Maya Volpyn
Eu tinha doze anos quando abri os olhos pela primeira vez.
Literalmente.
Desde o dia em que nasci, estive em coma. Mas não era um coma qualquer. Eu vim ao mundo com uma adaga cravada no peito — uma lâmina mágica atravessando meu coração, protegida apenas pela minha caixa torácica. Ninguém jamais conseguiu explicar como isso foi possível. E muito menos como remover a adaga sem me matar no processo.
Não tenho lembranças. Nenhuma infância. Nenhum som, cheiro ou rosto familiar. Só o vazio.
Meus pais passaram anos buscando desesperadamente alguém com magia suficiente para salvá-la. Tentaram de tudo. Magos, curandeiros, rituais. Mas a resposta era sempre a mesma: retirar a adaga significaria assinar minha sentença de morte.
Ninguém entendeu como, um dia, simplesmente acordei.
O que lembro é uma voz. A voz de um garoto. Familiar, mesmo que eu não tivesse memórias para compará-la. Logo depois, senti uma luz azul vibrar no centro do meu peito. E então… meus olhos se abriram.
Tentei me levantar, mas mal conseguia sustentar meu próprio corpo. Era como se cada osso estivesse quebrado. Cambaleei, sufocada pela dor, e caí de joelhos. Então vieram os gritos — de medo, de alegria, de espanto.
Meus pais entraram correndo no quarto, seguidos por uma garota da minha idade. Fui envolvida por braços quentes e desesperados, mas o que deveria ser um gesto de amor virou tormento. A adaga reagiu. Uma dor insuportável rasgou meu peito.
Naquele instante, entendi: eu não podia ser tocada. Qualquer contato físico ativava a lâmina mágica dentro de mim. Para continuar viva, eu teria que viver isolada… sem abraços. Sem carinho.
— Por favor, só uma vez… — implorou minha mãe, os olhos cheios de lágrimas.
A culpa me consumiu. Eu a evitava, presa entre o medo e a apatia. Mas a dor no olhar dela era maior que a minha covardia. Então, pela primeira vez, me permiti.
Ela me abraçou. Forte, chorando. E por alguns segundos, senti algo… bom. Quente. Familiar. Mas a sensação durou pouco. Uma exaustão brutal caiu sobre mim como um feitiço. Desmaiei nos braços dela.
Quando acordei… uma semana havia passado.
Os anos em coma deixaram suas marcas. Meu corpo era frágil, subdesenvolvido. Minha mente, lenta e confusa. Aprender a andar, falar e comer se tornou um novo desafio. Eu era como um bebê, mas com consciência demais da própria vulnerabilidade.
Tentei forçar lembranças do passado. Uma, em especial, me doeu: aos cinco anos, meus pais quase desistiram. Os médicos sugeriram desligar os aparelhos. Mas, por algum milagre cruel, continuei viva. A partir dali, fui mantida com o mínimo de esforço — alimentada por sondas, observada de longe, como um espectro adormecido.
Agora, aos doze, começava a engatinhar de novo… sozinha. A vergonha me corroía. Tudo que eu deveria ter aprendido na infância, precisava dominar agora. Tarde demais. Rápido demais.
Minha família não era comum. Vivíamos numa cidade moderna, cercados por pessoas normais — mas nada em nós era normal. Meus pais tinham ligações com magos ancestrais, lobos descendentes de deuses, e outras criaturas que o mundo preferia ignorar.
Eu mesma pertencia a uma espécie rara, escondida entre os humanos. Invisível. Intocável, mas só era isso, sem nada especial, só essa condição miserável me torturando, sem poderes, sem capacidade de me defender, eu sou uma tragédia.
A família Volpyn, a minha família era a segunda mais poderosa no mundo místico, atrás apenas do clã de Kan, o alfa supremo. O guardião da ordem, o equilíbrio entre humanos e seres mágicos por ser um homem da descendência de deuses.
Eu não sei muito sobre as confusões politicas, mas sei que o tal ancião Kan, esta esperando algum tipo de profecia sobre seu herdeiro, que ele viria seu nascimento seria abençoado da lua e das estrelas.
A profecia? Para mim, era apenas um sussurro distante, um eco de um destino que nunca senti como meu. Enquanto o mundo falava de herdeiros e tronos, eu era só uma garota aprisionada em um corpo frágil, amaldiçoada desde o nascimento, encarando todos os dias como uma batalha silenciosa.
Minha vida se resumia a livros, sessões intermináveis de fisioterapia e à solidão de uma cadeira de rodas. Meus músculos, rígidos como pedra, lutavam contra cada movimento, e a dor... era constante. Um lembrete insuportável de que eu jamais teria uma vida comum.
Enquanto isso, meu pai, o chefe da família Volpyn, sonhava alto. Acreditava que uma aliança com o clã Kan poderia transformar nosso nome em lenda. Mas mesmo com toda nossa influência, os Kan não pareciam dispostos a aceitar o acordo em que ele se uniria a minha irmã gêmea Lana assim que ela alcançasse a maioridade. Havia tensão entre os clãs, um rancor velado. Diziam que era porque minha família abrigava magos e feiticeiros renegados, algo que os Kan consideravam uma afronta. Eu não sabia exatamente o que se passava nos bastidores... mas podia sentir o peso disso tudo nas paredes da nossa casa.
Os dias passavam arrastados. Cada um igual ao anterior. Eu, em minha cadeira, perdida entre palavras e teorias mágicas, tentando preencher o vazio com conhecimento. Professores, terapeutas e instrutores iam e vinham, mas o toque humano era um luxo que eu não podia ter. Qualquer contato físico era perigoso demais. Me ensinaram a sobreviver sozinha.
Lembro-me dos sussurros do passado, dos choros abafados que escapavam do quarto dos meus pais, das preces sussurradas no escuro. Eles não choravam por falta de amor. Choravam por impotência. Por me ver definhar, dia após dia, em silêncio.
Talvez, no fundo, os abraços que tentavam me consolar tenham atrasado meu despertar. Talvez o amor deles tenha me mantido adormecida por mais tempo do que deveria.
Depois de seis meses lutando contra meu próprio corpo, finalmente consegui colocar os pés no chão. A sensação foi estranha, como se o mundo estivesse em câmera lenta. Como se eu estivesse pisando nele pela primeira vez.
Lana, parecia sempre cheia de luz. Corria ao meu redor, como se a dor não fizesse parte do vocabulário dela. Um dia, ela me convidou para um passeio no jardim da mansão, um lugar que mais parecia ter saído de um sonho. Árvores antigas sussurravam segredos com o vento, um rio cristalino serpenteava o terreno, e uma ponte de pedra levava a um mirante com vista para o lago.
Ela me levou até lá, os olhos inquietos presos ao reflexo da água. Ao me aproximar, vi o quanto éramos parecidas. Duas gotas do mesmo mar. Mas algo em seu olhar me dizia que havia uma rachadura nessa simetria.
— Você tem recebido bastante atenção, não é? — disse de repente, me encarando com uma mistura estranha de inveja e mágoa.
Não respondi. As palavras não vinham com facilidade. Ainda era refém de uma língua que insistia em me trair.
— Sempre foi assim — ela continuou. — Mamãe dormia no seu quarto. Fazia tudo por você. E agora, mesmo acordada, você ainda é o centro do mundo. Até sua educação é melhor que a minha. Por que você não morreu, Maya? Já não teve atenção o suficiente?
As palavras dela me atingiram como facas afiadas. A dor foi imediata. Meus olhos arderam, traindo a emoção que eu tanto tentava esconder.
Ela não se importou. Ao contrário. Sorriu. Um sorriso cruel, satisfeito.
— Hoje, nossos pais vão receber visitas importantes. E, sinceramente? Eu preferia que você não aparecesse. Já basta ser uma vergonha ambulante. Uma menina boba, lerda, que mal consegue comer sozinha... Você não vê como é patética?
— P-posso... posso ficar no quarto — murmurei, a voz fraca, mal saindo dos lábios, eu nunca pensei que minha irmã se rebelaria de forma repentina contra mim, como se eu fosse uma ameaça.
Ela começou a se afastar pela ponte, mas parou.
— Não, Maya — disse, com um olhar frio e debochado. — Você pode ficar no lago, a mão dela bateu com força em meu peito me empurrando, e eu não consegui me segurar a não ser aceitar a gravidade me levando para baixo, direto para a agua.
Cap. 2 Lançada para a morte;Tudo aconteceu rápido demais.Confusa, encarei Lana se aproximar com um olhar estranho. Antes que eu pudesse reagir, senti suas mãos me empurrando com força, direto para a água gelada do lago.O impacto foi brutal. O frio cortou minha pele como lâminas invisíveis e meus pulmões arderam, implorando por ar. Afundava cada vez mais, como se o lago quisesse me engolir inteira.Lá em cima, entre as ondas, vi o rosto dela — sereno, cruel. Eu a implorei com o olhar, mas Lana apenas virou as costas, desaparecendo como se fugisse de algo... ou de alguém.Nunca aprendi a nadar. Meu corpo lutava por instinto, mas era inútil. A dor me puxava para o fundo, até que... tudo mudou.De repente, não estava mais no lago.Estava em um campo de batalha.Espadas colidiam com estrondo, a guerra explodia ao meu redor. Lobos enormes corriam em disparada, seus uivos se misturando aos gritos de feiticeiros e magos.Em minhas mãos, uma espada brilhava com um poder estranho. Eu lutava.
Cap. 3: Rumores de armação.Meus pais pareciam hesitantes naquele dia, o que era compreensível. Como poderiam contar para sua filha que dormiu toda a vida que, agora com apenas três anos, precisaria se preparar para um casamento iminente? Disseram que eu tinha um parceiro, mas não revelavam muitos detalhes. Imaginei que se tratava de algo complexo, que eu precisaria reconhecer meu parceiro e ele a mim. Como podiam escolher algo assim para mim?— Não se preocupe, Samuel Kan é um homem inteligente e bonito — disse minha mãe, demonstrando insegurança e desviando o olhar. Isso me deixou ainda mais intrigada.— Mamãe... vocês me ofereceram a ele?— Nunca faríamos isso! — protestou ela.— Mas... de repente Samuel Kan se interessou por uma de vocês.— Tem certeza que não foi por minha irmã Lana? — perguntei esperançosa.— Não é sua irmã, ele foi bem claro. Além disso, foi naquele... — ele ia dizer algo, mas minha mãe o interrompeu. Que segredos eles estavam escondendo agora? Quem era Samuel
Cap.4: Trama dos trigêmeos.Samuel kanA aurora despontou, anunciando o dia do meu casamento. No entanto, meu coração não pulsava com a alegria habitual de um noivo. Em vez disso, era tomado por uma mistura de ansiedade e melancolia.Horas antes da cerimônia, eu me encontrava em meu escritório, cercado por uma comitiva de líderes das empresas da nossa família. Eles discutiam animadamente sobre os detalhes do casamento, enquanto eu me perdia em pensamentos sobre Maya. Será que ela já havia chegado?Com dificuldade, tentava me concentrar nas palavras dos anciões, mas meus pensamentos se voltavam para ela, a mulher que amava e que havia sacrificado sua vida para me salvar. O casamento arranjado com outra mulher era apenas um meio para um fim, uma exigência da deusa do destino que eu precisava cumprir para poder encontrá-la novamente.Quando ela tinha morrido em meus braços, a deusa do destino me garantiu que ela renasceria e eu aceitei a derrota naquele dia, mas fui salvo por um triz, um
Cap.5: aprisionada em meus braços.Samuel KanCom um urro gutural, me libertei das mulheres que me prendiam e saltei pela janela. Em minha forma de lobo, a poção que meus irmãos me deram teria menos efeito, mas ainda assim, meu tempo era curto.Os estilhaços do vidro da janela quebrada cortaram minhas patas enquanto eu aterrissava dois andares abaixo. Por um instante, pensei ter visto um vulto em cima de uma árvore, ou talvez... uma mulher? Mas isso não importava agora. A poção me confundia, e minhas visões podiam ser enganosas.Continuei correndo entre as árvores, cambaleando a cada passo. Minha visão turva dificultava a fuga, e eu sabia que meus irmãos logo enviariam alguém em meu encalço. Precisava encontrar um lugar para me esconder e ativar um bloqueio mágico.Minha forma de lobo era imponente, comum para um lobo de guerra. Meu tamanho e pelo acinzentado quase prateado me tornavam um alvo fácil. Era difícil me esconder entre as moitas, ainda mais sob o efeito da poção.De repente
Cap.; 6: quem é a mulher que eu possui?Maya tentou se afastar na primeira oportunidade, mas ele se moveu num estalo, os olhos brilhando com uma intensidade feroz que fez Maya temer. o braço dele se enrolando ao redor dela como um açoite. Maya caiu com um grito abafado, o peso dele a imobilizando no chão.— faça silencio. — Samuel a alertou após ouvir os passos ainda distante.— Quem... quem é você? — ela arfou, tentando empurrá-lo, mas ele era sólido como pedra.Samuel não conseguia pensar. Seus sentidos estavam confusos, misturados em uma tempestade de instinto e desejo. Ele sentia a presença dela, tão perto, tão insuportavelmente forte. Quem era ela? Como tinha passado por sua barreira? Como podia vê-lo quando ninguém jamais conseguira?Os olhos dele eram um abismo, selvagens, incapazes de foco. Ele segurava Maya com tanta força que seu corpo doía, mas era incapaz de soltar. Sua respiração vinha pesada contra o rosto dela, e por um momento, Maya viu algo brilhar nos olhos dele...
Capítulo 7 – A Fuga e o DesprezoO jardim estava vazio, mas Maya não se sentia livre. Cada passo que dava parecia ser mais pesado que o anterior, o vestido branco, agora sujo e rasgado, arrastando no chão como um manto de vergonha. As lágrimas escorriam por seu rosto, misturando-se ao suor frio e à terra que manchava sua pele. Ela só queria ir embora, fugir para longe daquele lugar, onde as lembranças do que acabara de acontecer não a perseguiriam.Quando chegou a um canto mais afastado, tentando se esconder na escuridão, uma mão forte a agarrou violentamente pelo braço. O grito que ela soltou foi abafado pelo toque brusco, e seu corpo foi puxado para trás com força. Ela tentou se desvencilhar, mas a pressão aumentava, e logo se viu sendo arrastada para a frente.— O que está fazendo, hein? Tentando fugir? — a voz de seu pai rasgou a noite como uma lâmina afiada. Ele estava ali, furioso, seus olhos brilhando de raiva. — Sua ingrata!Maya olhou para ele com os olhos inchados de tanto ch
Cap. 8: Instintos nunca mentem.Samuel Kan.Antes de seguir para o grande salão pedi para meu pai deixar tudo preparado e fui rapidamente ate a cobertura onde estava metade da guarda de lobos, sei que todo aquele jardim é observado, então penso que poderiam ter visto algo.Mas não conseguir obter nada. Como eles poderiam ter perdido alguém tão peculiar, se bem... que ela não tinha cheiro de lobo, mas não acredito que tenha sido uma humana, eu também não sentir nada que disse que ela é uma humana, era algo família, mas peculiar, infelizmente a poção que eles me deram causa um bloqueio agressivo para que lobos como eu que só conseguem ficar com suas parceiras tenham contato com outras lobas, ou seja, ele me torna alguém que não consegue identificar minha parceira então por consequência acabei conseguindo ficar com alguém como aquela desconhecida.— Quero que vocês averiguem a lista de convidados e todas as mulheres que estiveram nesse lugar, sele os portões e não deixe ninguém sair até
Cap. 9: O líder também deve punir.— O grande Líder Alfa... — um deles começou, com um sorriso venenoso nos lábios. — É realmente digno desse título caros ministros? — um deles perguntou.Observei a multidão se entreolhar, a desconfiança crescendo no ar. Mantive minha postura imponente, os olhos frios, sem demonstrar qualquer emoção, aqueles três já deveria saber que não há nada que eles possam fazer para me atingir, eu só me submeto a outras lideranças para não causar problemas no equilíbrio de todo a matilha.— O nosso grande e imaculado líder talvez não tenha o direito de estar em qualquer posição estando nesse mundo onde temos regras rigorosas com escândalos, porque então ele é um dos primeiros a quebrar as regras.— O que estão insinuando? — Minha voz saiu firme, carregada de uma ameaça velada ao mesmo tempo que escondia um sorriso cruel.Os trigêmeos trocaram olhares antes de um deles disparar o golpe final.— Que você traiu sua própria Luna e não faz muito tempo! — eles levanta