04

TARYN

— Como ousam?! — repeti, minha voz ecoando ainda mais forte.

Ronan girou nos calcanhares, os olhos se encontrando com os meus.

— O que faz aqui? — rosnou, a mão apertando a mala como se fosse uma arma.

Minha atenção, porém, não estava nele. Estava nela.

Kalinda.

Minha irmã, tão perfeita, tão bondosa aos olhos de todos. Agora, seus olhos arregalados estavam cheios de pavor. Ela parecia uma criança pega em flagrante, e ainda assim havia algo sombrio em sua expressão.

— Como pôde? — minha voz saiu trêmula, mas carregada de dor. — Como pode fazer isso com Caius? Ele não merece. Ainda há tempo, Kalinda. Volte. Volte comigo, antes que seja tarde demais.

Ela recuou um passo. Depois outro. O medo em seus olhos deu lugar a uma determinação fria que eu não conhecia.

— Não — sussurrou, e então ergueu o queixo, firme. — Eu não vou voltar. Não posso.

Aquelas palavras foram como um tapa em meu rosto. Senti meu corpo se contrair, a garganta fechar.

— O que…? — franzi a testa, tentando compreender. — Como assim não pode?

— Não suporto aquele homem! — a voz dela tremeu, mas não de arrependimento. De fúria. — Não posso viver presa a ele, sufocada naquela casa, sendo a esposa perfeita que todos querem. Eu não vou!

— Você… você está falando de Caius? — perguntei, incrédula.

Ela bufou, cruzando os braços, a delicadeza de sempre transformada em escárnio.

— Nunca amaria alguém como ele. Frio, rígido… tão perfeito e intocável que chega a ser insuportável.

Minhas pernas quase cederam. Eu não a reconhecia. Aquela não era a minha irmã, a mesma que sorria com doçura nas manhãs, que falava de Caius como se fosse um presente dos deuses.

— Mas você o ama.

— Eu o desprezo.

Minha boca se abriu, mas nenhuma palavra saiu de imediato. O coração me batia nos ouvidos, cada batida mais dolorosa que a anterior.

— Do que está falando? — forcei as palavras, a voz embargada. — Você sempre disse que o amava. Sempre se gabou para suas amigas.

Kalinda riu. Não aquela risada doce que todos conheciam, mas uma risada curta, seca, sem alegria.

— Amor? — ela repetiu, como se a palavra fosse uma piada amarga. — Eu nunca amei Caius. Nunca.

Senti o ar me abandonar, como se alguém tivesse golpeado meu peito.

— Mas… — tentei, sem conseguir terminar a frase.

Ela deu de ombros, os olhos faiscando com uma frieza que me fez estremecer.

— Eu aceitei o casamento porque ele é o alfa. Porque tem riqueza, respeito, e porque unir nosso nome ao dele foi conveniente para todos. Isso é o que importa. Status. Segurança. O resto é ilusão.

Balancei a cabeça, negando, recusando aceitar aquelas palavras.

— Kalinda… — minha voz falhou. — Você está falando de um homem que daria tudo por você. De alguém que…

— Que me sufoca com a perfeição dele? — ela me interrompeu, o tom ríspido. — Você não entende, Taryn. Nunca entendeu. Você sempre viveu na sombra, doente, frágil, intocada. Mas eu, eu sei o que quero. E não é viver ao lado de um homem frio e controlado como Caius.

As palavras dela me atingiram como uma faca cravada no meu peito, cada sílaba cortando um pouco mais fundo. Eu a olhei, e por um instante não vi minha irmã. Vi apenas uma estranha com o rosto dela.

Minha boca se abriu, mas a dor era tanta que nenhuma palavra conseguiu sair.

Kalinda desviou o olhar para Ronan, como se buscasse aprovação, e então deu um passo firme em minha direção. Antes que eu pudesse recuar, suas mãos agarraram meus ombros com força, os dedos afundando no tecido simples do meu vestido.

— Você vai entender em breve, Taryn — sussurrou, sua respiração quente contra meu rosto. — Quando se casar, aprenderá que nem tudo se trata de amor.

Engoli a saliva com dificuldade, o nó em minha garganta quase me sufocando. Segurei a mão dela, desesperada, implorando.

— Por favor… volte comigo. Caius a ama, Kalinda. Ele não suportaria essa verdade. Você ainda pode escolher não fazer isso. Ainda dá tempo.

Ela franziu a testa, e por um instante pensei que minhas palavras tivessem alcançado alguma parte dela. Mas logo em seguida, ela puxou suas mãos de volta com brusquidão, como se meu toque a contaminasse.

— Você é patética — cuspiu, erguendo o queixo. — Implorando que eu volte para um homem que você ama.

As palavras me atingiram como um soco no estômago. Recuo um passo, as sobrancelhas arqueadas, o coração em disparada.

Kalinda bufou, cruzando os braços diante do peito. Um sorriso cruel curvou seus lábios, acompanhado de uma risada baixa, zombeteira.

— Acha que eu não sabia? — continuou, os olhos cintilando com um brilho de triunfo. — Sempre percebi seus olhares, sua respiração suspensa cada vez que Caius se aproximava. É patético, Taryn. Constrangedor. Ele nunca vai reparar em você.

Meu corpo inteiro estremeceu, e por um instante não consegui respirar. As palavras dela me despiram, me deixando nua diante de um segredo que eu jamais ousara revelar em voz alta.

Kalinda me analisou dos pés à cabeça, os olhos demorando-se sobre minha figura pálida, meu vestido simples, meu capuz amarrotado. Então, como se tivesse acabado de se lembrar de algo, sua expressão mudou.

Ela sorriu de forma calculada, inclinando a cabeça de lado.

— Ou talvez… agora você tenha uma chance. — A voz dela escorreu venenosa. — Afinal, eu estou indo embora.

Meu estômago se revirou, e o gosto amargo da vergonha e da dor subiu à minha boca.

Balancei a cabeça com veemência, sentindo a revolta subir-me à garganta.

— Eu sempre respeitei o seu casamento, Kalinda. Sempre! — minha voz quebrou, mas mantive o olhar firme nela.

Ela apenas deu de ombros, indiferente, como se minhas palavras não passassem de vento.

— Eu não me importo. — Seus lábios curvaram-se em um sorriso frio. — Se quer tanto assim, pode ficar com Caius. Vai descobrir, cedo ou tarde, que ele não é nada além de uma decepção.

Ela se virou sem pressa, estendendo a mão para Ronan, que a segurou de pronto. Juntos, começaram a se afastar, como se nada do que eu dissesse tivesse valor.

Meu corpo se moveu sozinho, bloqueando a passagem deles, o coração disparado.

— Você não pode ir embora, Kalinda! — exclamei, a voz mais alta do que pretendia. — Isso é traição. E você sabe o que acontece com traidores. Você… você pode ser morta por isso. Não só você, mas nosso pai seria arruinado. Seríamos todos destruídos.

Kalinda parou, fitando-me com os olhos semicerrados. Por um instante, achei que o medo a tivesse alcançado. Mas ela apenas respirou fundo e respondeu com frieza:

— Não me importa. Eu já fiz muito por esta família. Já dei o bastante. Está na hora de viver a minha vida, e não vou me prender a eles. Nem a você.

Torci o nariz, o peito ardendo de incredulidade.

— Eu não a reconheço. — murmurei, quase sem fôlego.

Ela inclinou a cabeça, o semblante endurecido.

— Então volte para casa e esqueça o que viu, Taryn. É melhor assim.

— Não — rebati, firme, a voz embargada. — Eu não vou esquecer. E você ainda pode voltar atrás. Pense em Caius… em tudo o que ele fez por você.

Kalinda bufou, impaciente, mas antes que pudesse responder, meus olhos recaíram sobre Ronan.

— E você? — cuspi, sentindo o asco percorrer meu corpo. — Tem uma esposa, Ronan. Uma mulher que ainda está de luto pela perda do bebê de vocês. E mesmo assim… mesmo assim vem até aqui roubar a esposa do próprio primo?

Ele sorriu. Não um sorriso de vergonha, mas de escárnio.

— Ela nunca deveria ter engravidado — disse, a voz baixa e carregada de desprezo. — Foi um sacrifício fazê-la perder aquela criança.

Meus pés vacilaram para trás, a náusea subindo até a garganta. O mundo pareceu girar ao meu redor, e por um instante perdi o ar.

— Você… — minhas palavras saíram num sussurro horrorizado. — Você a envenenou?

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