MAXUELL
Antes de nos mudarmos para São Paulo, eu e Josellyn estávamos passando por algumas dificuldades. Eu ainda sentia muita falta da minha esposa, a quem tanto amava, e sempre que via minha filha linda, eu a via. Elas eram muito parecidas, com seus olhos claros e cabelos cacheados, mais negros que a própria escuridão. Ela havia puxado a mãe, tão linda e meiga. Quando mudamos, foi de certa forma difícil, porque eu não queria deixar minha cidade, que tanto amava e onde havia vivido com minha mulher. A casa tinha tantas lembranças, lembranças que me deixaram triste no início, mas que, depois de tudo, foram o que me deu forças para continuar, ajudando a lidar com a perda dela. Quando eu estava vivendo o luto, minha condição financeira foi por água abaixo. Perdi minhas ações, minha empresa faliu por eu ter perdido a credibilidade e os acionistas. Ninguém iria investir em uma empresa cujas ações foram vendidas e perderam todo o seu valor. Quando chegava em casa, minha filhinha estava sempre com alguém, e eu estava disposto a pagar alguém para cuidar dela, pois não tinha tempo para cuidar dela e procurar emprego. Passei anos trabalhando em lugares onde não tinha nenhuma estabilidade. Por muito tempo, insisti onde não deveria e, por conta disso, nem aproveitei a infância da minha menininha. Eu sou um pai que perdeu muitas coisas da vida da minha filha, e não sei como deixei isso acontecer. Um dia, cheguei em casa depois de mais um dia de tarefas cansativas, que mal davam para pagar as contas no início do mês. Cheguei em casa e fui dar um beijo na minha menina, que já estava muito crescida a essa altura. Quando cheguei à porta de seu quarto, escutei-a chorando. Chorava tanto e falava com a mãe, dizendo que precisava dela, que se sentia sozinha e abandonada porque ela havia morrido e o pai nunca estava em casa. Isso foi o suficiente para que eu tivesse um choque de realidade. Minha filha precisava de comida e de cuidados, mas também precisava de um pai e, principalmente, da figura materna, da qual fora privada desde o momento em que nasceu. Decidi começar com o que estava ao meu alcance: arrumar um trabalho de verdade e nos ajeitar. Ter um emprego fixo me daria a oportunidade de ser presente para minha tão amada filha. Trabalhei por um tempo em uma empresa que conhecia meu trabalho e sabia da minha competência. Quando me fizeram aquela proposta de trabalho, minha querida filha já tinha 14 anos. Mesmo ela sendo jovem, falei com ela sobre a nova oportunidade e que teríamos que nos mudar para o Brasil e começar uma vida nova, que ela teria que se despedir dos amiguinhos da escola e começaríamos do zero. Por incrível que pareça, ela entendeu muito bem e aceitou de bom grado. Mesmo com o trabalho, mal dava para comer e pagar as contas, e estávamos prestes a perder nossa casa. Ficamos juntos em uma casa enorme e muito linda, saímos das dívidas e não havia mais cartas de aviso de despejo. Mesmo com tanta coisa boa acontecendo, eu via que minha filha ia crescendo e que não ter sua mãe era extremamente difícil. Sempre a via conversando com uma foto que tinha guardada, e isso doía meu coração. Quando conheci Alexia em uma das várias viagens de trabalho, fiquei feliz, pois senti por ela algo tão forte que só havia sentido pela mãe da Josellyn. Pela primeira vez em anos, senti que poderia recomeçar e tive esperanças de que minha filha finalmente teria uma mulher como exemplo, e não somente eu. Claro que minha amada filha é à frente de seu tempo, ela sabe de tudo e mais um pouco, mas ter uma mulher por perto seria maravilhoso, para conversar sobre coisas que ela só conversaria com a mãe. Isso nos leva ao momento de agora. Contei à minha filha sobre meu novo relacionamento e sobre o fato de que vou me casar com Alexia, assim como o fato de que ela irá morar com os novos irmãos. Minha filha não esboçou nenhuma reação. Acho que foram informações demais para ela processar, mas era necessário contar. Eu estava muito ansioso e não sabia por onde começar nem onde pausar, então joguei tudo no ar de uma vez só. - Querida, fala alguma coisa, estou ficando preocupado. - O que você quer que eu fale? Parece que você já se decidiu e já tem tudo arranjado. Eu não tenho nada a fazer senão aceitar. - Filha, eu preciso saber que você está realmente bem com isso. Sei que você irá gostar dela em algum momento. - Papai, esse é o problema. Você não falou comigo antes. Chegou aqui com ela e me disse que vai se casar. Há quanto tempo vocês estão juntos? - Eu conheci a Alexia não muito depois que chegamos aqui. - Caramba, papai, como você conhece uma mulher, tem um relacionamento com ela há mais de três anos e não me contou nada? Não acha que eu merecia saber desse relacionamento muito antes de você aparecer aqui dizendo que vai se casar? - Filha... você tem razão. Eu deveria ter falado com você, mas acabei não falando. Pensei que não era o momento. Achei que agora tinha que ser feito, afinal, nós vamos nos casar, e eu não quero que você fique chateada, meu amor. Agora você não se sentirá sozinha, porque terá irmãos e será protegida. Eu não vou viajar e ficar preocupado. Moramos em uma área nobre, mas isso não me deixa mais tranquilo. - Olha, eu fico muito feliz que você finalmente encontrou alguém que gosta e com quem queira dividir sua vida. Eu aceito o relacionamento de vocês porque quero você feliz, e eu me mudo se for necessário. Mas não espere que eu me comporte como uma filha e irmã de uma hora para outra, porque isso não vai acontecer. Eu preciso de tempo para processar tudo isso. Se me dá licença, eu vou me retirar agora. Fique à vontade e felicidades aos noivos. - Filhinha... - Não, querido, ela precisa de tempo. Ela não desaprova, só ficou chateada pela demora em contar. Para ela, isso é uma novidade repentina. No mínimo, na cabeça dela, você falaria de imediato quando arrumasse alguém, e ela teria tempo de conhecer a pessoa e a família antes de você sequer pensar em se casar. Ela tem razão. - diz Alexia enquanto me abraça. - Tudo bem, meu amor, você tem razão. Vamos continuar nossa comemoração, mesmo que não tenha minha filha junto. Só espero que tenhamos mais sorte com seus filhos amanhã. - Não se preocupe, eles são mais velhos e sabem que sou livre para ter um relacionamento. Você verá que eles não terão problemas com isso. Com isso, nós dois nos abraçamos e continuamos bebendo e conversando sobre amenidades, trabalho e preparativos para o casamento. Queremos viajar já casados, e eu não vejo a hora de me casar e poder ter minha vida completa novamente. Espero que minha querida filha veja isso e o quão maravilhoso isso é. JOSELLYN Eu não acredito que o papai escondeu que tinha uma namorada por mais de três anos. Não me conformo. Sem ter a mamãe aqui, achei que contássemos tudo um para o outro. Eu me orgulhava de ter um relacionamento de pai e filha melhor do que o de minhas amigas, que viviam falando das mentiras que ouviam dos seus pais. É... acho que eu não sou muito diferente delas, afinal. É complicado descobrir sobre o relacionamento do pai na hora em que ele está praticamente entrando na igreja. Estou muito feliz que ele finalmente vai se casar e ter alguém em sua vida. Sei que ele sente falta disso, mesmo que nunca tenha me falado. Fico feliz de ganhar irmãos, mas, poxa vida, por que ele tinha que me esconder isso dessa forma? Eu me sinto mais que traída. Deito na cama e começo a chorar com tudo que soube. Já estou magoada com o que ouvi da Cláudia sobre a mamãe na escola, e agora isso. Esse definitivamente não foi o meu dia. Pego o meu celular na mesa de cabeceira. Quero falar com minha amiga sobre isso, então entro no grupo que temos para nós três. - Aí, galera, descobri uma mentira do meu pai. Estou muito chateada. - Mentira? Como assim? Achei que vocês contassem tudo um para o outro. - Somos duas, amiga, mas não posso falar sobre isso. Já chorei, fiquei com raiva e definitivamente não quero chorar ainda mais. Amanhã a gente sai para a lanchonete depois da aula, eu pago. - Então tá bom, gatinha, até porque o nosso amigo em comum está dormindo a essa hora. - Eu também quero dormir, amiga. Não me leve a mal, mas não tenho pique para ficar de conversa agora. Amanhã a gente se fala na aula. Beijos, te adoro. - Beijos, gatinha, até amanhã.