A casa de Autunm, diferente da maioria das casas, era tudo, menos uma casa.
Uma mansão construída em formato colonial mas com ar modernista, que possuía 4 andares, toda pintada de branco e uma enorme porta envernizada. Pelo jardim bem cuidado se estendiam decorações de Halloween, principalmente esqueletos em diversos figurinos caricatos e nas mais variadas e divertidas poses, de certo na esperança de não amedrontar tanto aqueles que por ali passavam. As incontáveis janelas da parte da frente brilhavam em cores de vermelho e o som de música alta já era ouvida antes mesmo de eu encontrar a casa.
- Nell, você veio! - Autunm gritou me dando um abraço apertado, era visível que sua animação se dava por conta do álcool. Me admirou ela me reconhecer de máscara.
- Não perderia por nada. Você está linda, Autunm! - Não era como se fosse difícil para ela ficar bonita, qualquer coisa lhe caía bem, até mesmo o sutiã roxo em formado de conchas e a saia verde que simulava uma calda de sereia de sua fantasia. Até mesmo os cabelos vermelhos estavam em uma desordem bonita.
- Obrigada! Agora vem, vamos curtir!
Autunm pegou minha mão e me levou casa a dentro, para uma pequena aglomeração de pessoas com corpos suados que reluziam ao piscar das luzes e movimentavam-se com a música animada.
Autunm dançava sem se importar se o ritmo do seu corpo acompanha bem as batidas, eu tentava minimamente não parecer estar convulcionando na pista de dança, embora estivesse com um pouco de vergonha.
Não sei por quanto tempo dançamos, mas quando nos afastamos do pessoal nossos corpos estavam úmidos pelo suor. Autunm segurou outra vez minha mão e me guiou por uma longa escadaria deq madeira com carpete que deduzi ser azul, era complicado distinguir as cores com uma luz vermelha tão forte piscando todo o tempo.
Chegamos ao segundo andar e ela me direcionou a um corredor longo, escuro, com portas que davam para pequenas salas, de algumas eu ouvia conversas animadas, risadas, de outras ouvia gemidos fervorosos e desinibidos. Era como se estivéssemos em uma grande festa de fraternidade sem nenhuma supervisão adulta. Foi quando me toquei:
- Onde estão seus pais? Achei que fossem ficar na festa. - disse por entre a música que, mesmo distante, ainda era alta.
- Eles viajaram. - ela me respondeu ainda olhando para frente, nos guiando, mas pude ver o branco de seus dentes em um sorriso travesso, daqueles que só uma criança desacompanhada dos pais esboça.
Entramos na sala que ficava no final do corredor, com a luz mais amena, deu para identificar que a sala se tratava de um pequeno escritório, com um grande armário de madeira de carvalho repleto de livros que ficava ao lado direito do cômodo, com uma ampla janela para arejar o ambiente e três longos sofás cinzas, bem posicionados de frente um para o outro com uma mesa de centro, neles encontravam-se rostos por mim conhecidos: o detestável Ethan Hunter vestido do que supus ser um pirata, com uma bandana vermelha amarrada na cabeça e uma camisa branca de mangas bufantes com os primeiros botões de acima abertos. Cindy Song, da mesma turma de álgebra que eu, vestindo um corset branco acompanhado de uma saia da mesma cor, na cabeça um arco de coelho e o rosto levemente maquiado om o desenho de um focinho rosa e bigodinhos. E April Grayson, também da turma de álgebra com um vestido preto de mangas longas e um chapéu de bruxa. Haviam outras pessoas, mas aqueles eram os rostos e os nomes mais familiares para mim.
- Vamos agitar essa festa! - gritou Autunm. Me sentei ao lado de April, num lugar vago na ponta de um dos sofás. Autunm abriu lugar entre Ethan e uma loira, que posteriormentedescobri se chamar Lydia, vestida de Cheerleader. Ela beijou o namorado e pude ver o quão desconfortável Lydia ficara com isso.
- Estamos brincando de verdade ou desafio. - me orientou April ainda com os olhos na garrafa sobre a mesinha de centro.
- Sua vez, Ethan, gira! - gritou Cindy, tão animada pelo álcool quanto Autunm. Ethan girou a garrafa que parou com a ponta na direção de April.
- Verdade ou desafio, April?
- Desafio! - a menina de cabelos castanhos e chapéu de bruxa respondeu sem hesitar.
- Eu te desafio a... - ele olhou em volta e seus olhos pararam nos meus. - beijar a Nell.
April se virou para mim, seus olhos azuis pediam silenciosamente permissão para o ato, mantive-me imóvel, como se a imobilidade fosse uma resposta. April se aproximou, levando as duas mãos ao meu rosto, o segurando com firmeza e delicadeza e colou os lábios nos meus. Involuntariamente minha mão direita foi até seu pescoço, em um gesto terno, e iniciei o beijo com lentidão, aproveitando o toque macio dos lábios dela contra os meus. A menina retribuiu mas quando se deu conta do jogo, abruptamente tomou distância, envergonhada. Eu sentia minhas bochechas esquentarem. Lydia pegou a garrafa e a girou, iniciando outra rodada.
Entre verdades e desafios, as pessoas foram saindo pouco a pouco da sala. Umas para o andar abaixo para dançar e beber, outras em busca de mais privacidade. Quando dei por mim, estávamos apenas Autunm, Ethan, Lydia e eu. Autunm veio se sentar ao meu lado, com o sorriso de quem queria me confidenciar um segredo:
- Quer experimentar?
Seus olhos de esmeralda abaixaram até uma das mãos, que segurava um pequeno frasco de vidro marrom, que continha um líquido escuro.
- O que é isso? - eu olhava o frasco tentando identificar o que era.
- Sangue de vampiro. - respondeu Ethan sentado à nossa frente.
- Vocês jovens descolados têm péssimos nomes para drogas. - falei com uma das sobrancelhas erguida, um pouco enojada.
- Esse é o nome porque é mesmo sangue de vampiro, Nell. - Autunm parecia genuinamente sincera, mas o que seria verdade vindo de uma pessoa que estava bebendo vodka a maior parte da noite?
- Ok, e o que isso faz?
- É como uma bala, vai te deixar numa onda surreal!
- Eu quero. - disse Lydia, entrando na conversa pela primeira vez, sua postura era de como se estivesse tentando provar algo a alguém.
Autunm dera de ombros, girou o conta gotas do frasco e depositou três gotas do conteúdo na língua de Lyndia, que prontamente engoliu. Autunm repetiu k processo consigo e com Ethan e todos ficaram me olhando, esperando que eu os seguisse. "Droga",, era esse o tipo de problema que eu deveria evitar e ligar para Andrew, mas sabia que na semana seguinte seria motivo de chatoca por tida a escola.
- Tá bom. - revirei os olhos.
Autunm, animada, quicou no sofá ao meu lado, reabriu o frasco e pegou o líquido nele, esguichando três gotas na minha língua. Tinha gosto de ferrugem, como o sangue mesmo, mas puxando um pouco para algo adocicado que não fui capaz de distinguir. Autunm se levou do meu lado e sentou no colo de Ethan, com uma perna para cada lado do seu corpo, e o beijou fervorosamente. Ele retribuía, erguendo a saia verde de sua fantasia de sereia. Lydia os olhava com desejo, como se quisesse participar. Ethan se afastou o suficiente para trazê-la para perto de si e dar início a um beijo triplo. Engoli em seco. Não era como se eu fosse virgem, mas definitivamente não queria participar daquilo. Me levantei despercebida e saí do quarto.