Isabella:
Seattle – EUAManhã seguinte...Mais uma mensagem do Alê.
Alessandro:
São sete da manhã, Bella. Já está nesse humor?
O que houve? Algum problema?— Alguns, Alê... alguns... — murmurei, exausta, começando a digitar a resposta.
Isabella:
É, as coisas não andam bem. Tenho muitas coisas pra te contar.
Mas você deve estar indo pro trabalho, né? Quando tiver um tempinho, vou te alugar por algumas horas.Enviei e soltei um longo suspiro.
Coloquei o celular de volta na bolsa, peguei-a e saí do banheiro, tentando parecer normal.Minha mãe estava sentada no sofá, distraída folheando alguns papéis, mas levantou o olhar assim que me viu no corredor.
— Ainda está de pijama? — ela perguntou, franzindo a testa.
— É... ganhei uma folga hoje. Não vou trabalhar — menti, tentando soar natural.
— E por que está com essa bolsa?
Merda.
Eu tinha levado a bolsa pro banheiro porque era lá que estavam as caixas dos testes de gravidez. Poderia ter sido um pouco mais discreta.— Eu... esqueci a bolsa no banheiro ontem à noite — improvisei.
— Se não ia trabalhar, não precisava ter acordado tão cedo, filha.
— Força do hábito — respondi, me aproximando para beijar a testa dela. — Como está se sentindo hoje?
— Estou ótima.
— Sério? Então por que não para de ficar lendo esses exames?
Ela deu um sorrisinho cansado.
— Força do hábito, assim como você. Minha consulta é às oito e gosto de chegar com antecedência. Estava te esperando pra sairmos juntas, mas já que você não vai trabalhar hoje...
— Posso te acompanhar, mãe. Me dá dois minutinhos que já troco de roupa.
— Não, querida. Você tem trabalhado demais. Aproveite a folga pra descansar.
Ainda tentei insistir, mas ela só me deu um beijo no rosto e saiu.
Fiquei parada por alguns segundos, ouvindo a porta se fechar.Depois me deixei cair no sofá, afundando nas almofadas, com o peso do mundo nos ombros.
Grávida.
Desempregada. E com a mãe doente.Um combo e tanto.
Meu celular vibrou dentro da bolsa.
Peguei-o, achando que fosse mais uma mensagem do Alê — e meu coração se animou por um instante. Eu queria muito conversar com ele. Mas o nome na tela não era o dele.Era Giuliana.
Por um segundo, precisei forçar a memória pra lembrar por que aquele nome ainda estava salvo no meu celular.
Fazia tanto tempo desde a última vez que nos falamos que eu mal reconhecia a sensação de ouvir a voz dela.— Giuliana? — perguntei, incerta se era mesmo ela ou se alguém tinha roubado o celular.
— Você respondeu ao e-mail do papai? Como você respondeu ao e-mail do papai? — ela disparou, em tom histérico.
Ah, sim. Era ela. Minha meia-irmã surtada.
— Que e-mail, Giuliana? Faz anos que eu nem falo com ele.
— Você sabe bem qual!
— São sete e meia da manhã, Giuliana. Eu mal sei o meu próprio nome a essa hora. De que e-mail você tá falando?
— O que ele mandou ontem à noite. Eu acabei de ver e... meu Deus, eu não paro de tremer.
— Não olhei meu e-mail de ontem pra hoje. O que tem de tão importante assim nele?
— O que tem de tão importante? Meu Deus, Isabella... ai, meu Deus, eu não consigo respirar...
Do outro lado da linha, o som da respiração dela era rápido, entrecortado — como se estivesse tendo uma crise de asma.
— Giuliana, você tá bem? Quer que eu chame um médico?
— Estou bem! Você não quer que eu esteja bem, mas eu tô ótima, entendeu? Se você não quer me contar o que respondeu ao papai, tudo bem. Mas saiba que eu não vou entrar nessa pra perder.
Nos vemos daqui a uma semana.— Nos vemos onde, Giuliana? Do que você tá falando? ... Giuliana?
Mas ela já tinha desligado.
Fiquei parada, com o celular no ouvido, ouvindo o silêncio.
Suspirei fundo, a curiosidade me corroendo, e abri meu e-mail.
Entre propagandas e spam, lá estava ele — um e-mail do meu pai. Enviado pra mim e pra ela.Li.
Cada linha, cada palavra. E, no fim, precisei respirar fundo outra vez.Aquilo podia ser real.
E podia ser também a minha salvação....Ou não.
Porque, sinceramente, nas minhas condições atuais, que chance eu tinha?
Saí do aplicativo de e-mail e voltei às mensagens.
O último texto do Alê ainda estava ali, piscando como um convite.Alessandro:
Podemos conversar a hora que você quiser, Bella.
Se estiver com qualquer problema, fala comigo.Foi aí que uma ideia completamente absurda me atravessou.
E eu nem pensei demais. Se pensasse, talvez desistisse. E eu precisava tentar.Digitei rápido:
Isabella:
Conversamos à noite, então.
Logo que você sair do escritório. E aguarde por uma grande surpresa.A resposta veio quase instantânea.
Alessandro:
Não sei se gosto das suas surpresas.
Mas ficarei aguardando.Larguei o celular no sofá, o coração acelerado.
Corri pro quarto. Precisava arrumar uma bolsa pequena, comprar passagens.Era pessoalmente que eu iria conversar com Alessandro.
E precisava me apressar se quisesse chegar a Nova Iorque ainda naquela noite....
Alessandro:
Nova Iorque – EUA
Eu deveria gostar de audiências de divórcio.
Afinal, eram o que sustentava meu escritório e enchiam minha conta bancária. Era a minha especialidade. E, na teoria, o que eu fazia de melhor.Quanto mais ferrenho o casal, quanto mais sangue eles estivessem dispostos a derramar um do outro, maiores os meus honorários.
Simples assim.Mas ultimamente, aquilo tudo me cansava.
Cada discussão parecia mais barulhenta, mais sem propósito.Como agora — minha cliente e o futuro ex-marido se digladiando dos dois lados da mesa de reuniões.
— A mansão de Los Angeles era dos meus pais! — o homem berrou, o rosto vermelho. — Nem fodendo você vai ficar com ela!
Pelo vocabulário, ninguém diria que se tratava de um ator milionário famoso pelos papéis de bom moço em Hollywood.
— Você nunca se importou com aquela casa! — minha cliente rebateu. — Se você quer tanto ficar com aquele maldito iate, é justo que eu fique com a casa de praia!
— Senhores, por favor... — pedi, respirando fundo. O advogado do homem já tinha desistido de intervir. — Se não há acordo, resolveremos no tribunal.
Reforço que minha cliente não está disposta a abrir mão da casa da Califórnia nem do apartamento em Boston. E como o senhor está inflexível, deixaremos que o juiz decida.— Isso é um absurdo! — o homem gritou, antes de ser puxado pra fora pelo advogado.
Fiquei observando o drama sair da sala.
Depois, voltei-me pra minha cliente, que me olhava com gratidão.— Fique tranquila. Eu vou garantir que você receba tudo o que merece — garanti. E o sorriso dela se abriu, confiante.
Era sempre assim.
No final, a parte que eu representava quase sempre levava a melhor. E, no fim das contas, era isso que me tornava o melhor na minha área.Mas, naquele dia... eu mal conseguia sentir satisfação.
Porque, por algum motivo que eu não entendia, o som da voz da Isabella ecoava na minha mente.
“Conversamos à noite... E aguarde por uma grande surpresa.”