[NARRADO POR BIANCA ANDRADE VASCONCELOS]
Dois anos e quatro meses.
O número parece tatuado na minha pele: 28 — as velas que apago todo dia para manter Gustavo vivo na memória e morto no calendário.
Era sexta-feira. Chuva fina, trânsito lento. Eu já tinha guardado a bolsa para ir embora quando Caio encostou na minha mesa com um sorriso de contrato fechado:
— “Hoje o pessoal da holding assinou a expansão. Vem comemorar? Bar novo na Lapa, só nós dois.”
Quis recusar. Ainda sinto o cheiro do jazigo quando o vento muda.
Mas alguma coisa em mim cansou de velar quem não volta.
Peguei o casaco. Fui.
Lâmpadas penduradas, tijolo aparente, aroma de gim com alecrim.
Caio pediu dois Negronis antes de eu sentar. Ergueu o copo:
— “Às portas que se abrem… e às que a gente decide não fechar nunca mais.”
Respondi com meio gole. O amargor foi menor que o susto de perceber que eu conseguia — finalmente — engolir sem que o nome Gustavo agarrasse a garganta.
Rodada após rodada, o gelo derreteu mais rápido q