o telefone fixo da mansão.
Isabela não pensou duas vezes.
Desligou e bloqueou.
Logo em seguida, o celular de Karine tocou.
Era Cristiano.
Karine atendeu com um sorriso frio na voz.
— Ué, sua cunhada já não quer mais você por perto?
Do outro lado da linha, veio a voz grave de Cristiano, visivelmente contida.
— Passe o telefone para a Isabela.
Assim que chegou ao hospital, Cristiano recebeu uma ligação de Débora dizendo que Isabela tinha ido embora.
Ele correu de volta para a mansão.
Antes mesmo de entrar, viu que as pedras decorativas na entrada estavam queimadas, completamente enegrecidas.
Débora disse que tinha sido obra de Isabela.
No closet, as coisas dela tinham sumido.
Roupas, objetos pessoais, tudo.
E também tudo o que ela já tinha comprado para ele.
Nada restara.
Ela tinha queimado tudo.
O que diabos ela estava tentando fazer?
Depois de tudo isso, ainda não tinha descarregado a raiva?
Do outro lado da linha, Karine soltou uma risada irônica.
— Sua cunhada acabou de dar à luz e está fraquinha. — Disse, venenosa. — Você devia estar cuidando bem dela. Por que está procurando a Belinha, afinal? O que a Belinha é sua, mesmo?
— Karine.
A raiva de Cristiano finalmente começou a transbordar.
Karine, por instinto, virou a cabeça para olhar Isabela.
Ela estava sentada no sofá, mexendo no celular, com o rosto fechado, sombrio.
Parecia não estar prestando atenção na ligação.
Karine pegou o telefone e entrou na cozinha.
Fechou a porta.
— Cristiano, você é doente da cabeça, porra. A Lílian te vê como o Marcos ou quer que você, com essa cara idêntica, vire o substituto dele. — Disparou. — Você acha mesmo que não dá para perceber?
Ela respirou fundo, furiosa.
— E você ainda não sabe evitar suspeita, não sabe se afastar? Pelo contrário, fica se oferecendo. Você tem ideia do que estão falando de vocês em Nova Aurora inteira? Ou você realmente não sabe? Ou está fingindo que não ouve, não vê, não entende nada?
Karine teria desligado se pudesse.
A raiva já dava dor no fígado.
Lílian não tinha o menor pudor.
E toda a família Pereira fazia vista grossa, com Cristiano cooperando com tudo, sem a menor resistência.
Cristiano cerrou os dentes.
— Eu já disse. Passe o telefone para a Isabela.
Isabela tinha ido longe demais naquela noite.
A paciência de Cristiano tinha se esgotado por completo.
Ele simplesmente não queria mais perder tempo discutindo com Karine.
— Ela acabou de sofrer um aborto. — Respondeu Karine, fria. — Não pode passar raiva.
— Com essa sua atitude, é melhor nem falar com ela. — Continuou, venenosa. — Se não sabe ser marido, não saia por aí destruindo a vida dos outros. Sua cunhada precisa tanto de você. Então fica com ela para o resto da vida.
Se Cristiano não sabia cuidar, ela, Karine, cuidaria.
Ao se lembrar do que Isabela dissera, "Hoje também foi ela que me empurrou."
Karine não deu mais espaço.
Desligou.
Quando voltou para a sala, viu Isabela segurando o celular com tanta força que os nós dos dedos estavam brancos, tensos.
— O que você está vendo aí? — Perguntou. — Se é coisa que te deixa mal, não olha.
Karine estendeu a mão para pegar o aparelho.
Mas Isabela desviou.
— Terra Serena. — Disse de repente. — Você conhece?
Karine piscou, surpresa.
— Claro. — Respondeu. — Você participou do projeto de design turístico de lá há três anos. No final, seu projeto não foi escolhido, né?
Terra Serena.
Um lugar que Isabela sempre amara.
Especialmente em outubro, quando as folhas douradas e avermelhadas cobriam tudo, era a paisagem favorita dela.
As duas já tinham estado lá juntas.
Depois, quando a região abriu concorrência para desenvolvimento turístico, Isabela participou diretamente do processo de criação.
Durante três meses, virou noites.
Foi ao local mais de cinco vezes para estudos de campo.
Mesmo assim, o projeto dela acabou descartado.
— Por que você está perguntando isso agora? — Karine não entendeu.
Isabela estendeu o celular para ela.
Na tela, havia uma reportagem recente.
Terra Serena já havia sido desenvolvida com sucesso como destino turístico.
Influenciadores digitais estavam indo para lá, as avaliações eram altas, e os comentários, extremamente positivos.
— Isso... — Karine ficou olhando a tela, atônita. — Espera...
Ela reconhecia aqueles pontos turísticos.
Cada mirante, cada trilha, cada área de descanso.
Karine franziu o cenho.
— Isso aqui... Não é exatamente o seu projeto de antes?
Três anos atrás, Isabela tinha pensado cada detalhe do ponto de vista de um turista.
Por isso, todos os elementos do design estavam gravados na memória de Karine.
O rosto dela escureceu.
Sem dizer mais nada, Karine começou a digitar rápido na busca do celular, abrindo uma reportagem após a outra sobre Terra Serena.
Por fim, entrou na página de detalhes do projeto.
Quando aquelas palavras apareceram na tela, "Designer responsável: Lílian", Karine quase arremessou o celular no chão de tanta raiva.
Ela respirou fundo, com a mão tremendo, e estendeu o aparelho para Isabela.
Isabela olhou para a tela.
Ao ver o nome "Lílian", soltou uma risada baixa, carregada de ironia.
— Então foi assim que eu perdi. — Murmurou. — Agora tudo faz sentido.
Os lábios de Karine se apertaram.
Os olhos brilhavam de fúria.
— Eu estava pensando em começar pela mãe dela... — Disse Isabela, com uma calma mortal. — Mas agora ficou melhor ainda. Vamos começar por ela mesma.
Ao ouvir aquilo, o coração de Karine deu um salto violento.
— Amor... Do que você está falando? — A voz saiu tensa.
"Começar por ela?"
Ela queria mexer com Vanessa e com Lílian?
Isso já não era só raiva.
Mesmo tomada pela raiva, Karine percebeu que, naquele momento, Isabela havia perdido completamente a lucidez no olhar. Por isso, forçou a si mesma a manter a calma.
— Amor, vamos com calma. — Disse, firme. — Sem falar que a família Pereira inteira, inclusive o Cristiano, sempre puxou o saco da Lílian.
— E aquela mãe dela... — Acrescentou, séria. — Você não tem como enfrentar a Vanessa. Não faz besteira, tá?
Isabela ergueu o canto da boca num sorriso carregado de desprezo.
— Não tenho como?
Ela jamais esqueceria o quanto Vanessa parecia arrogante e intocável.
Mas e se ela perdesse o que a tornava intocável?
E se perdesse o capital que sustentava toda aquela soberba?
Ao lembrar de tudo o que Lílian tinha feito ao longo dos anos dentro da família Pereira, sempre em conluio com Bruna, a sogra, o último vestígio de sorriso nos olhos de Isabela se transformou inteiramente em ódio e ressentimento.