Capítulo 05

Sarah.

A adrenalina desse retorno inesperado após tantos anos está me fazendo ganhar um ânimo que, honestamente, eu nunca mais achei que fosse sentir. Eu agradeço ao Murilo pela oportunidade que me deu, mesmo que ele tenha tentado me convencer todos esses anos de que era um desperdício, e cada vez que algum daqueles nojentos tentava me fazer uma proposta mais nojenta ainda, eu tinha vontade de perder meu réu primário.

Por falar em Murilo, eu sei que a conversa com ele será difícil já que ele foi o único a me estender a mão e ainda assim, eu escondi a situação da Isabela, mas eu sabia que no momento em que contasse, teríamos dois problemas: ele querer ir atrás do Daniel, ficar furioso ao saber que ele sabe de tudo e escolheu largar a filha a própria sorte, e querer envolver o João afim de me fazer voltar a advogar.

Sei que devo uma explicação ao Murilo, mas honestamente, não sei se estou pronta para essa conversa.

A culpa que eu sinto pela morte daquela criança é mais forte do que eu posso suportar. A voz do maldito que causou as duas mortes, gritando que não havia sido ele, logo antes de se jogar daquele maldito viaduto, povoam os meus piores pesadelos até hoje, porque a culpa foi minha, eu acreditei nele e por isso aquela criança morreu.

Afasto meus pensamentos limpando uma lágrima furtiva que insiste em cair e me aproximo do Tio Lira, que não está com uma expressão muito feliz no rosto. Seguro seu ombro com delicadeza e ele me olha, desfazendo a carranca que logo dá lugar a um sorriso, seguido de um abraço caloroso:

— Como estamos por aqui, sargento? — Chamo pela patente e ele estreita os olhos, me fazendo gargalhar.

— Sargento? O que houve com o “tio Lira”? — Reclama, fazendo aspas com as mãos.

— Só uma questão de profissionalismo, tio. – dou de ombros — Percebi os olhares curiosos dos seus homens quando te chamei de tio mais cedo e não quero atrair atenção desnecessária pra mim.

— Aquela história de culpa mais uma vez, minha menina? — Assinto e ele suspira — Eu nem vou te falar mais uma vez o que penso – me encara com seriedade — imagino que você tenha vindo pra ver o andamento das investigações, não é?

— Algo que possa me interessar?

— O problema de crimes em áreas comuns é que fica quase impossível isolar corretamente, mas conseguimos recuperar alguns pertences, o celular também foi apreendido, assim como um notebook encontrado nas coisas dele.

— Estou trazendo cinco estagiários do João pra me ajudar com as provas, porque pelo que vejo, teremos bastante para desvendar nessa história.

— É bom ter você de volta, menina. — Beija minha testa e eu sorrio — Preciso te mostrar algo que eu achei no quarto mas que não fez muito sentido pra mim, pode me acompanhar?

— Claro, vamos.

Saímos desviando das muitas pessoas no andar e logo entramos em um dos quartos que foi reservado para o trabalho da perícia. Assim que entramos no local indicado  pelo tio Lira, um documento na mesa de um dos peritos me chama atenção e eu me aproximo:

— Esse é o Rg do Marcos Ruas? – Pergunto e o perito assente — Posso fotografar? — Ele olha o tio Lira que assente e eu fotografo o documento, guardando o celular em seguida.

— Aqui, Sarah – ele aponta uma outra mesa, cheia de papéis — Não sei se é relevante pra investigação, mas eu lembro de ter te dado um livro parecido quando você fez treze anos.

Me aproximo do livro, olhando o título escrito em alto relevo e arqueio as sobrancelhas pensando que é a segunda vez que esse título me aparece em uma investigação de um suposto suicídio.

— Otelo. – Seguro o objeto envolto em um saco de provas e sorrio amargurada — Lembro de ter lido esse livro em pouco mais de uma semana e ter ficado fissurada por ele.

— Eu sei, sua mãe reclamou bastante comigo. — Gargalhamos juntos, mas logo meu sorriso morre.

— Essa é a terceira vez que esse livro me aparece e a única delas que foi feliz, foi quando ele me veio como presente. – Suspiro — Charles tinha um igual, inclusive, quando ele se jogou daquele maldito viaduto, o livro ficou lá em cima.

— Eu lembro, por isso te trouxe aqui. – Afaga meus cabelos.

— O meu foi perdido na última mudança dos meus pais antes do acidente. Posso ver por dentro? — Ele nega.

— Só depois da perícia, que deve levar pelo menos dois meses, aí eu mesmo garanto que ele vá direto para as suas mãos, ok?

Assinto e saio da sala, ao mesmo tempo que João chega com os cinco assistentes que eu pedi, ao lado do Enrico e do Murilo que ainda me lança o mesmo olhar inquisidor.

Passo cerca de meia hora ambientando os estagiários e delegando a área onde cada um deve trabalhar, depois, converso um pouco mais com o tio Lira e os rapazes e quando finalmente consigo material o suficiente para estudar o caso mais a fundo, me despeço do meu tio com um beijo na bochecha, abraço forte o João agradecendo a confiança e me limito a lançar um meneio de cabeça ao Enrico, que me responde da mesma forma.

Saio em silêncio seguida pelo Murilo que me observa o tempo inteiro e apenas quando coloca o carro em movimento, me olha e finalmente começa a falar:

— Então, Sarah, acho que você já me enrolou demais, não acha? Eu mereço uma explicação.

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