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Capítulo 5 – A Noite do Jogo e a Primeira Brecha

Existem poucas certezas na vida. Uma delas é: se um homem te chama para “ver o jogo” no sofá, existe uma chance real de ele não estar interessado no placar.

Mas Caio, aparentemente, era mesmo fissurado em futebol. E naquele sábado à noite, ele invadiu a sala com dois baldes de pipoca, uma cerveja na mão e a camisa do time preferido amassada, como se tivesse acabado de tirar do cesto de roupas sujas.

— Vai assistir comigo ou vai ficar trancada no quarto fingindo que não me acha irresistível? — ele gritou, já jogando o controle da TV no sofá.

Revirei os olhos do quarto.

— Eu não finjo nada. Só ignoro sua existência mesmo.

— Tem pipoca com manteiga e pipoca doce. Só pra te lembrar que eu sou um ótimo colega de quarto.

— Ah, então tá bom. Vou só colocar uma armadura antes de sentar ao seu lado.

Mesmo com a defesa em alerta, me rendi. Porque eu precisava rir. Precisava esquecer a semana péssima, a entrevista que não deu em nada, a mensagem do ex pedindo “amizade” (que significa “posso continuar te usando emocionalmente?”).

E, apesar de tudo... Caio fazia rir.

Sentei no canto oposto do sofá, como quem delimita território. Ele esticou as pernas, espaçoso como sempre, com aquele ar de “sou dono do mundo e do controle remoto”.

O jogo começou. Os primeiros minutos passaram em silêncio, interrompidos apenas pelos comentários dele — alguns engraçados, outros completamente sem sentido.

— Se eu jogasse profissionalmente, seria goleiro. Já percebeu como eles são os únicos que podem usar as mãos? É tipo ter superpoder.

— Você gosta de se sentir especial, né?

— Não sou culpado por ser único — ele deu um sorriso torto. — Você devia experimentar.

— Eu sou única. Só prefiro não esfregar isso na cara dos outros.

Ele virou a cabeça devagar, me encarando com aquele olhar penetrante que parecia ler além das palavras.

— Você é única mesmo.

Fiquei quieta. Por um segundo, o jogo sumiu do fundo. Eu me perdi naquele olhar. Era só uma frase boba, mas dita de um jeito que me desmontou por dentro.

Mas claro, Caio não seria Caio se não estragasse o momento dois segundos depois.

— Quer dizer, única no nível “ninguém conseguiria me ignorar tanto quanto você”.

— Ah, agora sim — resmunguei, pegando um punhado de pipoca. — Voltamos à programação normal.

No segundo tempo do jogo, comecei a relaxar. Não sei se foi a cerveja. Ou o jeito como ele ria. Ou o fato de que, quando o time dele fez um gol, ele deu um grito tão alto que me assustou — e eu acabei jogando pipoca nele.

— Você vai pagar por isso, Lara.

— Vai me expulsar da sala?

— Não. Vou fazer pior.

— Tipo o quê?

Antes que eu pudesse reagir, ele enfiou a mão no balde de pipoca doce e esfregou no meu cabelo.

— CAIO! — gritei, pulando do sofá. — VOCÊ TÁ MALUCO?

— Doce combina com você — ele deu de ombros, rindo da minha cara.

Corri até ele e tentei pegar o balde, mas Caio segurou firme. A gente começou a disputar, empurrando um ao outro, rindo e resmungando. Foi quando o impulso me fez tropeçar — e caí em cima dele de novo.

De novo. Em cima dele. No sofá.

— Você tem uma obsessão por cair em mim, sabia? — ele sussurrou, a respiração quente no meu rosto.

— Talvez o universo esteja tentando me punir.

— Ou te recompensar.

Houve silêncio.

Nossos rostos estavam tão próximos que eu podia sentir o cheiro da pipoca misturado ao dele — aquele perfume amadeirado e limpo, familiar agora. O sorriso dele sumiu aos poucos, e o olhar escureceu.

Meu corpo reagiu antes do meu cérebro.

Um arrepio.

Um nó no estômago.

Aquela sensação quente, incômoda, viciante.

— Caio... — murmurei, sentindo meu peito subir e descer.

— Você me odeia tanto assim? — ele perguntou, baixo, os olhos presos nos meus.

— Não é ódio — falei, quase sem pensar. — É... outra coisa.

Ele ergueu uma sobrancelha.

— Tipo?

Eu ia responder. Juro que ia. Mas meu coração acelerou tanto que a resposta morreu na garganta.

Ele não disse mais nada. Só deslizou uma mecha do meu cabelo da testa, devagar. O toque suave fez meu corpo inteiro despertar.

E então...

Ele se afastou.

Afastou mesmo. Me empurrou de leve, pegou o balde de pipoca e voltou a olhar para a TV, como se nada tivesse acontecido.

— Acho que ainda dá tempo do time adversário empatar — disse, como se aquela quase aproximação não tivesse feito o mundo parar por um instante.

Eu voltei pro meu canto, mas não consegui assistir mais nada. Porque, pela primeira vez desde que me mudei, percebi o quanto aquele jogo era perigoso.

E o quanto Caio sabia exatamente o que estava fazendo.

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