Mundo ficciónIniciar sesiónO quarto de Luna parecia uma jaula dourada com cheiro de lavanda e talco.
Eram 3 da manhã. A tempestade lá fora havia passado, deixando apenas um silêncio opressor sobre Manhattan. Luna dormia pesadamente, abraçada ao Sr. Orelhas. Jinx, no entanto, estava acordada, sentada no chão, sentindo as paredes se fecharem ao seu redor.
A claustrofobia arranhava sua garganta. Ela estava acostumada a pular de prédios em Xangai, a correr de motos em becos de Paris. Ficar trancada num quarto rosa pastel, sem celular, sem ferramentas e vigiada por um bilionário paranoico estava testando sua sanidade.
— Preciso me mexer ou vou gritar — sussurrou para o nada.
Ela olhou para o canto superior do quarto. Uma luzinha vermelha piscava na escuridão.
Uma câmera de segurança de última geração, lente olho de peixe e sensor infravermelho.Pisc. Pisc.
Aeron estava assistindo. Homens como ele — predadores de terno — não dormiam. Eles vigiavam. Ele provavelmente estava no escritório blindado, cercado por monitores, esperando ela dar um único passo em falso para acionar aqueles malditos cães robóticos.
Ela precisava encontrar o ponto cego. Todo sistema tem um. É física básica.
Jinx levantou-se e caminhou pelo quarto, fingindo alongar as costas, mas seus olhos amendoados calculavam ângulos e refrações.
Ali. Atrás do guarda-roupa de carvalho maciço, havia uma sombra triangular projetada pela estante de livros. Um metro quadrado de escuridão onde a lente não alcançava.
Jinx deslizou para a sombra. O alívio de estar "invisível" foi quase orgástico.
Ela precisava queimar aquela adrenalina antes que explodisse. Apoiou uma mão no chão, esticou o corpo e começou a fazer flexões de um braço só.
— Um... dois... três... — O esforço físico limpava sua mente do cheiro de Aeron. — Dez... vinte...
— O que você tá fazendo?
Jinx congelou no meio do movimento. Girou a cabeça. Luna estava sentada na cama, esfregando os olhinhos inchados. A menina a observava com curiosidade genuína, iluminada apenas pela luz fraca do abajur de nuvem.
Jinx suspirou e sentou-se no chão, limpando o suor que cobria sua testa.
— Shhh. — Jinx colocou o dedo nos lábios. — É segredo. Babás ninjas precisam treinar.
Luna saiu da cama e caminhou até ela, os pezinhos descalços afundando no tapete. A menina tentou imitar o movimento de flexão e caiu de cara no chão fofo.
Jinx riu baixinho. Uma risada verdadeira, sem a falsidade da personagem "Sarah".
— Não, pequena. Assim você vai quebrar o nariz. — Ela puxou a menina para o colo. — Escuta, Luna. O mundo lá fora é chato e... perigoso.
Sem pensar, Jinx começou a ensinar sinais de sobrevivência, não joguinhos. Se ela ia ficar presa ali, o mínimo que podia fazer era garantir que a menina soubesse pedir ajuda caso os inimigos de Aeron atacassem (de novo).
— Se você precisar de ajuda e não puder falar... Se tiver alguém mau por perto... — Jinx pegou a mãozinha de Luna. Ela dobrou o polegar da menina para dentro da palma e fechou os quatro dedos sobre ele. — Você faz isso. É o sinal de "Perigo". Ninguém vai perceber, mas eu vou ver.
Luna imitou o gesto, os olhos brilhando. Para ela aquilo era um jogo secreto. Para Jinx, era um protocolo internacional de extração de reféns.
— Isso. E se você precisar que eu venha correndo... — Jinx ia ensinar o segundo sinal, mas parou.
A maçaneta girou. O clique da fechadura soou como um tiro no silêncio da madrugada, assustando Jinx e Luna.
A porta se abriu e Aeron preencheu o batente. Ele parecia ainda maior na penumbra, uma silhueta de ombros largos e tensão acumulada. Ele segurava um tablet na mão, a luz da tela iluminando seu rosto de baixo para cima, dando-lhe uma aparência demoníaca.O "ponto cego" na tela dele estava vazio e ele já sabia disso.
— O que está acontecendo aqui? — perguntou com a voz rouca de sono e suspeita.
Luna correu para trás de Jinx, agarrando a calça de pijama dela.
Aeron viu o movimento. O rosto dele endureceu, a mandíbula travando. A rejeição da filha doía visivelmente nele, uma ferida aberta que Jinx cutucava sem querer.
— Ela teve um pesadelo — Jinx mentiu rápido, colocando-se fisicamente entre o pai e a filha. — Eu estava ensinando... teatro de sombras para acalmá-la.
Aeron deu um passo para dentro do quarto, ignorando a desculpa esfarrapada. Ele olhou para as mãos de Luna, que espreitavam por trás da perna de Jinx. A menina, nervosa com a presença imponente e irritada do pai, fez o sinal que aprendeu instintivamente.
Polegar dobrado. Dedos fechados.
Aeron parou. Os olhos dele focaram na mão da filha como uma águia avistando a presa. Ele era dono de uma empresa de segurança militar. Ele conhecia códigos de socorro universais.
Ele avançou sobre Jinx, forçando-a a recuar até bater as costas na madeira fria do guarda-roupa. Ele invadiu o espaço dela, o cheiro de homem e perigo sufocando o ar. Ele apoiou uma mão ao lado da cabeça dela, encurralando-a.
— Que sinal é esse? — perguntou com o tom baixo e ameaçador, a boca a centímetros da orelha dela. — O que você está ensinando a ela, Sarah?
Jinx sentiu o coração na garganta. Ele sabia.
— É... é um coelhinho na toca — ela disparou, forçando um sorriso inocente que não chegou aos olhos. — O polegar é o coelho, os dedos a toca. É lúdico. Serve para acalmar a ansiedade.
Aeron não comprou a mentira. Ele aproximou o rosto do dela. Jinx podia ver as manchas douradas na íris dele. Podia sentir o calor que irradiava da pele dele, furioso e vivo.
— Coelhinho na toca... — ele repetiu, sarcástico. — Engraçado. Na Marinha, chamamos isso de Sinal de Violência Doméstica ou Perigo Iminente.
Jinx travou a respiração.
— Amanhã vamos ao parque — ele sussurrou, e não parecia um convite. Parecia uma sentença. — Quero ver como você lida com ela fora destas quatro paredes. E mais uma coisa, Sarah.
— Sim? — a voz dela falhou.
— Eu vejo tudo. Não existem pontos cegos na minha casa. Se eu vir mais algum "sinal secreto" ou código que eu não reconheça... você vai descobrir que invadir minha propriedade foi o menor dos seus erros.
Ele se afastou, deixando um vácuo frio onde seu corpo quente estava.
— Boa noite.
Aeron saiu e fechou a porta.
Jinx soltou o ar que nem sabia que estava prendendo. Suas pernas tremeram, fazendo-a deslizar até o chão.
— Ele sabe — sussurrou para a escuridão, puxando Luna para um abraço. — Ele sabe que sou uma fraude. Ele só está esperando eu dar o primeiro passo em falso para atacar.
[FIM DO CAPÍTULO]
.
.
.
Curiosidade da Jinx: Ela aprendeu esses sinais na prisão juvenil em Macau, quando tinha 14 anos. É uma linguagem universal entre "profissionais" do submundo e militares. O fato do Aeron reconhecer diz muito sobre o passado dele também, não acham?
Nota da autora: Estou arrepiada! O Aeron reconheceu o sinal de "Perigo Iminente" da Marinha. Esse homem não é só um CEO, ele é uma máquina de guerra. A Jinx achou que estava lidando com um rico mimado e caiu na cova dos leões. 🦁
Vocês acham que a obsessão dele em vigiar as câmeras é proteção ou controle doentio?
Deixem um 📹 se vocês também estariam paranoicas nesse quarto!Preparem-se: O passeio no parque vai sair do controle e alguém do passado da Jinx vai dar as caras. Vejo vocês lá!Ravenna V.







