Capítulo 5: O dever ou o destino

Thorne Pov

“Sobrevivemos ao baile, pode respirar tranquilo agora,” Amara diz com humor na voz, inclinando-se levemente contra o sofá elegante da sala de estudos.

Suas palavras flutuam no ar como um convite à descontração, mas sinto o peso no meu peito se intensificar. É como se uma âncora estivesse amarrada à minha alma, impedindo qualquer tentativa de respirar livremente. A imagem de Auriel não me deixa em paz. Como ela está agora, trancafiada nas masmorras como uma criminosa? O pensamento me corrói.

“Não acredito que estou enfeitiçado, Amara,” confesso, e a voz que sai de mim é carregada de uma mistura de angústia e confusão.

Minha noiva afaga minhas costas de forma reconfortante, seus dedos traçando círculos lentos e metódicos na minha camisa. É um gesto familiar, quase mecânico, e deveria ser suficiente para aliviar a tensão que me consome. Mas não é. Há algo incompleto no toque, algo que já não consigo ignorar. Sempre foi assim, ou é o feitiço distorcendo tudo que sinto?

“Bem, agora faz mais sentido, não faz?” Amara comenta, sua voz é tranquila, mas traz uma pontada de ceticismo. “A sua nova obsessão por ela. Não é você, é apenas uma manipulação dos seus sentidos. Nada do que você está sentindo é real, Thorne.”

Reclino-me no sofá, permitindo que o couro macio absorva parte da minha frustração. Suas palavras são lógicas, fazem todo o sentido, mas ecoam vazias na minha mente. Dentro de mim, algo insiste em dizer que ela está errada.

“Meu pai não devia ter colocado ela nas masmorras como se ela fosse uma criminosa,” comento.

Amara cruza os braços e se ajeita no sofá ao lado, esticando as pernas com uma elegância casual. O corte perfeito do vestido que ela usa contrasta com a tensão que paira entre nós. Seus traços são simétricos, seu porte atlético sempre me impressionou, mas agora, ao lado dela, minha mente vagueia para a imagem de Auriel. Seus cabelos lilases ondulados, as bochechas rosadas que parecem sempre aquecer sob meu olhar, os olhos dourados que são ouro líquido.

“Olha o feitiço falando através de você!” Amara rebate, a seriedade em sua voz rompe minha linha de pensamentos.  “Ela é uma criminosa, Thorne. Ela exerceu magia proibida e ainda por cima em você, o príncipe.” Amara rebate séria. “Onde mais o seu pai poderia ter colocado ela? No quarto de hóspedes?”

A sugestão, ainda que sarcástica, desperta uma ideia. Meus olhos se iluminam, e Amara imediatamente percebe. Ela balança a cabeça em negação, o olhar dela uma mistura de incredulidade e advertência.

“Thorne, não se atreva a colocar aquela garota em algum dos quartos! Seu pai vai acabar te desertando,” ela diz com firmeza, a irritação colorindo sua voz.

“Sou o único filho dele, duvido que ele faça isso,” respondo, um sorriso de humor tingindo meu rosto enquanto tento aliviar a tensão da conversa.

“Único filho homem, esqueceu de mim, irmão?” A voz alegre de Elowen interrompe a conversa, e eu me viro para vê-la entrar na sala.

“Você preferiria virar um sapo do que usar a coroa. Nós dois sabemos disso,” eu rebato.

Alex, nosso irmão caçula, aparece logo atrás dela e juntos eles transformam a sala de estudos em um palco de interação calorosa, mas sempre caótica. Elowen se j**a no sofá ao lado de Amara com um sorriso travesso, enquanto Alex se acomoda na poltrona vaga.

“Nessas horas, fico feliz que sou apenas o meio-irmão de vocês dois,” Alex brinca. “Ser duque das Terras Baixas é o máximo que chegarei a governar algo e eu já acho isso estressante.”

“Convença o irmão de vocês de não ir atrás daquela enchatrix que o pai de vocês prendeu!” Amara pede com um tom de impaciência.

Noto os olhos de Elowen se iluminaram com a menção de Auriel, já Alex, ele fecha a cara.

“Definitivamente, eu quero conhecê-la!” Elowen anuncia animada. “Eu queria ter visto ontem a discussão, mas eu e o Alex tivemos que ficar no salão, apaziguando os curiosos.”

“Ela é incrível, Elo! Linda e inteligente, tão incrível e...” Começo a falar, a empolgação me escapando sem controle.

“E você com certeza está enfeitiçado por ela. Essa garota é perigosa, Thorne!” Alex interrompe, a seriedade em sua voz cortando minha alegria.

“Obrigada, cunhado! É isso que eu estou tentando dizer para ele, mas é impossível!” Amara diz.

Elowen sorri, claramente encantada pela ideia de quebrar as regras.

“Acho que ela é incrível! A gente nunca pode fazer magia proibida. Apenas a magia chata que papai nos obriga a estudar,” Elowen se queixa.

Alex cruza os braços na frente do corpo e encara nossa irmã.

“Chata? Anteontem mesmo, você conjurou um exército de coelhos para vir correndo atrás de mim, sua louca!” Alex relata e Elowen solta uma gargalhada.

“É, foi divertido. Mas papai disse que isso beirou a magia proibida e que eu não deveria fazer mais,” Elowen explica.

A conversa flui com leveza e, ao mesmo tempo com preocupação. Minha mente se divide entre querer ver Auriel e a outra metade, me convencendo de que não sou eu que quero isso e sim o feitiço.

Até que sinto novamente o meu corpo congelar, cada músculo travado como se estivesse preso em gelo eterno. Minha visão escurece rapidamente, e sou arrastado para fora da realidade, sugado para o redemoinho de uma nova visão.

De repente, vejo Auriel. Ela está no centro do reino, cercada por um caos devastador. Chamas sobem em espirais furiosas ao longe, pessoas correm em pânico, e o som abafado de gritos ecoa na minha mente como uma trilha interminável de angústia. Auriel está de pé, imóvel no meio dessa destruição, mas o brilho dourado de seus olhos, que sempre me fascinou, agora está tomado por uma tristeza imensurável. Seu rosto, geralmente radiante, está pálido, marcado por lágrimas que escorrem sem controle, misturando-se com a sujeira da destruição ao seu redor.

A visão oscila, e agora Alex está atrás dela, segurando sua mão firmemente. Há determinação em sua postura, mas o contraste entre sua força e a fragilidade de Auriel é avassalador. Na outra mão dela, uma espada goteja sangue fresco, escorrendo em um padrão quase hipnótico até atingir o chão. A visão se aproxima e consigo ouvir sua voz.

“Eu sinto muito, Thorne… eu sinto muito,” Auriel sussurra.

A cena desaparece tão abruptamente quanto veio, me jogando de volta para o presente com a força de uma onda que me lança para fora de águas agitadas. Meu corpo treme, suado e desorientado, enquanto sinto mãos segurando meus ombros.

“Thorne! Acorda! Thorne! Você está me ouvindo?” A voz de Elowen me atinge como um raio, e suas mãos me sacodem com urgência.

Abro os olhos lentamente, tentando focar no ambiente ao meu redor. A luz da sala parece mais brilhante, quase ofuscante, e minha cabeça lateja com uma dor que ameaça me derrubar novamente. Sinto o calor de algo escorrendo pelo meu rosto e percebo, apenas quando Amara me entrega um lenço, que meu nariz está sangrando.

“Você teve de novo, não teve?” Elowen pergunta, a preocupação claramente estampada em seus olhos brilhantes.

“Por quanto tempo fiquei fora?” Minha voz sai arrastada, quase inaudível, enquanto tento recuperar o fôlego.

“Uns dez minutos,” Alex responde.

“A gente precisa falar isso para os nossos pais, Thorne,” Elowen pede com ansiedade na voz. “A Clairivox é perigosa, papai sempre diz isso.”

“Tudo para o papai é perigoso. Eu estou bem,” digo, tentando tranquilizá-la, embora minha própria mente esteja longe de estar calma. “Preciso ver a Auriel.”

Me levanto antes que qualquer um deles tente me persuadir do contrário. É a segunda vez que tenho uma visão com ela, não pode ser por causa da poção do amor. A primeira foi no bar, quando eu tive a visão de estar beijando-a no baile e isso de fato aconteceu e foi uma visão simples. Visões que acontecem dentro de quarenta e duas horas são fáceis e não me causam mal algum. Agora, essa última, eu sou puxado para um futuro ainda incerto, porque não sei quando vai acontecer.

Há algo misterioso em Auriel e eu sinto isso há muito tempo, antes mesmo da poção.

“Thorne, você não pode simplesmente correr atrás dessa garota! Você é o príncipe, meu noivo…” Amara declara com seriedade. “Temos um dever com nossos reinos, com o povo.”

Coloco a mão nos ombros de Amara e olho diretamente em seus olhos alaranjados.

“Apenas quero entender algumas coisas. Talvez se todo mundo se unir, podemos acabar com esse feitiço e voltarmos ao que éramos antes,” explico com sinceridade na voz.

Ela suspira profundamente, seus dedos acariciando meu braço antes de ceder.

“Você me paga, príncipe,” ela anuncia com um sorriso que alegra o meu coração.

Os batimentos de Amara estão controlados, assim como seus feromônios, não há ciúmes ou raiva nela. Nunca houve. Mas sinto a preocupação que ela tem por mim e isso sempre me serviu como uma bússola.

“Não sei como você vai ser rei, agindo dessa maneira,” Alex comenta atrás de mim.

“Também não sei, irmãozinho,” respondo.

Nós quatro saímos da sala de estudos e vamos em direção às masmorras, onde Auriel está aprisionada. O cheiro que Auriel tem é inconfundível, é doce e, por alguma razão, familiar. Antes mesmo da poção, eu já sentia isso nela. O seu cheiro sempre foi intrigante para mim, agora ele é viciante.

Assim que chegamos à cela onde Auriel está, uma onda de fúria surge em meu peito ao ver o estado em que ela se encontra. Auriel está encolhida no fundo da cela, ainda usando o vestido de baile. Sinto o cheiro do seu choro e como seu coração está acelerado, com medo.

“Auriel… sou eu,” murmuro, minha voz suave enquanto me aproximo das barras frias da cela.

Seus olhos se levantam lentamente, encontrando os meus. No instante em que nossas visões se cruzam, sinto como se o mundo ao meu redor finalmente parasse. O peso que carregava no peito se dissolve, e meu coração b**e em um ritmo que parece natural, certo. Com ou sem feitiço, é Auriel que meu coração clama. Meu destino, de alguma maneira, está interligado com o dela.

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