Mundo ficciónIniciar sesión2017
Quando já estávamos há mais ou menos um ano juntos,
tínhamos uma boa rotina. Além de namorados, éramos bons amigos. Fazíamos quase tudo juntos e sempre dávamos um jeito de incluir um ao outro em nossas atividades. Quando começamos a namorar, a única coisa que eu entendia de futebol era que gol era quando a bola entrava na trave, agora já entendia, mais ou menos, a língua que ele falava, me esforçava. Ele sempre me levava aos jogos, e quando tinha tempo entre jogos e trabalho com o pai (desde que entrou no ensino médio o pai o incluía nas tarefas da empresa), ele ia comigo à clínica e me ajudava com os animais da ONG. Lucas até projetou um canil melhor para que pudéssemos abrigar mais animais, além de nos ajudar a conseguir lar para vários outros.Costumávamos ir a um parque andar de bicicleta, depois
nos sentávamos para tomar caldo de cana e planejar o que faríamos depois de nos formar. Tínhamos planos de casar e passar alguns meses na Europa, depois de conhecer todo o Sul do Brasil. Ele ia projetar a nossa casa, com quintal para dois cachorros grandes, um Husky e um terra nova, então precisávamos de muito espaço. ― O que você acha de chamá-los de Thor e Loki? ― perguntou Lucas. ― Alguém já te falou que você é muito fissurado por super-heróis? ― Super-heróis, não! Eles são deuses! ― Mas se não fossem os vingadores, você nunca saberia da existência deles. ― E como eles vão chamar, então? ― Humm, acho melhor o terra nova ser fêmea, assim podemos chamá-la de Nana. Ele fez uma cara e percebi que Lucas nunca havia assistido ao desenho do Peter Pan. Expliquei que no desenho havia um cachorro chamado Nana, que era a babá das crianças e que usava um chapéu branco de babado. Lucas se deu por vencido, aceitando minha proposta, mas com a condição de que ele iria escolher o nome do Husky. Estávamos em uma fase maravilhosa do nosso namoro. Ambos com 17 anos. Meu rosto até doía de tanto que eu sorria.Lucas e eu nos víamos quase todo dia. Ele sempre dava um jeito
de passar na minha casa à noite, ou na hora do almoço, na clínica. Pois, mesmo na época da escola, eu já trabalhava como secretária. Foi tudo maravilhoso, pelo menos até o final do segundo ano, quando a mãe do Lucas informou que o inscreveu em um intercâmbio para ficar, a princípio, um mês fora. ― Ela disse que é para meu futuro, que vai ser ótimo para minha carreira. ― Eu sei, mas tem que ser agora? Não vai atrapalhar o terceiro ano? Por que não depois do vestibular? Aí você faz com o curso... ― argumentei, demonstrando minha frustração. ― Porque ela quer aproveitar que tem casa de parente para eu ficar. Uma prima do meu pai mora em Chicago, então... Entendi que a mãe do Lucas queria o melhor para ele, e eu não poderia fazer muito. Aproveitamos os últimos dias que tínhamos juntos, até o dia de ir com ele para o aeroporto. ― Promete que vai me mandar e-mail todo dia e vamos nos falar sempre que possível? ― pedi, sentindo as lágrimas encherem meus olhos. ― Sim, minha gata, vou pensar em você todos os minutos. Vou encher sua caixa de mensagens e de e-mail. Teremos uma diferença de duas horas por causa do fuso horário, mas sempre que puder vamos tentar nos falar por vídeo.A mãe do Lucas iria acompanhá-lo, e eu grudaria os olhos
no calendário. Dona Olívia até me convidou para ir junto, mas meu pai não deixou. Achou melhor deixar para nossa lua de mel, mas eu sabia que ele não gostava da ideia de eu ficar em casa de gente que ele não conhecia, mesmo que fosse parente do Lucas. ― E aí, como foi a despedida? Depois que o avião alçou voo rumo aos EUA, fui para o shopping encontrar minhas amigas. Nada melhor do que batata frita com muito cheddar e bacon para curar a dor da saudade. ― O que acha, Isa? Só não foi mais dramático porque o pai dele também estava se despedindo da mãe, senão eu teria implorado para ele ficar. Já pensou se ele conhece alguma americana? E nem sei se essa tal prima do pai é nova ou tem alguma filha. Ele não me disse nada a respeito. ― É complicado. Eu tenho um tio que foi a serviço para a Bahia e voltou casado ― falou Bia, mastigando um pouco de bacon. Meu apetite, de repente, acabou completamente, e larguei a batatinha que estava na minha mão. ― Sério, Bia? Nossa amiga está com medo e arrasada e você larga uma dessa? ― repreendeu Isa, bem brava, mas eu já conhecia essa história. Enquanto elas ainda discutiam, recebi uma mensagem:“Sei que você está com medo, e provavelmente já deve
estar com as duas guarda-costas expondo seus temores, mas, por favor, fique tranquila. Só vou estudar e aperfeiçoar meu inglês, meu pai acha que é necessário para o meu futuro, já que ele quer expandir a empresa. Só vou por isso! Tenha em mente que meu futuro só vai existir se você estiver comigo. Me espera que voltarei para você. Te amo muito!”Sorri com a mensagem, sentindo as lágrimas escorrerem
pelo rosto, e vi que as duas pararam de discutir, começando a me encarar. ― Ele me mandou uma mensagem. ― Percebemos! ― responderam juntas. ― Acho que vou indo. ― Me levantei, e elas me acompanharam. Ao chegar ao meu apartamento, mamãe e Nayara estavam na sala vendo um filme antigo da TV a cabo. ― Oi, Iara, como foi no aeroporto? ― perguntou a minha mãe. Sentei-me ao seu lado, peguei Lúcia no colo, que miou na hora, se ajeitando no meu colo e começando a ronronar. ― Digno de um romance do Nicholas Sparks que pode vir a virar um filme ― respondi, querendo parecer cômica, mas sabendo que não sabia ser engraçada.― Dramático assim? ― perguntou Nayara, a sobrancelha
arqueada. Dei de ombros e olhei para o que elas estavam assistindo. Percebi que era um filme de romance. Sem clima para assistir a uma história de amor, resolvi tomar um banho. Quando se fica de olho no calendário, o tempo tende a demorar a passar. Os dias, principalmente no verão, ficam incrivelmente longos, e parece que tudo perde a graça. Comecei a ficar de olho no I*******m, e fiquei em choque quando percebi que já fazia 15 dias que o Lucas estava em Chicago. Ele foi marcado em uma foto, em uma cafeteria, acompanhado de uma moça que não tirava os olhos dele, sorrindo, com uma mão no braço dele. Fiquei sentada no meu computador, olhando para aquela foto, e foi como se o tempo tivesse parado. Senti um zumbido no ouvido e comecei a achar que tinha rompido um aneurisma. Aquilo não era possível. Olhei para o relógio. Eram 20h. Calculei as horas, e em Chicago eram 18h. Pela lógica, ele deveria estar em casa. Decidi fazer uma chamada de vídeo. ― Oi, minha gata. Que saudade de você! Estava com o rosto quente, mas respirei fundo e dei um sorriso. ― Nem fale. As férias aqui estão péssimas sem você. Fora que o Natal está se aproximando...― Eu sei, mas estou procurando um presente perfeito para
te mandar ― disse ele, rindo, mas não me contive e precisei perguntar. ― Quem é Kimberly? ― Na hora, Lucas ficou sério, mas eu emendei: ― Vi que foi a uma cafeteria com ela ontem. Por que ela tava rindo para você e segurando seu braço? ― É uma sobrinha da Ângela. Ela me pediu pra ir com ela e o David, namorado dela. ― Interessante, não tem namorado nenhum na página dela. Aliás, nem na foto aparece cara nenhum. ― Virei a câmera e mostrei para ele os prints que eu tirei. Eu estava tremendo, e meu tom de voz já estava aumentando, o rosto esquentando ainda mais. ― Você stalkeou a Kimberly? ― Isso é o que você tem pra me falar? Deveria ter dito pra ela não postar foto com você. Óbvio que eu ia saber. ― Não é isso. Só achei engraçado. Provavelmente nessa hora ele foi ao banheiro, e não sei por que ela não tem nada no perfil sobre o namorado, mas eu garanto que não estou te traindo. Juro! Ela é assim, tem que falar com as pessoas pegando nelas. Não sabia se era a distância de mais de 8 mil quilômetros, mas não senti segurança no que ele disse, e fiquei com a impressão de que ele estava escondendo algo. O Natal chegou, e junto com ele o presente de Lucas, uma linda pulseira da Tiffany, de prata, com uma flecha e um par debrincos em coração escrito love. Lindos, mas me fez sentir
saudade e medo. Lembrei da foto que vi, e volta e meia apareciam novas postagens dele com a Kimberly. Nas videochamadas que fizemos, o clima ficou estranho, como se algo estivesse faltando. E algo realmente ficou, pois Lucas deixou para me falar, no último momento, que o curso, que duraria apenas um mês, agora havia se estendido para três meses. ― Gata, não foi planejado. Foi a minha mãe, ela achou melhor... ― Tá, mas e a escola? O terceirão vai começar em dois meses no Brasil. O que adianta ter inglês fluente se não tiver o terceiro ano? Ela não quer que você termine o ensino médio? Não acredito nisso. Estou achando que logo você vai me falar que conseguiu um emprego e vai se casar com a Kimberly ― falei de cara feia, com o rosto quente e os olhos cheios de água. ― Gata, nada a ver. Você não gosta mesmo da Kimberly, né? É só pelo curso. Minha mãe também está estudando, meu pai veio também e quer estudar... ― Como você se sentiria se eu ficasse sendo marcada em fotos com algum filho da prima da minha mãe? Não pensa no meu lado quando ela marca você nas fotos? Ou como eu fico quando nossos amigos perguntam quem é a americana com quem você posta fotos, ou se ainda estamos juntos?Ultimamente nossas conversas estavam sendo mais
discussões do que qualquer outra coisa, e era difícil manter um bom diálogo.*.*.*
― Nossa vida está difícil. Não sei como vamos manter o
namoro. Não dá! Ele fica falando que não tem nada a ver esse ciúme, que me ama, e mandou essa pulseira e os brincos como prova disso. Mas eu não sinto verdade nas palavras de Lucas. Parece que ele está escondendo, mas não sei se é impressão minha ― desabafei para a Isa. Estávamos no meu quarto. Eu estava sentada no meu sofá, perto da janela, e ela no banco da escrivaninha. ― Ele diz que ela tem namorado, mas só posta foto com o Lucas. ― Eu acho que é medo junto com a saudade. Quando ele chegar, tudo vai sumir ― afirmou ela. ― Desde que a Kimberly suma dos nossos pensamentos e do I***a do Lucas. O ano letivo começou e foi complicado manter a educação e diplomacia com as perguntas e insinuações a respeito da nova amiga do Lucas.― Soube que você e o Lucas terminaram, Iara, sinto
muito. ― Débora, uma menina que ficou com ele na nona série veio me encher. ― Quem disse isso? ― perguntei. ― Ué, é a lógica. Ele vive postando fotos com uma americana ― respondeu ela, como se estivesse dizendo o óbvio. ― Pois está errada. Ela é apenas uma prima. Lucas ainda é todo meu, e mês que vem ele estará aqui. Só não veio ainda porque o pai dele também foi estudar lá ― respondi, rindo por fora, mas chorando por dentro. ― Se acredita nisso... ― Ela deu de ombros e saiu. As aulas do dia se arrastaram. Mandei uma mensagem para Lucas, contando o que ocorreu com a Débora. Ele visualizou, mas não respondeu, o que me deixou com ainda mais raiva. Perguntei quando poderíamos fazer uma chamada, e ele também não me respondeu. Lucas simplesmente sumiu. À tarde, pedi ao tio André para ajudar no canil, em vez de ficar na recepção. Contei a ele o que estava acontecendo e acabei chorando muito. ― Minha querida, ficar longe é difícil, mas tenho certeza de que ele não está nem com ela nem com ninguém. Ele te ama, vemos isso a léguas de distância. Logo ele chega ― respondeu com carinho.Passei o dia no canil e no gatil. Cuidar de animais era a
melhor forma de me consolar. O dia passou rápido, e não recebi nem mensagem e nem chamada. Chegou a noite e nada de sinal do Lucas. Ao tentar uma última vez, minhas mensagens nem chegavam. Desisti. ― Acho que ele me bloqueou ― falei para minha irmã. ― Bem capaz, Iara! Lucas é louco por você. Vai ver está tendo alguma tempestade lá que ainda não foi notificada e o sinal caiu ou ele perdeu o celular. ― O que aconteceu? ― perguntou minha mãe, preocupada. Contamos o que houve e desabei, chorei um monte, expondo meus medos. Ela acariciou meus cabelos e me deu um beijo na testa. ― Minha linda, vai ficar tudo bem. Com certeza aconteceu alguma coisa. Por isso ele não pôde falar com você. Logo ele dá um sinal. Ele te ama muito. Fique em casa amanhã e tenta colocar a cabeça no lugar. Aceitei e faltei a aula no dia seguinte, algo inédito de se acontecer. Acordei às 9h e mal havia dormido. Para piorar meu humor, Lucas visualizou todas as minhas mensagens, mas não respondeu.― Espero que ele tenha perdido o celular, Lúcia ― falei
para minha gata, que estava se banhando ao meu lado, com lambidas repetitivas. Pedi licença para ela e me levantei, escovei o cabelo e fui ao banheiro. Lá, escovei os dentes, lavei e hidratei o rosto, fui para a sala, e quando entrei no cômodo levei um susto com a surpresa. Lucas estava sentado no sofá, de calça jeans, All Star e camiseta preta de uma banda de rock. Ele havia mudado o cabelo. Agora usava um corte raspado nas laterais e repicado em cima. Estava mais lindo do que nunca. Meu coração disparou e pensei que estava tendo algum delírio. ― Surpresa? ― ele perguntou, com um sorriso de lado, e se aproximando de mim. ― Está aqui mesmo? ― Sim, eu combinei com a sua mãe ― respondeu, e me beijou. ― Mas e os seus pais, e o término do curso? ― Eles precisavam voltar, e assim fui obrigado a interromper o curso, mas meu inglês está como eles queriam. ― E a Kimberly? ― Está feliz com o David! Mesmo que você não acredite que ele existe, eu te mostro. E agora não preciso mais falar com eles; era só para eu não morrer de tédio lá.Suspirei e acreditei que meu pesadelo tinha acabado e
minha vida voltaria aos eixos.






