O cheiro do sangue já não me causa o mesmo impacto que antes, mas ali... há algo diferente. Um misto nauseante de ferrugem úmida, cigarro barato e o leve aroma cítrico de um desinfetante fraco — tudo tão fora de lugar. Como se o próprio Da Vinci tivesse limpado parte da cena só para evidenciar o que lhe interessava. Sujo e limpo ao mesmo tempo. Uma assinatura.
Me aproximo do carro com cuidado, os faróis da viatura iluminando a lateral riscada da lataria. O vidro traseiro estilhaçado reflete minha expressão tensa, e por um instante, vejo meus próprios olhos perdidos ali.
Inclino o tronco para observar o interior. Um banco sujo de sangue, marcas secas e escorridas no encosto, como se o cenário tivesse sido feito, antes do corpo ser colocado ali. Desgraçado. Era teatral demais. Calculado. Não havia qualquer tentativa de esconder o cadáver. Ele queria que a encontrássemos.
Foi então que notei. Um envelope. Amarelado, dobrado, repousando no assento do carona, à vista de quem olhasse com