A escuridão do corredor da casa dos Vieira de Sá era cortada apenas pelo brilho trêmulo da lamparina que Cecília segurava com mãos tensas. O silêncio da noite pesava em seus ombros como uma sentença, cada passo ecoando pelas paredes imponentes enquanto ela tentava se convencer de que precisava apenas de um copo de água – nada mais. Mas então, o destino – o terrível destino – colocou Max em seu caminho. Ele subia as escadas que levavam à adega, com uma garrafa de álcool na mão, a camisa branca com os primeiros botões abertos e a expressão sombria que parecia gravada em seu rosto desde sua chegada. O coração de Cecília acelerou no peito, o ar se tornando denso ao redor deles. Ele parou quando a viu, e por um longo instante, nenhum dos dois disse nada. Apenas ficaram ali, presos em uma tensão que ameaçava romper a frágil fachada que ambos tentavam sustentar. — Não consegue dormir? – A voz dele saiu baixa, rouca, quase um desafio. Ela ergueu o queixo, forçando uma compostura que
A tensão que envolvia Cecília e Max era densa como o ar antes de uma tempestade. O beijo entre eles se aprofundava em um misto perigoso de raiva, desejo e culpa. A cada toque, a cada suspiro abafado, ficava mais claro que nenhum dos dois conseguia resistir à força que os puxava um para o outro – mesmo quando tudo ao redor gritava que aquilo era errado. As mãos de Max, firmes e possessivas, desceram pela curva da cintura de Cecília, puxando-a contra ele, como se quisesse apagar qualquer distância que os separasse. O corpo dela respondeu imediatamente, o coração martelando dentro do peito, os nervos em chamas sob cada carícia. — Você não devia estar aqui… – murmurou ele contra os lábios dela, mas não houve qualquer convicção em sua voz. — E você não devia me querer – retrucou, as palavras saindo ofegantes enquanto suas mãos deslizavam pelos ombros largos, sentindo o calor que queimava sob a pele dele. Max soltou um riso baixo e amargo, pressionando-a mais contra a parede do corre
Cecília mal conseguia respirar ao fechar a porta do quarto, os dedos tremendo levemente enquanto tentava não fazer barulho. O corpo ainda latejava — uma mistura de culpa, raiva e desejo. Sentia a pele sensível onde as mãos de Max a tinham tocado, marcado. Deslizou para a cama ao lado de Helena, que dormia profundamente, alheia ao caos que se desenrolava dentro da irmã. Cecília tentou se cobrir e encontrar algum descanso, mas cada vez que fechava os olhos, via o rosto de Max. Os olhos intensos, a forma como seu nome soava mais grave na boca dele. O gosto dele ainda estava em sua língua. Ela não era mais a mesma mulher. E sabia que, se alguém descobrisse o que fazia nas sombras, o escândalo a destruiria. Na manhã seguinte, tentou ocupar a mente. Conheceu as dependências da casa, absorvendo cada detalhe do lugar que em poucos meses deveria chamar de lar. A Fazenda dos Vieira de Sá era diferente da sua. Onde a propriedade dos Monteiro de Alcântara era exuberante e festiva, es
Ele a puxou pela cintura e a boca dele desceu sobre a dela em um beijo desesperado e faminto. Cecília resistiu por um instante, mas depois derreteu em seus braços, as mãos agarrando sua camisa enquanto ele a pressionava contra a mesa de leitura. O gosto dela era como fogo e pecado, algo que ele jamais deveria tocar de novo — mas que não conseguia abandonar. Os dedos dele traçaram a curva do corpo dela sob o tecido fino da camisola, e ela arfou quando ele a puxou ainda mais para perto, o corpo dele moldando-se ao dela de forma indecente. — Eu te quero, Cecília — ele murmurou contra seus lábios. — Sempre quis. Ela não respondeu, mas o modo como seu corpo se curvava em direção a ele, como se procurasse cada toque, cada beijo, já dizia o suficiente. Mas então… o som seco de um livro caindo cortou o ar. Max congelou. Cecília ficou rígida em seus braços, o peito subindo e descendo em pânico. Ele se virou devagar… e o que viu fez seu sangue gelar. Eduardo estava parado na entr
O silêncio pesado que se seguiu após as palavras de Max era quase sufocante. Cecília ainda estava sentada, o rosto pálido e manchado de lágrimas, enquanto Max permanecia firme, mesmo com o lábio cortado e o sangue escorrendo lentamente em sua pele. Eduardo, por outro lado, parecia prestes a explodir de fúria novamente, o maxilar rígido e os punhos cerrados ao lado do corpo. — Você acha que tem o direito de defendê-la? — A voz de Eduardo cortou o ar como um açoite. — Depois do que vocês fizeram pelas minhas costas? — Eduardo… — Helena tentou intervir, a expressão angustiada ao ver os dois irmãos diante de um abismo tão profundo. — Por favor, tenta se acalmar. Não vamos resolver nada assim. — Se acalmar? — Ele soltou uma risada seca e descrente, passando a mão pelo cabelo em um gesto nervoso. — Minha noiva me traiu com o meu próprio irmão, Helena! Eu sou um idiota por ter confiado em ambos! — Não fala assim com ela — Max repetiu, a voz firme, mas havia uma dor crua em seus olhos.
O silêncio na casa dos Vieira de Sá era opressor. Apenas o estalo ocasional da madeira na lareira quebrava a tensão sufocante entre os dois irmãos restantes. Eduardo permanecia de pé, os ombros rígidos e a expressão fechada em um misto de raiva e decepção. Max, com o rosto ainda marcado pelos socos que recebera de Vicente e pelo peso das próprias escolhas, tentava conter a fúria que borbulhava em seu peito. — Eu ainda não consigo acreditar. — A voz de Eduardo soou áspera, cortando o silêncio como uma lâmina. — Você… com a mulher que eu ia me casar? Max passou a língua pelo corte no lábio inferior antes de responder, a voz rouca e carregada de emoção contida. — Não foi algo que eu planejei, Eduardo. Eu tentei… tentei me afastar. — Não tentou o suficiente. — Eduardo zombou, o tom carregado de sarcasmo e mágoa. — Eu sabia que o certo era deixar você e Cecília seguirem com esse casamento ridículo. — Max estreitou os olhos. — Mas toda vez que a via… Eu perdia o controle. O que exi
As semanas que se seguiram foram um turbilhão. Cecília sentia-se como uma marionete, arrastada de um cômodo a outro, de uma cidade a outra, enquanto as famílias corriam para reparar o que, aos olhos da sociedade, era um desastre irreversível. O casamento perfeito que ela teria com Eduardo – luxuoso, magistral, planejado nos mínimos detalhes – evaporou-se em meio ao escândalo. Em seu lugar, sobraram preparativos apressados, modestos, quase constrangedores. Não havia mais convites delicadamente caligrafados enviados às famílias mais influentes do Império. Agora, os convites eram poucos, entregues em mãos, acompanhados por sussurros e olhares de pena. Porque todos sabiam. Os rumores ecoavam pelas ruas de São Paulo e do Rio de Janeiro, espalhando-se como fogo em mato seco: "A impecável Cecília Monteiro de Alcântara foi desonrada." "Trocar um noivo por outro? Que vergonha!" "A pobre menina… Mal sabe que Max Vieira de Sá é um devasso, um libertino incurável. Se ele fez isso ao
A igreja era modesta demais para o que deveria ter sido o casamento perfeito. Não havia coro de músicos refinados ou arranjos luxuosos de flores frescas vindas da Europa. O altar simples destoava completamente do brilho e da grandiosidade que as famílias Monteiro de Alcântara e Vieira de Sá costumavam ostentar. Era um casamento às pressas. Um casamento forçado. E todos sabiam o motivo. Os cochichos mal-disfarçados ecoavam pelo ambiente abafado, palavras venenosas e olhares julgadores que Cecília fingia ignorar enquanto avançava, com passos calculados, em direção ao homem que, em breve, seria seu marido. "Desonrada." "Pobre moça, presa a um devasso como ele." "A perfeita Cecília trocou o noivo pelo cunhado… Que escândalo!" Cada sussurro parecia um golpe em seu orgulho, mas ela manteve a postura impecável – as costas retas, o queixo levemente erguido –, recusando-se a demonstrar qualquer fragilidade. Ainda assim, o coração pulsava descontrolado em seu peito. *** M