Era mais uma dessas noites em que o silêncio falava mais do que qualquer frase bonita. O tipo de noite em que a cidade parece continuar viva do lado de fora, mas tudo aqui dentro se arrasta como um corpo sem alma. Heitor estava largado na cadeira da varanda como um homem à beira do colapso. Gravatinha pendurada no bolso da calça, camisa cinza meio amarrotada, cara de quem não dormia bem fazia semanas.
Servi dois copos de uísque, entreguei um a ele. Os olhos fundos, distantes. Aquela expressão de quem carrega algo entre os dentes e não sabe se cospe ou engole.
— Ana Liz viajou? — perguntei, só pra quebrar o peso no ar.
Ele assentiu devagar, sem nem olhar pra mim.
— Pro interior. Disse que precisava de ar. Eu só deixei. Nem discuti.
A voz saiu seca, sem a mínima defesa. Quase senti pena. Como se eu não soubesse de toda a sujeira dele por trás.
— Tá nessa fase, é? — comentei, como quem não quer se envolver demais. Mas a verdade é que eu sabia exatamente o que ele estava sentindo. Talvez