Capítulo 06

Sarah.

Quando tudo aconteceu e eu saí do escritório, Murilo tinha todos os motivos do mundo pra nunca mais olhar na minha cara, já que eu larguei tudo de uma hora pra outra e deixei seu irmão a ver navios, mas quando Daniel resolveu pular do barco e me deixar sozinha e grávida da Isa, ele me estendeu a mão.

Minha filha nasceu linda, com os cabelos volumosos iguais aos meus e graças aos céus, nasceu com poucas características do pai, o que foi o suficiente pra ele questionar a paternidade e sumir sem dar qualquer assistência a própria filha.

Alexia me ajudou muito no processo de adaptação, mesmo repetindo que eu poderia dar uma vida mais confortável a minha menina se voltasse a advogar.

Eu estava desesperada, minhas economias estavam no fim e quando Isa estava prestes a fazer três anos, eu descobri a leucemia. Mais uma vez o desespero me tomou e eu busquei emprego na Sweet, onde eu havia trabalhado muitos anos antes, na adolescência, antes da faculdade.

Eu não sabia que o Murilo havia comprado a boate, depois que ele teve problemas nas lutas clandestinas e saiu do país eu não tinha quase nenhum contato com ele, a não ser pelas mensagens pedindo fotos da Isa e perguntando se precisávamos de algo.

Estar aqui enquanto ele me olha com tanta decepção, me faz sentir horrível, como se eu houvesse traído o único amigo que esteve disposto a me ajudar.

— E então, Sarah? — Ele me tira dos meus pensamentos e só então percebo que estamos parados no estacionamento de um restaurante.

— Descobri a leucemia duas semanas antes de procurar emprego na Sweet. — Falo de cabeça baixa, sem coragem de encará-lo — Ela não ganhava peso e como eu tive muitos problemas de anemia quando criança, associei a isso. O médico fechou o diagnóstico e o dinheiro que eu tinha guardado custearia o tratamento, mas não as contas de casa, então eu busquei o emprego, sem saber que a boate era sua.

— Porque você não me contou, Sarah? Eu poderia ajudar. — Ele segue a sua inquisição.

— Você lembra o estado em que deixou o rosto do Daniel quando soube que ele abandonou a Isa? — Finalmente encaro seus olhos, com os meus marejados e ele sorri, irônico.

— Então isso foi pra proteger aquele inútil? Impressionante! – Fala com desdém e eu faço um sinal negativo com a cabeça.

— Não! – Aumento o tom de voz, parando e respirando fundo em seguida — Eu não quis arrumar mais confusões, não mudaria nada. – Falo, agora mais baixo.

— Ele sabe? — Abaixo a cabeça, sem conseguir encará-lo.  — O Daniel, Sarah. Ele sabe da leucemia da Isabela? – Repete a pergunta, agora impaciente — Ele sabe, não é?!

— Não faz diferença, Murilo! Pelo amor de Deus! A essa altura eu sequer quero aquele maldito perto da minha filha! – Esbravejo — Ele é um filho da puta e isso não é só pelo abandono que aliás, agora eu até agradeço. Ele foi um desgraçado comigo mesmo antes da Isabela. — minha voz sai, quase inaudível.

— O que ele fez pra você? — Transparecendo ódio.

— Não faz diferença e eu não vou falar sobre isso. – Sou firme — Agora você só precisa saber que a Isa está quase no final do tratamento e se tudo der certo, ela vai se livrar dessa doença maldita sem precisar daquele traste por perto. Pergunte o que quiser sobre a minha filha, mas eu não vou falar sobre o Daniel.

— Eu estou desapontado, Sarah, de verdade. Mesmo longe eu prometi te ajudar com a Isa e você sempre respondia as minhas mensagens com fotos dela, falando que ela estava bem, parece que você não confia em mim.

— Eu confio, Murilo, e agradeço de coração as mensagens que você enviou mesmo estando cheio com os seus próprios problemas, mas eu não queria te trazer mais um. — Seguro sua mão — Eu não estava pronta pra reconhecer mais um fracasso, Murilo. Fracassar como advogada me machucou muito, mas não chega nem aos pés da dor de fracassar como mãe.

— Fracassar como mãe? — Ele agora me olha confuso — Sarah, você mesmo falou que a sua filha está se curando, graças ao seu esforço. Eu não vejo fracasso algum em você, vejo força, amor, qualquer outro sentimento, não fracasso.

Ouvir Murilo reafirmar tudo o que Alexia me fala diariamente, me dá uma vontade tão grande de chorar, que quando eu dou por mim, Murilo tem os braços em volta de mim, enquanto choro copiosamente em seu peito.

Meus cabelos sentem o afago delicado de suas mãos, exatamente como eu senti quando tudo aconteceu, cinco anos atrás.

João, Murilo e eu sempre fomos amigos, mas João sempre foi mais sério e eu acabei tendo uma relação mais estreita com o Murilo. Eu sei que se ele soubesse da Isa antes, teria me ajudado, mas também sei que se ele soubesse um terço da postura doentia do Daniel, os problemas que ele teve com seus arroubos de raiva seriam bem maiores e, honestamente, eu já carrego culpa o suficiente.

—Murilo? — Chamo, quando finalmente consigo parar de chorar — Eu confio em você, mas eu tive medo, me perdoa?

Ele desfaz o nosso abraço e beija a minha testa, enxugando as minhas lágrimas antes de responder:

— Eu sou seu amigo, Sarah, mesmo que eu passe vinte anos longe, ainda serei seu amigo. — Me encara com o semblante passivo — Eu não estou bravo, mas estou decepcionado, apesar de entender seus motivos. A partir de agora, eu quero acompanhar de perto o tratamento da Isa, tudo bem?

— Tudo bem, Murilo... – suspiro cansada.

— Posso vê-la, quando chegarmos lá? — Pergunta sorrindo.

— Eu não sei como ela vai estar depois da quimio, mas podemos tentar – sorrio fraco — Ela as vezes fica enjoada, apática e só melhora com alguns dias.

— Vocês não estão sozinhas, tá? – Me olha nos olhos e eu assinto, sentindo-os marejados — Agora vamos, eu tenho uma sobrinha pra mimar.

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