Girassóis

― E agora? O que eu vou fazer? Como vamos pagar as dívidas? Vamos perder a casa... vamos ficar na rua!

― Você nos colocou nessa, Joseph, quando se enfiou no vício do jogo, arriscando o futuro dos nossos filhos! Já não temos mais nada. Você perdeu quase tudo o que tínhamos. Levou nossa família à ruína!

― Como ousa falar assim comigo, Norma?

― Ouso da mesma forma que você ousou jogar e perder todo o nosso patrimônio! Nossas terras, nosso apartamento... tudo o que lutamos tanto para conquistar! Anos de trabalho jogados fora por causa de algumas noites suas no vício!

― Chega!!! Não quero mais ouvir seus sermões. Tenho que pensar em algo... ― ele passa a mão pelos cabelos, inquieto. ― Já sei. É isso! A única forma de nos livrarmos dessas dívidas é apressando o casamento da Lyz.

― Como é? Eu ouvi bem? Pai, o senhor acha que eu sou uma moeda de troca?!

― Não, minha querida, não é isso...

― Pois foi exatamente o que eu entendi.

― Você não é isso, minha filha. Você é o meu anjo. Mas todos devemos concordar que seu casamento com Oliver será vantajoso para nós.

― Mãe, você está ouvindo o mesmo que eu?

― Sim, querida. Estou ouvindo... e sinto muito que você tenha de escutar esse absurdo do seu pai.

― Ah, Norma, não seja hipócrita. Todos nós sabemos que esse casamento será vantajoso sim. O Oliver é rico, poderoso e apaixonado. Fará tudo o que ela pedir. Lyz, como esposa, pode usar isso a nosso favor — ajudar os pais, a família.

― Meu Deus... como o senhor pode falar isso de mim, pai? Eu estou sem palavras. Nunca pensei que ouviria algo assim do senhor. Preciso sair daqui... eu estou sem condições. Suas palavras me causam náuseas.

― Lyz, espere, minha filha!

― Eu vou ficar bem, mãe. Só preciso caminhar um pouco... respirar. Preciso ficar sozinha.

....

Elizabeth

Preciso caminhar e arejar minhas ideias. Doeu ouvir meu pai falar daquela forma. Ele sempre foi um homem duro, firme, mas eu nunca imaginei que tivesse intenções de praticamente vender a própria filha. É horrível pensar nisso. Pensar que meu pai seria capaz de fazer algo assim por dinheiro... Não o reconheço mais. Talvez seja o desespero das dívidas, mas nada justifica. Nada.

...

Lyz subiu em sua bicicleta, amarrou o cabelo com um pequeno laço de cetim e seguiu seu caminho. Andar de bicicleta a acalmava, fazia com que ela refletisse. Sentir o vento refrescar seu rosto suado lhe trazia uma sensação de liberdade e paz, como se nada mais ao redor importasse.

Enquanto pedalava pelas ruas de Ametyville, percebia alguns olhares curiosos a seguindo. Afinal, era uma cidade pequena; difícil alguém não saber o que acontecia com os Wilhans, uma família outrora influente e poderosa. Todos ali se conheciam desde sempre, e os comentários eram inevitáveis. Mas Lyz nunca se importou e não seria agora que iria se importar.

Pedalou sem olhar para os lados, sem ouvir ou pensar em nada, apenas seguiu sem rumo até chegar ao limite da cidade. Um rio enorme dividia Ametyville da cidade vizinha, cortado por uma longa ponte de ferro com uns quinze metros de comprimento, que ajudava os moradores na travessia.

O sol ardia sobre sua cabeça, mas um vento leve refrescava seu rosto. À esquerda da estrada, antes do limite da cidade, havia uma grande plantação de girassóis, suas flores preferidas.

Ela parou admirada diante daquele campo dourado, deixou a bicicleta encostada na estrada e entrou entre as flores. No meio da plantação, notou um espaço onde haviam cortado alguns girassóis recentemente. Sentou-se no chão, entre capins e flores secas, e apanhou um punhado de sementes espalhadas ali. Sorriu, encantada. Ficou por alguns instantes observando o céu azul e silencioso.

Algum tempo depois, ouviu passos se aproximando. Em um pulo, ficou de pé.

Levou a mão ao peito, seu coração disparava. Sentiu o rosto aquecer e o sangue pulsar forte nas veias. O vento soprou e fez seus cabelos esvoaçarem, lançando para longe a pequena fita vermelha de cetim que os prendia.

Então, uma silhueta masculina surgiu entre os girassóis, vindo na mesma direção por onde ela entrara.

― Mocinha, você está em uma propriedade particular. Sabia disso?

Ela hesitou, sem saber o que responder. Estava extasiada... e assustada. Suas pernas pareciam petrificadas. Se precisasse correr ou gritar, não conseguiria.

― O gato comeu sua língua? ― o homem perguntou, sério.

― Senhor, eu... eu... ― sua voz saiu trêmula, quase num sussurro. ― Me desculpe, eu não queria invadir...

O olhar dele era frio, mas, ao mesmo tempo, havia algo de sedutor. Ele se aproximou lentamente, segurando um bastão.

Lyz fechou os olhos, assustada.

― Deveria olhar onde se senta da próxima vez, moça. Sorte sua eu estar por perto... ou você já era ― disse ele, mostrando uma víbora que se contorcia perto de onde ela estivera sentada.

O coração dela quase saltou pela boca.

― Obrigada! Se o senhor não estivesse aqui, eu não sei o que poderia ter acontecido. ― Ela o agradeceu, ainda ofegante.

Os dois estavam tão próximos que Lyz pôde ver, com nitidez, os olhos dele, negros e acinzentados ...fixos nos seus. Um arrepio percorreu sua espinha. O perfume intenso e marcante dele a envolveu, deixando-a quase hipnotizada.

― Me chame de Eduardo. Não sou tão velho assim ― disse ele, levemente irritado.

― Como quiser, senhor... digo, Eduardo ― ela corrigiu-se, envergonhada. ― A propósito, parabéns pela vitória no festival.

― Obrigado. Me empenhei muito para isso ― respondeu, com um leve sorriso.

Havia algo misterioso em seu olhar. Sua voz firme e grave a deixava abalada, e ela se repreendeu em pensamento:

"Acorda, Elizabeth!"

― Então, eu já vou indo... me desculpe novamente por invadir sua propriedade.

Ele apenas assentiu, em silêncio.

Quando ela deu um passo para sair, tropeçou numa palha seca, a tira de sua sandália havia se enroscado. Eduardo a amparou rapidamente. Suas mãos fortes e firmes seguraram seus braços, e Lyz estremeceu ao sentir o toque.

Por alguns segundos, o mundo pareceu parar. Seus olhares se cruzaram, e ela conseguiu ver, por um breve instante, doçura naqueles olhos antes tão frios.

― Elizabeth!!!

O clima foi quebrado pela voz furiosa de Oliver, que se aproximava aos berros.

― O que está acontecendo aqui?!

― Oliver! ― ela exclamou, assustada.

Eduardo soltou o braço dela de imediato, o semblante voltando a se fechar.

― Oliver, esse senhor... digo, esse é o Eduardo. Ele salvou minha vida agora há pouco ― Lyz tentou explicar, mas o noivo a olhava com fúria e desconfiança. ― Eu estava pedalando, cheguei aqui por engano... havia uma cobra e ele a matou. Eu já estava indo embora, juro.

Eduardo observava tudo em silêncio.

― Você invadiu essa propriedade, Lyz? ― Oliver perguntou, seco.

― Sim, mas já pedi desculpas a ele ― respondeu, nervosa.

― Meu nome é Oliver, noivo dela ― frisou, estendendo a mão a Eduardo.

O homem demorou alguns segundos, mas enfim correspondeu ao aperto.

― Eduardo Gonçalez.

― Agradeço e peço desculpas pelo inconveniente que minha noiva causou ― disse Oliver.

― Tudo bem. Mas peço que saiam da minha propriedade ― respondeu Eduardo, firme.

― Sim, claro. Já estamos indo. E obrigado novamente.

Oliver segurou a mão de Lyz e praticamente a arrastou para fora dali.

Ela, porém, não resistiu e olhou para trás uma última vez. Eduardo ainda estava ali, observando-os ir embora com um olhar penetrante, um olhar que parecia a devorar.

Ele fez um leve aceno com a cabeça, virou-se e seguiu seu caminho.

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