Capítulo 5

Eu estava caminhando, logo depois de receber alta, presa em pensamentos, planejando como faria para conseguir me divorciar de João.

Ronaldo havia me dado seu cartão com o número pessoal. Estava guardado no meu bolso. Bem... no bolso da calça que peguei emprestada da Anna.

Depois que saí do hospital, fui direto para sua casa. Ele me emprestou um celular e me levou até o banco, onde acessei minha conta e transferi todo o dinheiro que havia ali para uma nova conta — uma que João não poderia tocar. Pelo menos isso eu fiz de útil na vida.

Durante a caminhada rumo a lugar nenhum, recebi um e-mail familiar. Sempre que um projeto meu é aceito, eles confirmam por e-mail, com a quantidade de peças e a assinatura do designer principal.

Meus olhos quase faiscaram quando li o nome de Gabriella como designer principal da coleção que eu mesma desenhei. Cada peça. Pessoalmente.

Olhei atordoada para todos os lados, procurando por um...

– Táxi!

Mal esperei o carro parar e já me joguei para dentro. Passei o endereço da empresa e segui até lá.

Isso só pode ser brincadeira.

Como se não bastasse tudo o que João me fez, agora isso.

Também tirou meus projetos.

Tirou o que eu mais amo fazer na vida.

Paguei o taxista e desci. Olhei para cima: o prédio grande e imponente. A empresa que meus pais deram duro para construir.

Não é hora de abaixar a cabeça.

Entrei no saguão, onde todos pareciam muito ocupados com suas vidas para notar a mulher que acabara de sair do hospital entrando de cabeça erguida, mesmo com o coração em frangalhos.

– Com licença – falei à recepcionista, que me olhou com um sorriso automático, até reconhecer meu rosto.

O sorriso dela se desfez.

– Senhora... Margarida?

– Ainda carrego esse nome, infelizmente. – falei seca. – Quero falar com João. Agora.

Ela gaguejou.

– É que... estão em reunião, Gabriella está com ele...

– Ótimo, então vou interromper. – respondi, passando por ela antes que pudesse protestar.

Eu sabia o caminho. Ainda conhecia cada andar daquele prédio de olhos fechados. Afinal, por anos, aquela empresa foi minha casa. A herança dos meus pais. O que restou deles.

Quando a porta da sala de criação surgiu diante de mim, respirei fundo, o sangue ainda fervendo. Girei a maçaneta e entrei.

Gabriella estava sentada à cabeceira da mesa, esparramada numa pose artificialmente elegante, rindo com dois executivos que pareciam encantados com cada palavra dela. Quando me viu, a expressão congelou. João também. Ele pediu para que os dois homens nos dessem licença.

Os dois passaram por mim com certa relutância, confusos. Mas fecharam a porta.

Eu encarei os dois.

– Que ousadia... – ela murmurou.

– Não. Isso se chama justiça. – respondi, jogando sobre a mesa o celular emprestado, com o e-mail ainda aberto. – Reconhece isso, não é? É a coleção que eu mesma desenhei. Cada rascunho, cada prova, cada escolha de tecido.

João se aproximou.

– Você tem provas de que foi você que criou? Quem vai acreditar em você?

As vezes, como agora, realmente achou que fui muito burra. Não é possível que João esteja me perguntando uma coisa assim, quando tenho tudo salvo em minha contra de email. Mas, eu não diria isso ali.

– Você abandonou tudo, Margarida. Sumiu. O mundo da moda não espera ninguém. – debochou.

– Eu estava hospitalizada! – esbravejei. – E ainda assim, vocês acharam que podiam roubar meu trabalho? Me apagar das criações como se eu fosse... descartável?

– Eu assinei. – ela rebateu, fria. – Está feito. Os direitos são da empresa. Você não tem mais nada aqui.

– A empresa foi fundada pelos meus pais. – Afirmei. Então, olhei para João e disse: –Você acha mesmo que eu não guardei provas de tudo? Aliás, você sabe desenhar pelo menos um boneco de palito, sua imbecil? Como vai sustentar suas falsas criações? – debochei.

– Você não sabe de nada – apontou o dedo para mim, sua postura mudando. – Está com ciúme porque João me preferiu.

A risada que saiu de mim foi alta o bastante para deixá-los confusos.

– Você e ele se merecem. Um, é um usurpador que não conseguiu nada sozinho, a outra, um carrapato que vive grudada ao usurpador. Mas quer saber de uma coisa? Eu sei tudo sobre essa empresa e cada ramo dela, cada criação minha, acha que não tenho como derrubar essa sua assinatura? E você, João, tem certeza que tem o controle de tudo? Só existe uma herdeira para tudo que meus pais deixaram.

O silêncio que seguiu foi denso como concreto.

– Isso é uma ameaça? – Gabriella se levantou.

– Não. – sorri. – Isso é uma promessa. Você não vai apagar minha existência como ele tentou apagar meu filho. Como vocês tentaram apagar minha história.

Peguei o celular da mesa e caminhei até a porta. Antes de sair, me virei.

– E se preparem. Porque se vocês acham que fui embora sem lutar, é porque nunca me conheceram de verdade.

Saí de cabeça erguida, mesmo com o coração disparado. Eu tremia, mas não de medo. Era a fúria de quem cansou de ser colocada de lado.

Do lado de fora, meus pensamentos começaram a clarear.

Eu sabia que seria difícil me vingar e derrubar João e Gabriella sozinha. Muito difícil.

Foi então que a proposta de Ronaldo voltou à minha mente.

Mas... será que ele estava falando sério?

Eu não queria ser uma marionete em suas mãos — pelo contrário, queria lutar ao lado dele, de igual para igual.

Queria manter minha autonomia, minha voz.

Várias dúvidas passaram pela minha cabeça, misturadas com um desejo crescente de aceitar.

Estava tentador demais.

Olhei uma última vez para o prédio que foi minha casa por tantos anos e, em voz baixa, fiz uma promessa:

— Eu vou recuperar tudo o que vocês construíram, mamãe e papai. Eu prometo.

Então me virei e fui embora dali, voltando para a casa de Anna — onde, com calma, pensaria em tudo e traçaria o melhor plano.

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP
Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP