A casa era linda. A reforma havia transformado o lugar num lar acolhedor, com tons suaves, almofadas macias, cheiros que não assustavam. Cecília e Samara tinham criado uma varanda com vista para o jardim e um ateliê pequeno com espaço para dança ou qualquer arte que ela quisesse retomar um dia.Mas a primeira noite foi dura.Ela não dormiu. Sentou-se no sofá e ficou olhando o vazio. As mãos sobre o colo, frias. O som do relógio marcando os segundos, o silêncio pesando nos ombros. Não conseguia falar. Não conseguia comer.Cecília, sensível, pediu ajuda.Na manhã seguinte, uma mulher elegante e serena chegou. Roupas simples, olhar gentil e uma pasta discreta nas mãos.— Sou Antonella. Psicóloga da Trindade. Não vim pra te forçar a nada. Só queria que você soubesse que... quando quiser falar, ou só estar em silêncio com alguém, eu estarei por perto.Isadora não respondeu. Mas olhou para ela com olhos marejados. Naquele dia, ficaram as duas sentadas no chão do ateliê. Antonella lendo
O tempo, aquele velho e silencioso aliado dos corações feridos, começava a trabalhar com delicadeza na alma de Isadora. Já não era mais a sombra apagada que chegou à casa de Cecília. A dor ainda estava ali, aninhada nas memórias, mas já não a sufocava como antes. Agora, havia frestas de luz.As ligações de Paolo tornaram-se parte do seu novo cotidiano. Irmão e irmã falavam todos os dias — e em cada chamada, a cumplicidade deles se reafirmava. Ele, do outro lado do mundo, continuava sendo o porto seguro que ela conhecia. E ela, mesmo ainda insegura, passava a ser a esperança viva que ele precisava manter.— Hoje almocei com a Cecília e a Samara... disse ela certa tarde, ao telefone. Do outro lado da linha, Paolo a ouvia com atenção. — A Samara se atrapalhou toda com a colher de Lorenzo, e o purê foi parar no vestido da Cecília. Você precisava ver a cara dela!Ela riu. Foi um riso pequeno, mas genuíno. E naquele momento, Paolo soube que algo precioso estava retornando à sua irmã: a leve
O estúdio era silencioso, limpo, com as paredes espelhadas e o chão de madeira clara que refletia a luz suave do final da tarde. Era o mesmo local onde Antonella marcara aulas individuais para Isadora, com uma professora de sua confiança, mas hoje a professora não viria. Hoje era só dela.Isadora entrou devagar, quase pisando em memórias. Vestia um collant preto simples, uma saia fluida de tule e a velha sapatilha rosa que Antonella resgatara do armário com ela. O cabelo preso num coque improvisado. O coração disparado como se fosse uma estreia.Ela caminhou até o centro da sala e olhou seu reflexo no espelho. Por um instante, sentiu a antiga Isadora surgir — a que dançava sem medo por amor . Mas logo a lembrança da dor atravessou como uma sombra. Ela fechou os olhos e respirou fundo, tentando reencontrar seu eixo.Levantou os braços, como quem ensaia o primeiro movimento. A música suave ecoava das caixas de som. Um piano delicado, quase sussurrado. Ela deslizou o pé pelo chão, girand
Os dias seguintes à conversa com Antonella foram silenciosos demais. Isadora evitava os encontros, mesmo com Samara e Cecília. Não estava pronta para dizer que estava se escondendo dentro de si mesma — de novo. Dormia demais, ou quase nada. Começou a recusar as refeições que antes lhe traziam conforto. Andava de um lado para o outro pela casa anexa, olhando pela janela como se esperasse algo que nunca chegava.Estava afundando, e não dizia uma só palavra sobre isso.Até que numa noite, após mais um banho longo demais, Isadora se deitou no sofá da pequena sala com uma manta fina sobre os ombros, o cabelo molhado colando no rosto. A TV estava ligada em algo aleatório. Seus olhos estavam fixos, mas sem ver.A lembrança veio como uma onda violenta.As risadas de Arturo ecoando no corredor escuro. A dor. O sangue. A vergonha.Ela se encolheu, levou as mãos ao peito tentando respirar, mas o ar não vinha. Tentou se levantar, mas as pernas falharam. Desabou no chão do pequeno tapete. E ali, s
SINOPSEFernando Colombo, 40 anos, é um dos pilares da temida Máfia da Trindade Italiana. Bem resolvido, leal e implacável nos negócios, ele vive por um código inquebrantável: proteger a sua família acima de tudo. Para Fernando, família é escolha — não apenas laço de sangue — e isso inclui seus irmãos Leonardo, o Don, e Fellipo, o Subchefe, suas cunhadas Samara e Cecília, e o jovem Lorenzo, seu sobrinho já mergulhado no mundo cruel da máfia.Acostumado à liberdade da vida de solteiro e aos relacionamentos passageiros, Fernando domina o jogo da sedução com maestria. Na cama, é um dominador nato, e as mulheres que se entregam a ele experimentam um prazer que jamais esquecem. Mas ele nunca imaginou que poderia encontrar seu porto seguro... até que o destino cruza seu caminho com o de Isadora Ortega.Isadora, 20 anos, é uma jovem espanhola de beleza estonteante e alma vibrante. Criada nos bastidores da máfia, ela sempre soube que liberdade era um luxo. Treinada para ser uma esposa troféu
{ LEMBRAÇAS DE iSADORA }A música ecoava suave pelo salão enquanto meus pés deslizavam no mármore frio. Aquela era a minha fuga — dançar, rodar, fingir que o mundo lá fora não existia. Naquele momento, eu não era a irmã de Paolo Ortega, o Dom da máfia espanhola. Eu era só Isadora. Uma garota de vinte anos com o coração acelerado e os olhos fechados, deixando o corpo seguir o ritmo e esquecendo, por poucos minutos, que eu era prisioneira de um sobrenome perigoso.— Vai acabar derrubando uma coluna dessas — ouvi a voz grossa, divertida, atrás de mim.Abri os olhos e sorri. Paolo estava encostado no batente da porta, braços cruzados e um copo de uísque na mão. Seus olhos tinham aquela mistura de dureza e doçura que só ele sabia carregar. Ele era respeitado por todos, temido por muitos. Mas, para mim, ele era só meu irmão. O homem que prometeu ao nosso pai, antes da morte, que cuidaria de mim. E ele estava cumprindo a promessa com uma devoção que e
O salão estava deslumbrante. Lustres de cristal reluziam como estrelas presas ao teto, lançando fragmentos de luz sobre vestidos caros e sorrisos cuidadosamente falsos. As taças tilintavam, os acordes suaves do quarteto de cordas preenchiam o ar, e os sussurros corriam como serpentes entre os convidados.E eu... estava linda.O vestido dourado abraçava meu corpo como uma segunda pele, reluzindo sob as luzes como se eu tivesse sido moldada pela própria noite. Cabelos presos num coque elegante, maquiagem sutil, mas marcante. A mulher no espelho não parecia comigo — ela era a versão que o mundo esperava ver. A irmã do Dom. A anfitriã. Um troféu silencioso.Mas por dentro... eu estava gelada.— Pronta, maninha ? — perguntou Paolo ao me ver descer as escadas.Seus olhos se suavizaram ao me ver. Sorriu com orgulho, mas também com um brilho melancólico que só eu conseguia notar. Ajeitou a lapela do terno, ofereceu-me o braço, e juntos caminhamos para o salão.Recebemos os convidados com a co
A festa começava a esvaziar.Convidados se despediam com sorrisos satisfeitos, brindes encerravam acordos silenciosos, e o salão, pouco a pouco, perdia seu brilho dourado para dar lugar a uma penumbra carregada de exaustão e intenções ocultas.Eu me mantive perto de Paolo o máximo possível. Fingimos sorrisos, trocamos cumprimentos, agradecemos por presenças hipócritas — o ritual de sempre. que Paolo já estava acostumado mais eu não e minha energia foi sugada.Foi quando uma das criadas se aproximou, discreta, e me entregou um pequeno envelope preto.— Para a senhorita. Disseram que era particular.Meus dedos hesitaram. O papel tinha cheiro de perfume masculino barato misturado com algo mais... azedo. A caligrafia era firme, elegante, mas havia uma violência contida em cada curva da letra.Abri com cuidado.Uma única frase. Escrita com tinta preta, como se fosse um sussurro envenenado.— Terei você.Senti o chão se mover sob meus pés. Meu coração disparou como um alarme mudo. Levante