Luna acordou antes do sol nascer. Não por vontade, mas por instinto. Um aperto no peito. Um pressentimento estranho.
Leonel ainda dormia, o braço repousando sobre sua cintura, o corpo nu coberto apenas pelo lençol de linho. Ela o observou por longos segundos. Era lindo. Forte. Seguro. E totalmente fora do seu mundo. Ela deslizou da cama sem acordá-lo, recolhendo silenciosamente as roupas espalhadas pelo chão. Precisava respirar. Pensar. Estava se envolvendo. Estava se perdendo. Na pensão, Lívia a esperava com cara de poucos amigos. — Onde você estava, Luna? — Eu… precisei sair. — De novo com aquele homem? — perguntou a adolescente, cruzando os braços. — Você mal o conhece! — E você desde quando se tornou minha mãe? — retrucou Luna, cansada demais para discutir. — Eu só não quero te ver se machucando. Luna parou. Olhou para a irmã. — Eu também não quero. Mas, Lívia… pela primeira vez em muito tempo, eu me sinto viva. Na manhã seguinte, Luna voltou ao trabalho no restaurante. Estava distraída, os pensamentos ainda mergulhados em Leonel, quando ouviu uma voz feminina atrás de si. — Então é você. Ela se virou e deu de cara com uma mulher alta, elegante, com cabelos loiros presos num coque perfeito e olhos frios como gelo. — Desculpa… nos conhecemos? — Ainda não. Mas eu conheço o Leonel. Intimamente. O coração de Luna gelou. — Quem é você? — Isabel Bragança. O sobrenome caiu como uma bomba. — Irmã dele? — Ex-noiva. Luna sentiu o chão se mover sob seus pés. — Eu não entendi… vocês...? — Estávamos prestes a nos casar. Mas então, ele se cansou. Como sempre faz. Luna engoliu seco. — O que você quer de mim? Isabel se inclinou, cruel. — Só vim avisar: ele é assim com todas. Você não é especial. É só o brinquedo da vez. E saiu, deixando Luna com o sangue fervendo e o coração despedaçado. Horas depois, Luna esperava na entrada do prédio de Leonel, os punhos cerrados. O segurança tentou impedi-la, mas Leonel apareceu no saguão, surpreso. — Luna? O que houve? Ela caminhou até ele, firme. — Ex-noiva, Leonel? É isso mesmo? Ele fechou o rosto. — Isabel te procurou? — Você mentiu pra mim! — Eu não menti. Só não te contei. — Isso é praticamente a mesma coisa! — Isabel foi uma parte do passado. Uma parte complicada. Não significa nada agora. — Ela acha diferente. Ela disse que você troca de mulher como quem troca de relógio! — E você acredita nisso? Luna hesitou. — Não sei. Mas estou com medo de ser só mais uma. Leonel a puxou pela mão, olhando dentro de seus olhos. — Você não é. Eu juro por tudo. — Então me prova. — Como? — Me deixa entrar de verdade. Na sua vida. No seu mundo. Sem máscaras. O silêncio entre eles ficou denso. Então, Leonel assentiu devagar. — Amanhã à noite. Tem um evento da família Bragança. Formal. Exclusivo. Quero que você vá comigo. — Com esse seu mundo de gente rica e cruel? — Comigo. Ela respirou fundo. Sabia que estava cruzando uma linha da qual não poderia voltar. Mas seu coração já tinha feito essa escolha antes mesmo que ela aceitasse. — Então eu vou. No dia seguinte, Leonel mandou um vestido preto de seda, com sapatos de salto e uma joia discreta, porém caríssima. Luna se olhou no espelho e mal se reconheceu. Estava linda. Elegante. Quase uma mulher que pertencia àquele mundo. Mas o coração ainda era da menina que cresceu lutando por cada centavo. Quando o carro chegou, ela entrou. Leonel a esperava no banco traseiro. E quando a viu, sorriu como se o mundo tivesse parado. — Você está… inacreditável. Ela sorriu, nervosa. — E você está me colocando no olho do furacão, sabe disso, né? — Então vamos voar no meio dele juntos. A festa era em um casarão histórico, repleto de luzes douradas, gente importante e taças de cristal. Todos os olhares se voltaram para eles assim que entraram. Alguns de surpresa. Outros de puro julgamento. Leonel a segurava pela cintura como quem dizia: “ela é minha”. Mas Luna sentia os olhares como lâminas. No meio do salão, ela viu Isabel. De longe. Sorrindo de canto. Como quem sabia que aquela história ainda estava longe de um final feliz. Mas Luna ergueu a cabeça. Ela não iria recuar. Ela ia lutar. Mesmo que isso custasse tudo.Luna sentia o peso dos olhares como se fossem pedras sobre sua pele. Estavam todos ali: empresários, herdeiros, socialites. O champanhe era caro, o riso forçado, e as palavras carregadas de veneno disfarçado em cortesia.Leonel não soltava sua cintura nem por um segundo. Talvez para protegê-la. Talvez para exibi-la. Ela não sabia o que a incomodava mais.— Relaxa — sussurrou ele, roçando os lábios em sua orelha. — Eles não te conhecem. E morrem de medo do que não podem controlar.— Eu não tenho medo deles — mentiu ela.— E isso te torna mais poderosa do que imagina.Isabel se aproximava, como uma sombra perfumada. Luna a viu sorrir antes mesmo de abrir os lábios.— Leonel... que surpresa ver você aqui com... — ela fingiu pensar — uma companhia tão... alternativa.Luna respondeu antes que ele pudesse:— “Alternativa” é a palavra que vocês ricos usam quando querem dizer “inferior”, mas têm medo de parecerem cruéis?Isabel piscou, surpresa. Leonel esboçou um sorriso satisfeito.— Eu só e
Os dias seguintes ao evento foram intensos. Leonel parecia cada vez mais envolvido. Mensagens carinhosas, convites para jantar, pequenos gestos que faziam o coração de Luna bater diferente.Mas nem tudo eram flores.Naquela tarde, Luna encontrou sua irmã, Lívia, sentada na escada da pensão, os olhos marejados.— O que houve? — Luna se ajoelhou à frente dela.— A assistente social veio de novo. Ela disse que se você continuar ausente, vão considerar me tirar daqui.O mundo de Luna tremeu.— O quê? Por que você não me contou isso antes?— Porque eu vi como você está feliz. Não queria ser um peso.Luna sentiu o chão sumir sob seus pés. Por um instante, tudo o que estava construindo com Leonel pareceu tão... distante.— Você nunca vai ser um peso. Nunca. Eu faço tudo por você, Lívia.A garota a abraçou apertado, mas o medo estava ali. Presente. Real.Naquela noite, Luna não respondeu à mensagem de Leonel.Ele ligou. Uma vez. Duas. Três.Na quarta, ela atendeu.— Aconteceu alguma coisa? —
Acordar com mensagens, ligações e notificações vibrando como enxame de abelhas no celular era, para Luna, o prenúncio de desastre. Ela ainda estava deitada, os cabelos espalhados no travesseiro, quando a primeira ligação de Marina — sua colega da cafeteria — acendeu o alarme em sua mente.— Luna... amiga... você já viu?— O quê?— Saiu uma matéria... num blog de fofoca... Meu Deus, eles cavaram seu passado todinho!O coração de Luna parou por um segundo.— Que matéria?— Jogaram seu nome, sua história com o tal empresário casado, fotos suas antigas... Tudo! E ainda te chamam de “a nova amante do herdeiro Leonel Bragança”.A respiração de Luna se tornou irregular. Ela pulou da cama, os dedos tremendo ao abrir o link que Marina lhe enviou.O título era uma punhalada:“Ela voltou! A ex-amante do escândalo agora fisga o herdeiro bilionário. Coincidência... ou repetição de padrão?”As fotos vinham em sequência. Primeiro, Luna com o homem casado. Depois, imagens recentes dela com Leonel no
O escândalo na internet ainda borbulhava como água fervente. Mas Luna tentava manter a cabeça erguida. Por ela. Por Leonel. Por Lívia.Ela estava determinada a resistir, mesmo com o coração machucado. Só que o destino... tinha planos ainda mais cruéis.Naquela manhã, enquanto tentava organizar seu dia, recebeu uma ligação do colégio da irmã. O tom da diretora era frio, burocrático.— Senhora Luna Duarte?— Sim, sou eu.— Precisamos que compareça à escola com urgência. É sobre a aluna Lívia Duarte. A assistente social está aqui conosco.Luna sentiu o mundo girar.— Aconteceu alguma coisa com a minha irmã?— Por favor, venha o quanto antes.Meia hora depois, Luna chegava ofegante à sala da direção. Lívia estava sentada em um canto, com os olhos inchados. Ao lado dela, uma mulher de terno cinza e expressão inexpressiva segurava uma pasta.— Luna Duarte? — disse a mulher.— Sim. O que está acontecendo aqui?— Meu nome é Cecília Ramos, sou da Vara da Infância e Juventude. Recebemos uma den
Os dias seguintes foram um vendaval de emoções.Luna mal dormia. A imagem de Lívia sendo levada pela assistente social a perseguia como um pesadelo recorrente. Mas, ao mesmo tempo, o que ela e Leonel estavam construindo parecia crescer, ainda que em meio à lama da exposição.Ela agora vivia com ele. Um universo de luxo, segurança... e amor. Sim, ela já não negava o que sentia. Por mais que tudo estivesse em ruínas lá fora, no olhar de Leonel havia algo firme, sólido, que fazia seu mundo parecer menos quebrado.Naquela noite, ele a levou para a cobertura de vidro no topo do prédio — um espaço reservado, com vista para a cidade iluminada, rodeado por cortinas leves e luzes suaves. A mesa estava posta com cuidado, o jantar elegante, mas discreto.— Você está tentando me fazer esquecer o inferno que minha vida virou? — ela perguntou, com um sorriso triste.— Não. Estou tentando te lembrar que você ainda pode viver o céu.Ela abaixou o olhar, tocando a taça de vinho com os dedos finos.— L
Luna estava pronta.A dor se transformara em arma. A vergonha, em escudo. E o amor que começava a florescer entre ela e Leonel... era a faísca que incendiava sua alma.Naquela manhã, ela apareceu ao vivo no programa de maior audiência do país.Vestia-se com elegância: um blazer branco marcando sua cintura, cabelos presos num coque firme, maquiagem suave, mas impactante. Havia poder no olhar dela. Postura de quem não se curva. De quem cansou de ser jogada no chão.Leonel assistia da cobertura, com os punhos fechados e o coração acelerado. Ela não queria que ele fosse com ela. Disse que precisava enfrentar sozinha. Ele respeitou.No estúdio, a apresentadora iniciou a entrevista com cautela:— Luna Duarte, você virou o centro de uma polêmica nacional. Foi chamada de interesseira, oportunista, destruidora de lares... e agora está envolvida em um processo de guarda da sua irmã. O que tem a dizer?Luna respirou fundo. Não piscava.— Eu fui julgada sem ser ouvida. Fui apedrejada por escolher
Luna apertava a bandeja contra o peito, tentando ignorar o som irritante dos saltos e risos fingidos que ecoavam no salão luxuoso do Hotel Elite. As mãos suadas denunciavam sua ansiedade, mas ela mantinha o sorriso treinado nos lábios.A festa de lançamento de uma linha de relógios exclusivos atraía a elite da cidade. Ela não pertencia àquele lugar. Sabia disso desde o momento em que colocou os pés no salão e encarou os lustres de cristal que pareciam zombar de sua simplicidade.— Dois espumantes, por favor — pediu uma mulher loira, com joias que brilhavam mais do que a própria iluminação.Luna assentiu, entregando as taças com cuidado. Fingiu não ouvir o comentário maldoso logo em seguida.— Essas garçonetes deviam ter um curso de etiqueta antes de servir a gente.Virou-se e seguiu até o balcão, mordendo a língua. Só precisava do dinheiro. Um turno, só isso. Depois voltaria para o quartinho minúsculo que alugava em Vila Oeste e cuidaria de sua irmã mais nova.Foi quando o viu.Alto.
Luna andava rápido pela calçada molhada. A chuva fina voltava a cair, mas ela não se importava. O vento frio batia em seu rosto, enquanto sua mente repetia as palavras de Leonel."Isso ainda está longe de terminar."Ela deveria ignorar. Deveria esquecer. Mas não conseguia. Havia algo no jeito dele — no olhar firme, no sorriso inclinado — que desarmava suas defesas.No pequeno quarto de pensão, Luna encontrou sua irmã, Lívia, dormindo enrolada em um cobertor fino. A visão foi um soco no peito. Ela tirou os sapatos silenciosamente, sentou-se na beira da cama e respirou fundo.Leonel Bragança não fazia parte da realidade delas. Era apenas um capricho do destino, uma distração que ela não podia se permitir.Na manhã seguinte, Leonel estava em sua sala de reuniões no 38º andar da Bragança Corporation. Mas sua mente não estava no relatório de investimentos que seu diretor financeiro apresentava.Estava nela.Luna.O nome ecoava como um feitiço. Ele era um homem prático, objetivo, controlado