CAPÍTULO 4

— Não sou uma pedagoga comum. — Ela manteve seu olhar. “Perdi meus pais quando criança. Sei como é quando o mundo para.”

A revelação pairou no ar entre eles. Dante não ofereceu condolências, nem a olha de pena que Sofia detestava. Apenas assimilou a informação, arquivando-a.

— Por que você quer este emprego, Sofia? — A pergunta veio mais suave agora. — Você poderia trabalhar em uma escola, um hospital. Lugares com horários normais, crianças… normais.

— Crianças que perderam pais não são anormais. São feridas. — Ela fez uma pausa. — E talvez eu queira este emprego porque entendo Léo melhor do que alguém com uma família intacta jamais poderia.

Dante se levantou, caminhando até a escrivaninha. Ele pegou uma fotografia em um porta-retratos de prata, não olhou para ela, mas seus dedos traçaram a moldura.

— Minha esposa, Clara, era psicóloga infantil. Ela trabalhava com crianças traumatizadas. — Ele se virou, a foto ainda em suas mãos. — É irônico, não? A especialista em trauma não conseguiu evitar que seu próprio filho fosse traumatizado.

Sofia viu a abertura.

— E você acha que substituí-la por outra especialista irá… corrigir isso?

Os olhos dele escureceram.

— Não estou tentando substituí-la. Estou tentando consertar o que ficou quebrado.

— Às vezes, — Sofia disse cuidadosamente, — o que está quebrado não precisa ser consertado. Precisa ser transformado em algo novo.

Ele colocou a foto de volta na escrivaninha, voltando-se completamente para ela.

— E você pode fazer essa transformação?

— Posso tentar. Mas não sozinha. Léo precisa ver que você também… se transformou.

Foi uma ousadia, ela sabia. Questionar não apenas sua capacidade como pai, mas sua própria recuperação. Ela esperava raiva, defensiva.

Em vez disso, Dante fez algo inesperado: riu. Um som baixo, sem humor, que parecia sair de um lugar muito profundo e muito escuro.

— Você é a primeira pessoa em dois anos que não me trata como um viúvo frágil ou um CEO intocável. — Ele se aproximou, parando diante da poltrona dela, sua sombra cobrindo-a. — Por quê?

Sofia olhou para cima, enfrentando sua altura, sua presença.

— Porque vi sua foto nos negócios. Dante Valente, o homem que transformou uma pequena empresa familiar em um império. Homens como você não são frágeis. E vi você com Léo no quarto. Pais como você não são intocáveis. Você é… ambos. E nenhum.

Ele ficou imóvel por tanto tempo que Sofia começou a questionar se havia ido longe demais. Então ele se afastou, indo até uma pequena mesa com uma garrafa de água e copos de cristal. Encheu dois.

— Água? — Ofereceu um copo.

Ela aceitou. Os dedos dele tocaram os dela durante a transferência, um contato breve, mas intencional. Seus olhos encontraram os dela sobre a borda dos copos.

— O emprego é seu, se quiser,—  disse ele, como se estivesse comentando sobre o clima. — Salário três vezes o que você pediu. Quarto privativo com banheiro aqui na mansão. Férias conforme a lei, mas espero flexibilidade. Léo tem pesadelos. Às vezes, acorda gritando… sem som.

Sofia colocou o copo na mesa ao lado, as mãos agora firmes.

— E quanto à sua irmã? Ela parece… protetora.

— Isadora administra a casa. Ela será sua superiora direta em questões domésticas. Mas em tudo relacionado a Léo, você responde a mim. —  ele fez uma pausa. — Diretamente a mim.

A implicação era clara: uma linha de comando dupla, potencialmente conflituosa. Sofia anuiu.

— E quanto às outras babás? As que não duraram.

— O que quer saber?

— Por que elas realmente saíram?

Dante bebeu um gole de água, seus olhos nunca deixando os dela.

— A primeira tentou dar remédios para Léo dormir. A segunda roubou jóias. A terceira… fez avanços inapropriados em minha direção. A quarta teve um colapso nervoso. A quinta, você viu hoje.

— E você acha que eu serei diferente.

— Eu sei que você será. — Ele colocou o copo. — Porque você não está aqui apenas pelo dinheiro. Você está aqui por Léo. Eu vi como você olhou para ele. Como ele respondeu. Isso… não tem preço.

Sofia sentiu um frio na base da espinha. Ele estava certo, mas pelas razões erradas. Ela estava ali por Léo, sim, mas não apenas para ajudá-lo. Para desvendar o que realmente acontecera com sua mãe. Para descobrir se seu próprio pai desaparecido estivera certo sobre esta família.

— Há uma condição, — ela disse.

Dante arqueou uma sobrancelha.

— Sim?

— Quero acesso total aos registros médicos e psicológicos de Léo. Quero falar com seus terapeutas anteriores. Quero entender completamente o que aconteceu… e o que foi tentado.

Ele considerou.

— Algumas informações são… confidenciais.

—  Então não posso ajudá-lo. Não completamente.

Os cantos da boca de Dante curvaram-se em algo que quase era um sorriso.

— Você negocia como um dos meus CEOs. Muito bem. Você terá o que precisa.

Ele estendeu a mão. Um aperto para selar o acordo.

Sofia apertou-a. A mão dele era grande, quente, a pele lisa mas com calosidades nas palmas de academia, talvez, ou de algo mais físico. Ele não soltou imediatamente.

— Há mais uma coisa, —  ele disse, sua voz mais baixa agora. — Às vezes, quando estou trabalhando até tarde, você pode me ouvir… andando pela casa. Não se assuste. São apenas as memórias. Elas são mais pesadas à noite.

Sofia retirou a mão.

— Todos temos nossos fantasmas, Sr. Valente.

— Dante. Aqui, você me chama de Dante. — Ele se virou, olhando pela janela que dava para os jardins traseiros. — E os seus fantasmas? Eles são pesados?

A pergunta pegou-a desprevenida. Ela buscou uma resposta neutra.

— Todos nós carregamos algo.

— Marco, — ele disse, tão suave que ela quase não ouviu.

Seu coração parou.

— Como você...

— A pulseira. — Ele apontou com o queixo para seu pulso. — A inscrição. ‘Sempre teu - M’. Isadora… verificou suas referências. Marco era seu noivo. Morreu há um ano. Acidente de carro, também.

A raiva subiu em Sofia, quente e instantânea.

— Você investigou minha vida pessoal?

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