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​Capítulo 5 — Os Sussurros da Cidade

​O amanhecer em Ravenshore era sempre uma promessa não cumprida de sol. A neblina era uma entidade permanente, rastejando sobre as colinas e cercando a Mansão Halloway como um segredo bem guardado.

​Sophia passou a manhã evitando a ala leste da casa e, principalmente, Lady Margaret. O toque gélido de Alaric ainda vibrava em sua clavícula. Ela era uma presa — uma presa que acabara de empurrar o predador para longe. O que ele faria agora?

​Quando o relógio soou as três da tarde, Lady Margaret a chamou.

​— Venha, Sophia. Vamos ao povoado. Precisamos de provisões, e você precisa se acostumar com a paisagem de Ravenshore.

​A carruagem, desta vez com um cocheiro mais robusto e silencioso, avançou lentamente pela estrada encharcada. A paisagem era desolada, mas pitoresca: casas de pedra cinzenta, cercas vivas e igrejas antigas com campanários retorcidos.

​Margaret estava sentada à sua frente, imperturbável.

​— O povoado é pequeno e fechado, minha cara. Eles não gostam de estranhos.

​— Por que não? — perguntou Sophia.

​— As pessoas daqui têm medo do que não entendem. E aqui, muitas coisas nunca são totalmente compreendidas.

​O aviso da tia parecia envolver mais do que apenas superstição local.

​Ao chegarem à praça central, a atmosfera era tensa. Os poucos moradores que circulavam vestiam roupas escuras e mantinham os olhos baixos. Não havia risos, apenas o murmúrio grave de conversas apressadas.

​Lady Margaret a deixou na modista, com instruções firmes: — Compre o que precisar, mas não se afaste. Estarei no boticário.

​Sophia assentiu, aliviada por estar longe do olhar vigilante da tia.

​Dentro da loja, o cheiro de tecido novo misturava-se ao de especiarias. A modista era uma mulher magra, de rosto marcado e olhos alertas. Enquanto Sophia examinava alguns xales, ela ouviu, abafada, uma conversa que vinha do fundo da loja.

​— ...É o terceiro em seis meses. Dessa vez, o filho do Sr. Thorne. Sumiu do celeiro sem deixar rastros.

​— A névoa o levou, eu digo. A névoa sempre leva os incautos.

​— Não é a névoa, Agnes. É ele. O Senhor da Noite voltou a caçar.

​O coração de Sophia acelerou. O Senhor da Noite. Ela se moveu discretamente até a porta entreaberta que dava para os fundos.

​— Não fale bobagens! — disse a voz da modista, em um sussurro aflito. — Isso estava adormecido há anos!

​— Adormecido, sim. Mas ele sempre volta. As pessoas somem por um tempo... e depois ele reaparece, e os fortes... os de bom sangue... eles somem.

​Sophia prendeu a respiração. Somem. O frio de Alaric. A atração dele por seu "bom sangue".

​— E por que ele voltou agora? — perguntou a outra mulher, a voz cheia de temor.

​— Não sei. Mas o ciclo começou de novo. E ninguém está seguro enquanto ele estiver acordado.

​Sophia recuou, sentindo o estômago revirar. Os desaparecimentos. A criatura que ela havia empurrado. Ela não tinha ideia de o quê ele era, mas sabia o que ele fazia: ele se alimentava. E o ciclo havia recomeçado com a chegada dela.

​O sino da porta tocou, e Sophia voltou rapidamente ao balcão.

​— A senhorita está bem? — perguntou a modista, observando-a. — Está pálida.

​— Apenas o ar… de Ravenshore. É pesado.

​— É a verdade. É um ar que carrega muitos lamentos.

​Sophia comprou um tecido qualquer e saiu apressadamente para a rua. Ela precisava encontrar Margaret e ir embora.

​Ela viu sua tia saindo do boticário, segurando um pequeno frasco de vidro escuro.

​— Está na hora de ir — disse Margaret, notando a palidez de Sophia. — O ar aqui não te faz bem.

​— Sim — respondeu Sophia, entrando na carruagem. — O ar aqui está cheio de histórias sobre pessoas que desaparecem.

​O olhar de Lady Margaret endureceu.

​— Fofocas de camponeses, Sophia. Eles sempre culpam a noite e a névoa por seus próprios erros.

​— Eles chamam de ‘O Senhor da Noite’. — Sophia encarou a tia. — Ele sumiu por um tempo e voltou, não é? E agora as pessoas somem.

​O silêncio de Margaret foi a única resposta. Era um silêncio denso, cheio de cumplicidade.

​— Alaric — sussurrou Sophia. — Ele está se alimentando, não está?

​Lady Margaret virou-se completamente para Sophia. Seu rosto estava inexpressivo, mas seus olhos cinzentos eram a própria essência da dor e da resignação.

​— Ele não é humano, Sophia. Mas ele é a tragédia desta família, condenado a Ravenshore. Eu o protejo para tentar mantê-lo quieto.

​— Quieto? — O horror na voz de Sophia era palpável. — Você o alimenta?

​Margaret desviou o olhar. — Eu tento. Com o que posso. Mas... — ela hesitou, a voz quase inaudível — ...ele é forte. E o sangue de animais não o nutre o suficiente. Por isso os desaparecimentos. Por isso ele volta a caçar.

​O peso da confissão caiu sobre Sophia. Sua tia, a guardiã austera da moral, era a cúmplice de um assassino não humano, tudo por um amor rejeitado que a havia levado a uma vida de isolamento e pecado.

​Ao passarem pelo portão da cidade, uma brisa fria soprou na carruagem. Sophia olhou para trás. No topo da colina, onde a névoa começava a se adensar, uma silhueta alta se destacava contra o céu cinzento.

​Imóvel. Observando.

​Não era um fantasma. Era a criatura que bebia a vida das pessoas de Ravenshore.

​E ele sabia que agora ela conhecia seu segredo mais terrível. O jogo havia mudado.

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