Lacantra, uma jovem guerreira que vive e sente uma realidade que não conhece através de Dejavus e sonhos, ou seriam "visagens"? O que sente, não há controle, mas sua vida está em um impasse, sendo alocada em outra Tribo, acontecimentos que indepedem de sua vontade, perdas, tragédias , novas hierarquias. Sua única arma é a sua força e o amor pelos amigos que confiam nela e lutam ao seu lado.
Ler mais- O que é isso que desenhou aí, Lacantra?
- Eu não sei o nome, mamãe, mas sei que seria muito bom para falar com papai quando ele estiver longe nas batalhas ou caça.
- Essa foi minha primeira lembrança, creio que eu deveria ser muito pequena, mas me lembro que havia sonhado com isso, sabe. Corri para fora e risquei em frente à nossa porta com um graveto qualquer. Minha mãe até chamou avó Dabi para ver, ela achou muito interessante o desenho e por mais que eu tenha tentado explicar seu funcionamento, eu não conseguia, era muito novinha ainda.
“É o mesmo desenho que já fiz tantas vezes nos anos que se passaram, sabe aquele desenho quadrado que já fiz para você, já até me acostumei a desenhá-lo. Ainda tenho visões com ele quando durmo, ele e mais tantas outras que não sei explicar, são coisas que nunca vi. E qual sua lembrança mais distante? - Perguntou ao amigo Lucca.
- Me confundo entre duas, não sei qual é a mais antiga, mas essas duas são as mais antigas que tenho: De um Cintur que correu atrás de Orna, a menina que morava na choupana ao lado, e eu. Estávamos buscando ovos deles e o ninho estava vazio, de repente um deles estava ao nosso lado. Orna me arrastou, caímos, minhas pernas eram muito curtas para acompanhá-la e nos jogamos no rio. Me lembro que ficamos lá até papai nos buscar, que foi quando o sol estava se escondendo. Talvez nem tenha demorado tanto, mas quando se é muito pequeno, as coisas se estendem. Outra lembrança que tenho, é a de acordar muito quente e com a visão embaçada. Não conseguia falar, minha garganta doía e quando mamãe me pegou, é, talvez essa seja a mais antiga, pois mamãe ainda me carregava no colo. Quando ela me pegou, assustou-se e disse ao papai que eu estava com Cinni. O corpo quente, segundo ela me disse anos depois, permaneceu por quase uma lua. Fiquei muito mal e até fui levado á mãe Shetary. Ela me fez tomar várias beberagens, argh, isso já não me lembro, mas me contaram.
- Creio que eu não tenha tido Cinni. Nunca perguntei á mamãe, mas se tivesse, ela teria comentado. Vamos continuar a pega dos ovos enquanto eles estão fora?
Lacantra e Lucca passaram para os ninhos próximos á procura de mais ovos de Cintur.
Cada ovo dessa ave, daria para uma família de umas cinco pessoas se alimentarem por uns três dias. Não era simples a colheita, os Cinturs raramente saíam de seus ninhos, e tinha que se saber a hora exata de colher e fugir antes que retornassem ao ninho. Geralmente era o pai quem cuidava dos ovos, e seu tamanho. era assustador. Muitos já haviam sido pisoteados, ossos quebrados, bicadas e até morte.
Poucos se aventuravam na colheita, mas os escolhidos, que passavam uma boa temporada sendo treinados, sabiam a hora certa de colher e jamais colhiam mais que o necessário.
- Depois você faz novamente o rabisco das coisas que vê enquanto repousa, de suas visagens?
Os sonhos mais reais, os que eram lembrados, chamavam de visagem.
Lacantra os tinha desde muito pequena.
Assustara seus pais com diversas visagens, cada uma mais realista que a outra. Em seus sonhos, via coisas inexplicáveis e por sorte desenhava bem para os expressar, tentar explicar. Mesmo agora, sendo uma adolescente de dezessete anos, muitos lhe procuravam para que ela desvendasse suas visagens.
Ela não se considerava uma visadora, que era como chamavam os que tinham o dom de desvendar sonhos, apenas sonhava coisas absurdas que a deixava sem entender.
A cada troca de lua, ela e Lucca, seu amigo mais antigo, saíam á caça. Tanto de ovos, quanto de peixes e pequenos animais para ajudar na alimentação de Pua, a tribo em que viviam com seus pais e irmãos e mais duzentas pessoas, aproximadamente.
Cada qual, contribuía de uma forma e juntos, funcionavam como uma comunidade.
- O Solstício está chegando. - Disse-lhe Lucca.
- É, eu sei,. Espero que mudem algo dessa vez. Gostaria de ir mais longe, você não?
- Ás vezes sim, mas depois penso que seremos igual aos Cândalos viajantes. Já pensou, ficar várias luas longe a caçar, resolver questões de Pua?
- Você é um preguiçoso, sabia? - Lacantra deu-lhe um peteleco na orelha, sorrindo.
- Ai! Não faça isso. Se eu derrubar algum ovo, não voltarei para pegar mais e a culpa será sua. Não é preguiça… Mas já observou quando voltam, o alívio, a saudade que demonstram ter dos que ficaram?
- Sim, mas tudo tem um preço, não é? Eu gostaria de ir mais longe, ver mais tribos, outros costumes. Será que Luty se acostumou a viver em Tangui?
- Já se passaram mais de dez luas, creio que sim. Vi sua substituta há alguns dias atrás e não me parecia triste.
Ambos tinham a expressão fechada ao mencionarem esse assunto.
Os Sivaês se encontravam de tempos em tempos, cada um de uma tribo, algumas há dias de viagem para um Fulgot, que era onde discutiam melhorias, sejam quais fossem, que julgassem necessárias para o bem comum.
Luty, um jovem da tribo de Pua, fora trocado, realocado para Tangui, uma tribo vizinha que estava em defasagem de rapazes de sua idade. A troca fora feita por uma jovem que viera morar em Pua. Os pais de ambos, não questionaram a decisão do conselho dos Sivaês.
Os Sivaês eram os mais velhos de cada tribo, e por hierarquia, tomavam decisões e eram sempre procurados para ajudar a tribo. No Fulgot, os membros mais antigos, parlamentavam por alguns dias e decidiam o que seria o melhor a se fazer em decisões.
Lacantra tinha dois irmãos. Pipa, a caçula e e Carh, o irmão mais velho que já não morava mais com eles mas havia feito o enlace no último inverno. Carh morava próximo á família e os visitava todos os dias com sua esposa, Sáhh. Lacantra era alta, membros longos e magra, o pai sempre a chamava de magrela; os olhos e os cabelos, eram semelhantes ao de seu pai, de um castanho mais escuro que o da mãe e a irmã. Os três irmãos tinham dentes pequenos e gengiva proeminente.
Lucca era filho único, seus pais ainda tentavam mais filhos, mas fracassaram até o momento. Se sentiam sortudos pelo filho único ter vingado. Um pouco mais alto que a amiga, era um lindo rapaz; os músculos já apareciam e deixava para trás o aspecto juvenil, graças aos treinos que iniciara com os Cândalos. Começara os treinamentos há um ano e agora com dezoito, já aumentara o físico. Lucca tinha os cabelos negros e curtos, os lábios finos, olhos tão pretos que mal se viam as pupilas.
Pua contava com duzentas e sete pessoas. Em diversas idades. Idosos, casais, crianças.
Era considerado até bem populoso. Algumas tribos não contavam com cem pessoas no total.
Suas moradias, eram fabricadas por eles mesmo e em uma cooperativa milenar, um ajudava ao outro, às vezes sem sequer ser pedido. Funcionavam bem.
- Vamos para Tiô mais tarde? - Questionou Lucca a amiga assim que chegaram á seu condado, sua tribo levavam cerca de uma hora para ir até a floresta onde pegavam ovos de Cinturs.- Ah você está de sangue, né? Havia me esquecido.
- Sim, odeio que vocês,machos sintam quando estamos assim. Injusto isso.
Qualquer macho, seja animal ou humano, sentiam quando uma fêmea estava menstruada. Isso facilitava na cópula animal e dizia quando a fêmea humana estava pronta para reprodução. Lacantra insistira em fazer a colheita dos ovos mesmo sabendo que poderia atrapalhar por causa do cheiro que exalava em seu período menstrual. Não quis trocar com seu irmão e teve sorte de não ter sido pega por um Cintur.
- Mãe, Pipa, cadê vocês? Trouxe três ovos e minhas costas estão se partindo do peso.
Sua mãe veio recolher os ovos e guardá-los.
Tábea, mãe de Lacantra, era baixa e obesa. Cabelos longos, castanhos já grisalhos, o branco vencia a cor original. Feição amável, sua mãe era paciente mas tinha o pulso firme com os filhos e o marido, Puzzo. Apareceu á porta com seu gingado, ansiosa para preparar os ovos e estocar para a semana. Dois, ela passaria aos vizinhos. Um seria o suficiente para sua família, tendo outros alimentos para acrescentar.
- Essa sua dor nas costas, deve ser do sangue. Deixe que Pipa me ajuda agora, vá fazer uma mistura de ramas, beba e se aqueça, logo estará melhor.
Pipa, como os irmãos, era alta, puxara o pai na estatura e ossatura. Magros com membros longilíneos e cabelos claros como o da mãe.
Pipa estava na bica de água, lavando roupas quando a mãe a chamou para ajudar. Entrou sorridente, uma característica sua, sempre sorrindo. Tinha a gengiva avantajada e dentes pequenos, como sua mãe e seu sorriso e a delicadeza de sua fala, sempre baixa, passava uma sensação de paz para quem conversava com ela.
- Tive uma visagem hoje. - Disse, enquanto sentava-se em uma pedra ao lado da mãe no cômodo mais movimentado da choupana. O pai havia aumentado a choupana inúmeras vezes por causa dos filhos altos que cresceram, como ele dizia, rapidamente.
- Ah, por favor, me conte? - Pediu Lacantra, animada.
- Não foi igual as suas, já aviso logo, mas foi estranha. Me ajude com essas bagas enquanto guardo o ovo.
- Sabia. Você ouviu mamãe me dizer que estou de folga e quer que eu a ajude para me contar a visagem. Mamãe, faça-a contar. - Pediu Lacantra, fazendo beicinho.
- Você teve sua chance de se retirar, agora ajude-nos um pouco.
O cômodo era utilizado para armazenarem comida e se alimentarem. A choupana era comprida, cerca de dez metros total, dividido em áreas de dormir, se alimentarem e se abrigarem do frio rigoroso no inverno.
Lacantra e Pipa dividiam um cômodo para dormir; o que usavam como cama, eram mantos que jogavam a um canto, às vezes vários caso fosse inverno. Cada uma arrumava seus mantos em um determinado lugar do quarto. Tinham também alguns baús para guardarem suas coisas, seus pergaminhos, suas vestes e o que desejassem guardar.
- Mãe, não seja exagerada, por Rafo - Dizia Cárita, filha de Lacantra. - Essa sua invenção nunca deixará de ser útil. Mas vou me embora, volto em uma lua, prometo - Cárita lhe beijou a testa vincada de rugas e se foi.Ela tinha muito orgulho de sua filha, Cárita era muito parecida ao pai, até no amor por Rollis. Onde ia, levava sempre seu companheiro.Lucca, seu filho mais velho também gostava de Rollis e tinha um criadouro com uma meia dúzia.Lacantra adorava sua morada. Construiu-a com seu companheiro quando fizeram o enlace há tantos anos atrás. Foi uma morada movimentada; tudo acontecia ali, os Cândalos a procuravam sempre e mantinham sempre a porta aberta, pois não tinham horas para chegar. Centenas de invenções, ela trouxera para as tribos, incontáveis. Tudo mudara desde que ela se mudara de vez para Pief,
Abrir os olhos lhe custava muito. Lhe doía toda a cabeça e Lacantra resolveu não os abrir.Sentia o suor a lhe escorrer pelas costas e se grudar em suas vestes.Sentia o cheiro da fumaça do cigarro de Shetary, já tão conhecido por sua memória olfativa.Sabia que o dia estava claro, pelas pálpebras cerradas, ela sabia que era dia.Só forçou suas vistas a se abrirem ao ouvir a doce voz sussurrada de Aloy. Seu Aloy. Mas seus olhos não abriam, por mais que ela quisesse e tentasse.- Já se passaram quase uma lua, mãe. O inchaço em sua cabeça diminuiu, o corte já está cicatrizando, por que não acorda, por Rafo, por que não acorda?- Calma, rapaz - A voz de mãe Shetary também era baixa, mas firme - Temos que agradecer à Rafo por ela estar viva e respirando. Foi uma pancada muito forte.- Ma
Misericordiosamente, o bairro em que moravam não foi atingido pelas bombas. Zaira chegou a sua casa após andar sozinha, dispersa de pensamentos. Ignorara pessoas pela qual passara, não respondia quem a chamava. Perdera os sapatos pelo caminho e seus pés estavam feridos das pedras soltas pelas ruas.Andara em meio ao caos, vazia e sem se importar com nada e nem ninguém.Magna e Frane tinham a expressão de assombro quando ela chegara. estavam no portão, junto a muitos vizinhos e foi Nani quem a viu virando a esquina.Rael, sua irmã, Magna e Frane, a bombardeavam de perguntas:- Como está?- E esse sangue?- Tem algo quebrado?Ela os olhava, mas não conseguia se importar, era uma casca vazia, só quando perguntaram de Corny, ela saiu de seu torpor:- Ele está morto. Busque-o, doutor Frane!Ela pediu e entrou para casa.Ma
Ignorando as dores que pioravam cada vez mais em sua barriga, ela esperou.Ouviu um carro que se aproximava e levantava a poeira da rua. Corny estava desmaiado novamente.Ela correu de encontro ao carro como se sua vida dependesse disso.O carro parou há cinco metros, ela fazia sinais com as mãos, mal tinha voz para gritar e eles pararam.A alma saiu de seu corpo quando desceram. Eram os dois policiais que queriam prendê-los mais cedo. O destino não podia fazer aquilo com ela.- Há um ferido - Ela disse tão logo eles desceram, rezava para estar tão imunda como imaginava que estivesse, como se sentia e assim não a reconheceriam, talvez com tudo o que acontecera, eles os ajudariam.Ela mostrou onde Corny estava, mas ficou ao lado do carro. Não os acompanhou e quando um deles, o que havia desferido uma coronhada em seu marido olhou para trás, para ver por que ela
Corny veio engatinhando até Zaira; ele falava algo, mas ela só via sua boca mexer, não o ouvia, conseguiu ler seus lábios, ele dizia vamos.Corny tinha um corte na fonte, ela não sabia se era da coronhada que levara ou se havia se ferido com os escombros.Ele a ajudou a se levantar. Viu que Tícia, toda suja também se levanta e estava apoiada em seu vizinho traidor. Ambos falavam algo, Tícia apontava o céu. Ao longe um avião, que não estava tão alto como talvez deveria estar, se distanciava.A rua estava lotada de pessoas que saíram de suas casas, assustados como eles, uns gritavam, suas bocas mexiam, mas nada se ouvia. A rua já não estava como a minutos atrás; casas destruídas, fumaça, poeira, caos.- Temos que sair daqui, Zai, agora!Ela já ouvia seu marido, aos poucos, ouvia gritaria.- Te
Rael começara a namorar Dija, uma garota que conhecera há pouco tempo, antes que as aulas tivessem sido encerradas e passaram a namorar assim que se encontraram para continuar os estudos em casa. Não queriam ficar parados, mesmo com as escolas de todo país fechadas. O jovem, agora com dezoito anos, muito parecido com seu pai na mansidão e tranquilidade, sonhava em se tornar médico. Nani continuava se apaixonando na velocidade com que trocava de roupas; em um dia jurava estar apaixonada por algum rapaz, para no dia seguinte estar apaixonada por outro e o de ontem, esquecido.Nani e Dija eram inseparáveis, a eterna namoradeira havia arrebanhado a cunhada para ser sua nova confidente agora que Magna e Zaira seriam mães e estavam cada uma em seus quartos, a garota tinha uma nova melhor amiga.Magna estava de cinco meses, sua barriga estava enorme e seu marido dizia que só podia ser gêmeos, p
Último capítulo