Rebeca Me enrolei nas cobertas, tentando afastar a lembrança que insistia em me atormentar, mas era impossível. O desfecho do meu relacionamento com Adrian ainda era um fantasma que me assombrava, um corte profundo que eu me recusava a fingir que não doía. Doeu, sim. Mas mais do que a dor, existia o alívio. Porque se ainda estivesse com ele, estaria vivendo uma mentira, sendo traída sem nem ao menos perceber. Foram três anos da minha vida. Três longos anos acreditando que aquele canalha era o homem perfeito para mim. Adrian não era apenas meu namorado, era uma presença constante. Ele passava mais tempo na minha casa do que na dele, dividindo meus lençóis, meu café da manhã, minha rotina. Conheci sua família, me envolvi no seu mundo e, no final, tudo não passava de uma farsa bem montada. Naquela manhã específica, o dia parecia comum. Ele me beijou antes de eu sair, como sempre fazia, com seu sorriso sedutor e palavras doces, que agora sei que não significavam nada. Peguei o ônibus p
Rebeca Comi tanto que mal podia me mover. Exagerei na quantidade de comida, mas, sinceramente, quem resiste a uma sobremesa extra? Acariciei minha barriga, sentindo-a um pouco mais arredondada do que o normal. Nada alarmante. Eu sempre tive um metabolismo rápido e, além disso, me cuido. Caminhadas matinais, abdominais e uma visita ocasional à academia quando não invento uma desculpa elaborada como "preciso dar um tempo para meus músculos recuperarem do exercício intenso que fiz no mês passado". Prioridades, né? O toque do telefone interrompe meu breve devaneio. Atendo sem pressa, mantendo a voz firme e calma. — Boa tarde, senhora — diz uma mulher do outro lado da linha. O tom educado indica que deve ser a recepcionista do hotel. — Boa tarde. — Senhora, estou ligando para pedir desculpas. Um de nossos funcionários bateu à sua porta, mas não obteve resposta. Gostaria de saber se podemos retirar o café da manhã. Logo iniciaremos o serviço de almoço e a senhora pode pedir qualquer
Rebeca Aquele tarado! Ouvir o suspiro exasperado de Camila me diverte. Sei exatamente o que a irrita: minha falta de filtros ao narrar meus encontros. Mas, honestamente, eu não poderia me importar menos. — Respira, amiga. Vou contar tudo — provoco, sentando-me na cama do hotel luxuoso, ainda sentindo a adrenalina da noite passada. — E dessa vez, tem um detalhe especial: foi com um turco. — Não acredito! — Camila reclama, já prevendo o rumo da conversa. — Pois acredite. E digo mais, foi uma noite incrível. Esse homem tem um magnetismo diferente... Sei lá, algo nele me fez perder o controle. — Ah, sério isso? — ela murmura, desanimada. — Seríssimo. E, aliás, cadê a Letícia? Me coloca no viva-voz, quero que ela ouça também. Quem sabe isso a faça parar de sonhar com aquele chefe babaca e correr atrás de um Rahmi na vida. — Mulher, para de falar do tamanho do pau do turco! — Camila resmunga, mas faz o que peço. — Ah, minhas amigas, tamanho nunca foi problema. Já peguei caras enor
Rahmi Não consigo tirá-la da cabeça. Desde aquela noite, cada pensamento meu converge para ela, como se minha mente tivesse sido sequestrada pela lembrança do seu corpo colado ao meu, dos seus lábios me provocando, do olhar misterioso que me desmontou sem esforço. Já estive com outras mulheres desde então, buscando alguma fagulha que pudesse apagar o fogo que ela acendeu em mim, mas foi inútil. Nada se compara àquela noite. E isso me irrita. Eu, Rahmi, o homem que nunca se apega, que sempre soube separar prazer de sentimento, agora estou preso em uma obsessão que não sei como conter. Nunca pensei tanto em uma mulher antes. Nunca desejei tanto alguém ao ponto de perder o controle sobre mim mesmo. Minha Pérola Negra. Só de pensar nela, meu corpo reage, e isso é um problema. Estou me metendo numa enrascada da qual não posso sair ileso. Porque, por mais que a deseje, eu não posso tê-la. Não devo. Meus pais jamais aceitariam. Não apenas por ela ser negra, mas por ser brasileira. Eles
Rebeca Meses se passaram desde que conheci Rahmi, e, por mais que tente, não consigo arrancá-lo da minha mente ou do meu corpo. É um tormento. Um homem que esteve comigo por uma única noite não deveria ter esse poder sobre mim. Mas tem. O pior de tudo? Sinto falta dele. Não apenas do prazer que me proporcionou, mas da maneira como me olhava, como se me enxergasse de um jeito que nenhum outro homem fez antes. Como se, naquele instante, eu fosse a única mulher no mundo. E talvez seja essa a verdadeira maldição: saber que, por uma noite, experimentei algo que não consigo encontrar em mais ninguém. Tentei seguir em frente. Conheci outros homens, tive outros encontros, mas todos foram decepcionantes. Parece que, depois dele, nada mais me satisfaz. Me pergunto se foi apenas o desejo momentâneo, ou se existe algo mais profundo nesse vínculo que eu me recuso a aceitar. Eu nunca fui do tipo que se apega. Sempre fui dona do meu próprio destino, livre para viver como quiser, sem dar satisf
Rebeca Camila e eu temos a mesma idade, mas só conhecemos nossa amiga caçula, Letícia, algum tempo depois. Ela estava sozinha em um bar, visivelmente triste. Convidamos ela para se juntar a nós e, aos poucos, ela nos contou um pouco sobre sua vida, inclusive sobre o chefe que havia acabado de conhecer. Não precisou dizer que estava apaixonada por ele estava estampado em cada suspiro, no brilho inquieto dos olhos e na forma como falava dele, como se fosse uma promessa feita ao destino. Desde aquele dia, nós três nos tornamos inseparáveis. Mas, ao contrário delas, eu sempre preservei minha independência. Mais tarde, aluguei um apartamento só para mim, apesar das reclamações da Camila. Ela vivia um conforto invejável em um belo apartamento na Vieira Souto, mas eu não queria uma vida que não fosse construída por mim. Ter um espaço que fosse inteiramente meu era essencial. Escolhi um lugar que amava, um bairro vibrante, onde o Bar da Laje se tornou um dos nossos refúgios preferidos.
Camila Liguei para Letícia para saber se Rebeca tinha dado alguma notícia. Desde que descobriu que Rahmi está noivo, ela sumiu. E, para piorar, agora acha que Letícia e eu escondemos essa informação dela de propósito. Mas não foi assim. Só soubemos porque Roberto comentou casualmente sobre o noivado do turco, e Rebeca estava por perto quando ouviu. Foi uma coincidência infeliz, mas ela não quis me escutar. Agora, por causa disso, minha melhor amiga não quer mais falar comigo. Diz que não sente nada por Rahmi, mas sua reação exagerada prova o contrário. Ela está completamente apaixonada por ele, mesmo que não queira admitir. O problema é que ela escolheu se apaixonar justamente por um homem que está a quilômetros de distância, pertencente a uma cultura com costumes rígidos. Sei que nem todos os turcos são preconceituosos, mas a verdade é que muitos ainda têm visões extremamente conservadoras, especialmente quando se trata de relacionamentos. Meu noivo já me contou que os pais de
Letícia A saudade aperta o peito como uma mão invisível, sufocante. Sinto falta da minha amiga, daquela que amo como se fosse uma irmã. Sei que ela está furiosa comigo e com a Camila. O motivo? Um turco maldito que conseguiu bagunçar completamente sua cabeça. Rebeca se apaixonou perdidamente por um homem que mal conhece. Mas quem sou eu para julgar? Estou presa no mesmo labirinto, sentindo um amor absurdo por alguém que, no fundo, nunca me pertenceu. Isso me destrói. O nó na garganta cresce e a vontade de chorar se torna inevitável. Sou chorona por natureza choro até com comerciais de margarina. Mas, dessa vez, não é qualquer lágrima. É dor. Frustração. Eu tinha avisado o Roberto. Ele deveria ter contado logo para Rebeca que o turco era noivo. Se ela soubesse desde o início, talvez tivesse conseguido esquecê-lo mais rápido. Diferente de mim, que estou há dois anos aprisionada nesse sentimento sem solução. Que droga! Ainda estou na empresa, diante do homem que me tira o sono.