Parte 4 - O fim de uma vida

Esperei o Dante na entrada do vestiário dele, em um corredor cheio de gente – outros lutadores suados, treinadores dando instruções, familiares ansiosos ou aliviados. O barulho da multidão na arquibancada ainda era alto, mas aqui era um caos mais próximo, mais pessoal, cheio de energia pós-luta.

Vi o Dante vindo na minha direção. Todo feliz, o rosto brilhando de suor e orgulho, os braços abertos. Abri os meus na hora e ele veio para um abraço forte, o corpo jovem e forte do meu filho contra o meu.

"Meu campeão!", eu disse, apertando ele. "Estou tão, tão orgulhosa de você, filho! Você foi incrível!"

Ele se afastou um pouco, ainda sorrindo de orelha a orelha, e me mostrou o troféu. Uma taça prateada reluzindo sob as luzes. "Primeiro lugar, mãe!", ele disse, segurando a taça com as duas mãos. "Ganhamos!"

Olhei no relógio na parede do corredor. "Nossa", eu disse. "Terminou rápido, hein? O torneio ainda deve estar rolando lá dentro." Uma ideia me veio à mente, rápida e inesperada. Uma chance de transformar a decepção da ausência deles em algo positivo. "Filho...", eu disse, olhando para ele, o entusiasmo da vitória ainda vibrando entre nós. "O que você acha? A gente podia ir até a clínica."

Ele me olhou, confuso por um segundo. Ir até a clínica agora?

"Ir lá buscar o pai e a Vivian?", eu continuei, a ideia me anima. "Podemos ir comer uma pizza para comemorar sua vitória! Que tal?"

O rosto dele se iluminou ainda mais, se é que era possível. A decepção de mais cedo, por eles não terem vindo, parecia ter sido completamente esquecida na euforia da vitória e na perspectiva de pizza. "Sério, mãe? Podemos ir lá agora?" Ele estava animado de novo, pulando um pouquinho no lugar, só pensando na pizza e em mostrar o troféu.

"Sim!", eu disse, sorrindo para o entusiasmo genuíno dele. "Podemos ir. Já terminou aqui, a gente pega suas coisas rapidinho. Vai ser uma surpresa para eles. Uma surpresa de vitória!"

"Vamos!", ele disse na hora, os olhos brilhando. "Vamos lá!"

O barulho da luta ficou para trás, substituído pelo som abafado da chuva fina batendo nos telhados enquanto caminhávamos para o carro. Entramos no meu carro. O cheiro familiar do estofamento molhado pairava no ar. Liguei o motor, liguei o limpador de para-brisa – a chuva fina ainda caía, mas a visibilidade estava boa. Comecei a dirigir na direção do prédio da clínica do Demétrio.

Dante estava no banco do passageiro, o troféu no colo, girando-o devagar. Ele estava quieto. O entusiasmo ruidoso de minutos atrás, a euforia da vitória, tinha diminuído um pouco, substituído por um silêncio que eu não esperava depois de uma luta daquelas. Olhava para a chuva na janela, o rosto sério, pensativo.

"Filho?", eu disse, sem tirar os olhos da rua, mas virando a cabeça um pouco para ele. "Está tudo bem? Você está quieto. Aconteceu alguma coisa?"

Ele suspirou baixinho. Continuou olhando para a janela por mais um momento, e então se virou para mim. Seus olhos verdes, tão parecidos com os meus, estavam cheios de uma maturidade inesperada para os quinze anos dele. Uma tristeza velada que me apertou o coração.

"Mãe...", ele disse, a voz baixa e sincera. "Eu percebi."

"Percebeu o quê, meu bem?"

"Eu percebi que você não está mais feliz", ele continuou, a voz um pouco embargada agora. "Com o pai." Ele hesitou um segundo, como se estivesse pesando as palavras, mas a decisão de falar era clara. "Eu quero que você seja feliz, mãe. É só o que eu quero." Ele olhou para o troféu no colo dele, depois se voltaram para mim, e a raiva contida na voz dele me surpreendeu. "E eu sei que a culpa é minha."

Senti uma pontada forte no peito. Aquela observação dele, tão direta, a culpa que ele estava sentindo por mim, a raiva dirigida ao pai. Estacionei o carro no acostamento por um segundo, o barulho dos limpadores de para-brisa no ritmo constante. Precisava olhar para ele de verdade, ter essa conversa com a atenção que ela merecia.

"Ei", eu disse, colocando a mão no braço dele, sentindo a pele quente sob a blusa fina. "Olha para mim, Dante."

Ele me encarou, os olhos cheios de uma mistura de preocupação por mim e ressentimento pelo pai. "Não é culpa de ninguém, filho", eu disse, tentando encontrar as palavras certas, simples como ele precisava, mas honesta. "Essas coisas... relacionamentos entre adultos... são complicadas." Respirei fundo. "O seu pai... ele tem os problemas dele. Eu tenho os meus. Nós temos problemas juntos, como casal. Coisas que a gente não conseguiu resolver." Balancei a cabeça lentamente. "Mas não é culpa sua. Nem um pouco. Você não é responsável pela felicidade de ninguém, Dante. Só pela sua própria. Entende?"

Ele assentiu devagar, os olhos ainda fixos nos meus.

"E sobre o seu pai...", eu continuei, a voz mais suave agora, mas firme. "Não guarde ressentimento no seu coração, Dante. Isso só vai te machucar por dentro. As coisas entre adultos são complexas, e eu sei que seu pai tem estado distante de um jeito que te magoa." Era difícil pedir isso, eu sabia que a dor dele era real, mas eu não queria que ele carregasse esse peso para sempre. "Mas isso não tira o amor dele por você. Eu sei que ele te ama, mesmo que ele não demonstre do jeito que você precisa agora, ou do jeito que ele demonstrava antes."

Peguei a mão dele que segurava o troféu, apertando-a. "E eu... ah, filho." Meus próprios olhos começaram a marejar um pouco. "A mãe vai ficar bem. Eu prometo a você. De alguma forma, tudo vai ficar bem. E a sua felicidade... a sua felicidade é o mais importante para mim neste mundo."

Dei um jeito de abraçar ele, ali no carro parado na chuva, sentindo o corpo forte e jovem perto do meu. "Você é incrível, Dante. Olhe para isso", apontei para o troféu no colo dele. "Você me dá tanta alegria, tanto orgulho. É por você que eu luto todo dia. A gente é um time, lembra?" Ele apertou minha mão com força, os olhos dele marejados agora também. "A gente vai passar por isso, o que quer que aconteça. Juntos. Como sempre. Tudo vai ficar bem."

Liguei o carro de novo, sentindo a mão dele ainda na minha por mais um segundo antes de ele soltar. Continuei dirigindo para a clínica, o silêncio agora diferente, mais compreensivo, um silêncio compartilhado de cumplicidade e dor. Tínhamos aberto uma porta para uma conversa difícil, mas necessária.

Estacionei o carro no estacionamento do prédio da clínica. A chuva fina ainda caía, deixando tudo com um ar melancólico do lado de fora. Eu e Dante saímos do carro, ele ainda segurou o troféu com cuidado, agora mais silencioso de novo depois da nossa conversa no carro.

Entramos no prédio. O ar aqui era diferente do ginásio – silencioso, um pouco frio, com um cheiro discreto de limpeza e desinfetante. Caminhamos pelo corredor com pisos claros, o som dos nossos passos ecoando um pouco no silêncio da tarde de sábado. As portas dos consultórios estavam fechadas, nomes em plaquinhas discretas ao lado.

A primeira parada foi o escritório que a Vivian estava usando. A porta estava fechada. Bati de leve. Sem resposta. Tentei abrir. Estava trancada. Ela não estava lá. Estranho.

Seguimos em frente, em direção ao escritório do Demétrio, que ficava mais ao fundo do corredor. O barulho suave da rua ficou para trás. Tudo quieto.

Então, enquanto nos aproximávamos, comecei a escutar um som. Vindo de dentro da sala dele. Um som baixo... que parecia... gemidos? Frases abafadas? Parei de andar, meus ouvidos atentos. Dante parou de andar do meu lado também, ouvindo. Olhou para mim, os olhos confusos e um pouco assustados.

"Mãe?", ele sussurrou. "Que barulhos são esses?"

"Não sei, filho", eu disse rápido, minha própria mente tentando entender o que estava ouvindo, o coração começando a bater mais forte no meu peito. "Vamos ver assim que chegarmos lá."

Foi então que eu notei, a poucos passos, da porta. A porta do escritório do Demétrio não estava totalmente fechada. Estava entreaberta, uma fresta escura de uns dois dedos de largura. Olhei para essa fresta enquanto dava os últimos passos para me aproximar. E então...

A cena que eu vi lá dentro fez meu coração parar de bater.

Literalmente. Senti meu peito congelar. O ar sumiu dos meus pulmões.

Demétrio estava perto da mesa dele, com a camisa social aberta. E ele estava beijando Vivian.

Vivian estava sentada na mesa dele, com as pernas cruzadas de lado, como se aquele fosse o lugar mais natural do mundo para ela estar. Os braços dela estavam no pescoço do Demétrio, puxando ele para mais perto. Eles se beijavam com uma intensidade, uma familiaridade, que me chocou até a alma. Como se fossem namorados de anos, completamente à vontade um com o outro, o mundo lá fora não existindo, não importando.

Um suspiro baixo, trêmulo, escapou de meus lábios, um som pequeno no corredor silencioso, mas ensurdecedor para mim. Senti meu corpo tremer incontrolavelmente. Olhei para Dante ao meu lado. O rosto dele estava pálido, branco como papel, os olhos arregalados, olhando para a mesma cena através da fresta da porta. Olhei envergonhada para ele, sentindo uma dor lancinante não só por mim, pela traição, mas por ele estar vendo aquilo.

Aquela era minha irmã. Vivian. A mesma que eu tirei de um casamento tóxico para proteger. A mesma que eu acolhi na minha casa. Beijando meu marido. Demétrio. Na sala dele, no trabalho, eu ajudei ela a conseguir.

Meu mundo, que eu pensei que já estava instável, balançando com as distâncias e segredos, havia acabado de se quebrar em mil pedaços com aquela traição cruel e inesperada. Não era "outra mulher", uma desconhecida. Era a minha própria irmã. E o meu marido. Juntos.

Céus.

Empurrei a porta com tudo. O som da madeira batendo na parede ecoou pelo corredor silencioso. Eu não poderia mais ficar parada, escondida, testemunhando aquela cena nojenta, aquela traição grotesca bem ali na minha frente.

Demétrio e Vivian se afastaram na hora, com um susto. Os olhos deles se arregalaram ao nos ver ali – eu e Dante, parados na porta, a surpresa da vitória transformada no choque horrorizado da descoberta. Demétrio estava com a camisa desabotoada, o cabelo um pouco bagunçado. Vivian, sentada na mesa, parecia uma criança pega em flagrante, o rosto vermelho.

Dante deu alguns passos para dentro da sala comigo, ainda segurando o troféu com uma mão. Os olhos dele estavam fixos no pai, cheios de um desprezo puro e doloroso.

Demétrio tentou falar primeiro, a voz um pouco trêmula, tentando soar normal, tentando entender. "Ella? Dante? O que vocês estão fazendo aqui tão cedo? Aconteceu alguma coisa?"

Aconteceu alguma coisa?

Como ele podia perguntar isso? Como ele podia se preocupar com a gente voltando "cedo"? Quando ele havia faltado à luta do filho, à vitória do filho, para se enroscar com a própria tia do Dante? Com a minha irmã? A raiva ferveu nas minhas veias.

Vivian estava muda, sem palavras, com a cabeça baixa, incapaz de nos encarar. O rosto escondido pelos cabelos caídos. E eu me lembrei, com uma pontada de horror ainda maior, do que ela havia me confidenciado naquela manhã chuvosa: ela estava grávida. E o bebê não era do Marcos. A cena na minha frente, a intimidade, o choque... a verdade explodiu na minha mente com uma clareza brutal. O bebê. É do Demétrio.

Levei tudo para não gritar, para não tocar nesse assunto ali, na frente do meu pobre filho. Como eu poderia dizer a ele, naquele momento, que além da traição que os dois ali na nossa frente cometeram, a tia Vivian ainda engravidou... do pai dele? Deus, o quão baixo os dois foram. A crueldade disso...

Olhei para Vivian, a minha irmã, a quem eu amei. O pensamento me veio, cruel e afiado como uma faca. Eu a coloquei na minha casa para tirar o meu marido!

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