Os meses que se seguiram ao baile da Fundação Moretti solidificaram o relacionamento de Luigi Calegari e Isabella Moretti aos olhos do público e, aparentemente, dentro das paredes da mansão. Isabella era uma presença constante, suas visitas tornaram-se rotina, seus pertences começaram a ocupar discretamente espaços nos aposentos de Luigi – um lenço de seda esquecido sobre uma poltrona, um perfume floral caro que se misturava ao amadeirado de Luigi, criando uma combinação que embrulhava o estômago de Jessica.
Jessica, por sua vez, havia construído uma muralha ao redor de seu próprio coração. A dor ainda estava lá, uma brasa latejante sob as cinzas da resignação, mas ela se concentrava ferozmente em seu trabalho, em manter a discrição e a eficiência que lhe garantiam o emprego. Observava Luigi de longe, notando as olheiras mais escuras sob seus olhos, a tensão permanente em seus ombros que nem mesmo a presença constante da "noiva perfeita" parecia aliviar. Ele continuava distante, profissional ao extremo, e cada formalidade era como um pequeno corte na pele de Jessica.
Isabella, por outro lado, parecia florescer sob os holofotes da sociedade e dentro do ambiente luxuoso da mansão. Era a personificação da elegância e do charme quando na presença de Luigi ou de outros membros da alta roda. No entanto, quando achava que não estava sendo observada, ou na presença apenas dos empregados, sua expressão frequentemente endurecia, revelando um brilho frio e calculista em seus olhos azuis. Jessica, movendo-se silenciosamente pelos cômodos, começou a notar pequenas dissonâncias.
Isabella falava frequentemente ao telefone em voz baixa e apressada, geralmente em italiano, mudando de assunto abruptamente se alguém se aproximasse. Jessica, que entendia um pouco do idioma devido a uma antiga patroa italiana, captava palavras soltas – "pressione", "contrato", "garantia", "Calegari" – que, isoladas, não significavam muito, mas juntas criavam um ruído incômodo em sua mente.
A primeira suspeita mais concreta surgiu de forma inesperada. Luigi andava visivelmente mais estressado nas últimas semanas. Jessica o ouvia em telefonemas tensos de seu escritório, discutindo investimentos, prazos e o que parecia ser um novo empreendimento conjunto com o grupo Moretti. Certa manhã, enquanto limpava o escritório antes que ele chegasse, notou uma pasta de couro com o brasão dos Moretti sobre a mesa de Luigi. Ao lado, um amontoado de papéis e o que parecia ser um contrato preliminar, com várias cláusulas destacadas e anotações apressadas feitas pela caligrafia nervosa de Luigi. Um nome de uma empresa desconhecida, "Innovare Participações", aparecia repetidamente. Ela não ousou tocar, mas a expressão preocupada que Luigi ostentava ao analisar aqueles documentos nos dias seguintes ficou gravada em sua memória.
"Será que os negócios com a família da noiva não estão indo bem?", perguntou-se, enquanto tirava o pó de uma prateleira. A preocupação, mesmo que indesejada, era genuína. Apesar de tudo, apesar da dor que ele lhe causara com sua frieza e com o relacionamento com Isabella, uma parte dela ainda se importava com o bem-estar dele.
Isabella, por sua vez, parecia alheia ou indiferente ao estresse de Luigi. Seus principais interesses pareciam girar em torno da organização de festas, da escolha de novas joias ou da reforma de uma ala da mansão que ela já considerava sua. E, sutilmente, ela começou a tornar a vida de Jessica um pouco mais difícil.
Não eram acusações diretas, mas pequenas alfinetadas, exigências caprichosas. Um dia, "esqueceu" um anel caríssimo na pia do lavabo e, quando Jessica o encontrou e devolveu, em vez de agradecer, Isabella a olhou com uma suspeita velada que fez o sangue de Jessica ferver. "Espero que nada mais suma por aqui", comentou, com um sorriso que não alcançava os olhos. Em outra ocasião, queixou-se a Dona Matilde, na presença de Jessica, que o serviço de limpeza não estava "nos padrões esperados para uma casa como esta", embora tudo estivesse impecável. Eram pequenos atos de intimidação, de demarcação de território, que deixavam Jessica se sentindo cada vez mais desconfortável e alerta na presença da noiva do patrão.
A segunda peça no quebra-cabeça da desconfiança de Jessica surgiu numa tarde em que ela regava as plantas na varanda dos fundos, uma área mais reservada da mansão. Viu Isabella conversando perto do portão de serviço com um homem que Jessica nunca tinha visto antes. Ele era mais velho, vestia-se de forma um tanto desleixada e tinha um ar furtivo que não combinava com o ambiente luxuoso da mansão Calegari. A conversa era tensa, em voz baixa, e Isabella parecia estar entregando a ele um envelope pardo. Ao perceber que Jessica poderia estar observando da varanda, mesmo que de longe, Isabella encerrou a conversa abruptamente, e o homem desapareceu rapidamente pela rua. Isabella olhou na direção de Jessica com uma expressão dura antes de se recompor e entrar na casa com um ar de normalidade forçada.
Quem era aquele homem? E o que havia naquele envelope? Jessica não tinha respostas, apenas um crescente sentimento de que algo muito estranho estava acontecendo sob a superfície polida daquele noivado.
Luigi, imerso em suas próprias preocupações, parecia cego a qualquer nuance no comportamento de Isabella ou de sua família. A pressão dos negócios, a responsabilidade de manter o império Calegari e, talvez, o desejo genuíno de fazer aquele arranjo social funcionar, o impediam de ver os sinais que começavam a piscar para Jessica. Quando estava com Isabella em público ou em jantares na mansão, ele representava seu papel com uma correção fria, mas Jessica via o cansaço em seus olhos, a maneira como ele às vezes se desligava da conversa, perdido em pensamentos distantes.
Certa noite, Jessica estava terminando seu turno quando passou pelo corredor que levava ao escritório de Luigi. A porta estava ligeiramente entreaberta. Ela ouviu a voz dele, baixa e tensa, falando ao telefone.
"...mas os relatórios iniciais da Innovare não são nada animadores, Giovanni", dizia Luigi, e Jessica presumiu que ele falava com o pai de Isabella. "O retorno sobre o investimento está muito abaixo do projetado. E essa insistência em mais aportes antes de vermos resultados concretos me deixa... desconfortável." Houve uma pausa, enquanto o outro lado falava. "Eu entendo que são seus especialistas, mas meus analistas também têm sérias ressalvas... Não, não estou questionando sua palavra, mas preciso de mais transparência nesses números..."
Ele desligou com um suspiro pesado, e Jessica o ouviu murmurar para si mesmo: "Droga, Moretti. O que você está aprontando?"
O coração de Jessica disparou. Innovare Participações. O nome da empresa no contrato que ela vira. A preocupação de Luigi era real e estava diretamente ligada aos Moretti. E ele mesmo parecia desconfiar de algo.
Ela recuou para as sombras do corredor, a cabeça não parava de pensar. As conversas secretas de Isabella, o homem suspeito, a tensão de Luigi com os negócios dos Moretti, o nome "Innovare". Eram peças soltas, mas começavam a se encaixar de uma forma perturbadora. Não era apenas ciúme o que sentia em relação a Isabella; era uma desconfiança genuína, um medo crescente de que Luigi estivesse sendo enganado, manipulado para dentro de algo perigoso.
A dor de seu coração partido ainda estava lá, mas agora uma nova ansiedade começava a tomar forma – uma ansiedade por Luigi. Pela segurança dele, pelo futuro dele. Pela primeira vez em muito tempo, seu foco começou a se desviar de sua própria miséria para a possibilidade de um perigo muito maior que rondava o homem que, apesar de tudo, ela não conseguia deixar de se importar.
Enquanto caminhava para casa naquela noite, a imagem de Luigi, preocupado e vulnerável em seu escritório, sobrepôs-se à do CEO frio e distante. A semente da dúvida havia sido plantada e começava a germinar, alimentada pela intuição e pelas observações silenciosas de Jessica. Ela ainda não sabia o porquê, nem como, mas desconfiava que Isabella Moretti e sua família não eram quem pareciam ser. E um novo propósito, ainda tímido, mas insistente, começava a surgir em meio à sua dor: manter os olhos e ouvidos bem abertos. Pelo bem de Luigi.
A suspeita, uma vez plantada, fincou raízes profundas na mente de Jessica. A imagem de Luigi, tenso e preocupado com os negócios da "Innovare Participações" e com a família Moretti, assombrava seus pensamentos. A dor de seu próprio coração ferido começou a ceder espaço para um novo tipo de angústia – o medo de que o homem que ela, apesar de tudo, ainda amava em segredo, estivesse caminhando para uma armadilha.Com uma determinação recém-descoberta, Jessica transformou sua rotina de trabalho em uma discreta operação de vigilância. Seus olhos, antes focados em evitar o patrão e sua noiva, agora estavam mais alertas do que nunca, captando detalhes que antes passariam despercebidos. A limpeza do escritório de Luigi, dos quartos de hóspedes que Isabella por vezes utilizava, ou das áreas comuns após as visitas da família Moretti, tornou-se uma oportunidade para observar, para escutar, para tentar encontrar qualquer peça que se encaixasse no quebra-cabeça perturbador que se formava em sua ca
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A noite em que Jessica ouviu a conversa incriminadora entre Isabella e Giovanni Moretti foi a mais longa de sua vida. O sono foi uma miragem distante, substituído por um turbilhão de medo, raiva e uma urgência desesperada. As palavras deles – "fase três da Vértice", "transferências", "Calegari não poderá fazer nada" – ecoavam em sua mente como um sino fúnebre. Luigi estava sendo metodicamente enganado, e ela, uma simples empregada, era a portadora solitária daquela verdade explosiva.Ao amanhecer, a exaustão se misturava com a ansiedade. Não podia ficar parada. Precisava, de alguma forma, alertar Luigi, mesmo que isso significasse arriscar tudo. Mas como? Chegar para o grande empresário Luigi Calegari e dizer "Sua noiva e o pai dela são golpistas" era impensável. Ele a esmagaria como um inseto, influenciado por Isabella, que certamente a pintaria como uma louca mentirosa e invejosa. Precisava de algo mais, uma fagulha de prova, por menor que fosse, para dar peso às suas palavras.Lembr
O som estridente do despertador rasgou o silêncio da madrugada, ainda escura e fria. Jessica tateou a mesinha de cabeceira gasta, os dedos encontrando o botão que silenciaria o aparelho barulhento. Cinco da manhã, e a batalha diária estava apenas começando. Sentou-se na cama, o corpo ainda pesado de sono, e esfregou os olhos. Um suspiro escapou de seus lábios enquanto encarava o pequeno quarto alugado, as paredes descascadas testemunhas silenciosas de seus sonhos e dificuldades.“Hoje é o dia. O primeiro dia de verdade”, pensou, um frio percorrendo sua espinha, mistura de ansiedade e uma fagulha de esperança. Esperança de um salário melhor, de poder finalmente ajudar a mãe no interior, talvez até guardar um dinheirinho para... bem, para um futuro que ela mal poderia imaginar.O emprego na mansão do Sr. Luigi Calegari havia caído como uma bênção inesperada. Uma indicação de Dona Lourdes, uma antiga patroa que sempre elogiou sua dedicação. “Ele é exigente, Jessica, muito exigente. Um h
As semanas seguintes ao primeiro e turbulento encontro com Luigi se desenrolaram numa rotina cuidadosamente orquestrada por Dona Matilde. Jessica aprendeu rapidamente os meandros daquela mansão gigantesca, que mais parecia um palácio silencioso e frio. Sua eficiência e discrição logo lhe renderam um aceno de aprovação da rígida governanta, o que, no universo daquela casa, equivalia a um grande elogio.Jessica se esforçava ao máximo para seguir o conselho principal de Dona Matilde: ser invisível. Movia-se pelos corredores como uma sombra, focada em suas tarefas, evitando cruzar o caminho do patrão. Mas Luigi era o sol em torno do qual aquele pequeno universo girava; evitar sua presença por completo era impossível.Os encontros eram breves, fortuitos, mas carregados de uma tensão que deixava Jessica com o coração aos pulos e as mãos úmidas. Um cruzar de olhares no corredor principal – ele a caminho de seu escritório, o rosto fechado em preocupações que pareciam pesar toneladas, ela
A imagem das mãos fortes de Luigi amparando sua cintura, o calor daquele toque inesperado na sala de música, tornou-se uma constante nos pensamentos de Jessica . Os dias que se seguiram foram marcados por uma hiperconsciência da presença um do outro. O ar entre eles vibrava com uma eletricidade contida, uma pergunta silenciosa que nenhum dos dois ousava fazer, muito menos responder.Jessica redobrou os seus esforços para ser a funcionária perfeita e invisível que Dona Matilde tanto prezava. Mantinha os olhos baixos quando cruzava com o patrão nos corredores, respondia às suas raras perguntas com monossílabos profissionais e focava obsessivamente na limpeza de cada canto daquela mansão fria e imponente. Mas era uma batalha perdida. Cada vez que ele entrava em um cômodo onde ela estava, o seu corpo reagia antes que a sua mente pudesse comandar: o coração acelerava, as mãos ficavam úmidas, a respiração prendia na garganta. Era desesperador. Era perigoso.Luigi, por sua vez, parecia trava
Aquele breve momento de paz compartilhada no salão, o calor do chá de camomila e a vulnerabilidade inesperada nos olhos de Luigi Calegari, tornaram-se um bálsamo para a alma de Jessica Souza. Nos dias seguintes, ela flutuou em uma nuvem de esperança frágil. Talvez, apenas talvez, houvesse uma rachadura naquela armadura de CEO implacável. Talvez ele a visse como mais do que apenas uma funcionária. Ela se pegava sorrindo discretamente enquanto lustrava a prataria, o coração um pouco mais leve, antecipando, mesmo que secretamente, outro vislumbre do homem por trás do nome.Mas a realidade do mundo Calegari era um choque térmico, e ele veio rápido e brutal.Luigi parecia ter acordado no dia seguinte lamentando profundamente qualquer lapso de controle. A porta que ele entreabriu na noite anterior foi fechada, trancada e barricada. A mudança foi tão abrupta que deixou Jessica desnorteada. Onde antes havia olhares prolongados e interações carregadas de subtexto, agora havia um muro de gelo.
A semana que antecedeu o famoso baile de caridade da Fundação Moretti envolveu a mansão Calegari numa atmosfera de tensão contida. Dona Matilde, normalmente a personificação da calma eficiente, parecia ter um nó extra de severidade em seu coque habitual. Cada superfície tinha que brilhar com um esplendor ainda maior, cada almofada devia estar perfeitamente alinhada. O nome "Moretti" era sussurrado nos cantos pelos poucos funcionários com quem Jessica tinha alguma interação, sempre acompanhado de olhares significativos na direção do escritório de Luigi.Jessica sentia a aproximação do evento como uma nuvem de tempestade pessoal. O nome "Isabella Moretti", ouvido naquela conversa na sala de visitas, ecoava em sua mente como um prenúncio de algo que ela não queria enfrentar. Tentava se concentrar em suas tarefas, polindo a mesma peça de prata repetidas vezes, mas sua imaginação desenhava o rosto da mulher que, segundo Dona Eleonora, era a "companhia perfeita" para Luigi. Linda, rica, sof