Heitor nunca gostou de manhãs. Havia nelas uma espécie de crueldade — a luz invadia tudo, sem pedir licença, revelando o que ele preferia manter escondido: a poeira nas frestas, o vazio sobre a mesa do café, o eco das vozes que já não estavam ali.
A casa era grande demais para ele e Heloisa. E ainda assim, ele não conseguia imaginar-se em outro lugar. O barulho distante dos carros, o portão eletrônico abrindo às seis e meia, o som do liquidificador vindo da cozinha — tudo isso formava uma rotina que o sustentava. A previsibilidade era o único tipo de paz que ainda sabia aceitar.
Mas naquela manhã, havia algo diferente no ar.
Ele percebeu primeiro pelo som dos passos da governanta no corredor — apressados, inseguros. Depois, pelo silêncio repentino que tomou a casa, como se as paredes também estivessem à espera.
Quando ouviu o portão eletrônico se abrir, sentiu o estômago se contrair.
Helena.
Sabia que era ela antes mesmo de vê-la.
A irmã tinha o dom de transformar qualquer ambiente em