Mundo de ficçãoIniciar sessãoO som da chuva batendo no vidro criava uma melodia hipnótica, quase compassada com o ritmo do coração de Lívia.
Rafael ligou o motor, mas não saiu do lugar imediatamente.
— Posso te deixar no hotel da empresa? — perguntou, a voz grave, controlada, com aquele tom que parecia vibrar dentro da pele.
— Pode. — Ela manteve o olhar na janela, evitando encarar a intensidade que vinha do banco ao lado.
O carro começou a deslizar pela rua molhada. As luzes da cidade refletiam na pista, pintando o chão com tons de âmbar e azul.
— Você sempre fica tão séria fora do treinamento? — ele perguntou, quebrando o silêncio com naturalidade.
Ela deu um meio sorriso. — Eu sou assim.
— Não. — Ele riu baixo, sem ironia. — Você finge ser assim.
Ela o olhou de relance. — E o que exatamente você acha que eu sou, então?
— Intensa demais pra se esconder atrás de planilhas e apostilas. — A resposta veio rápida, quase como se ele já a tivesse estudado há muito tempo.
Lívia desviou o olhar, mas sentiu o corpo reagir.
— Eu não comecei nada — disse, firme, mas o sorriso no canto dos lábios o denunciava. — Foi você quem acendeu.
O nome dela na voz dele soava diferente — mais íntimo, mais certo, como se fosse um som que ele tinha prazer em repetir.
— Você fala desse jeito com todas as instrutoras? — provocou, tentando recuperar o controle.
— Só com as que me tiram o foco — respondeu, olhando a estrada, mas com um leve desvio no olhar. — E você tirou mais do que o meu foco.
O silêncio voltou, mas agora era carregado de eletricidade.
— Você é impossível. — disse, mais pra si mesma do que pra ele.
— E você é um desafio. — Ele respondeu, tranquilo, mas com um tom que a fez prender o ar. — E desafios são irresistíveis pra mim.
O carro parou em frente ao hotel. A chuva engrossou, riscando o vidro em mil linhas prateadas.
— Chegamos — murmurou, mas a voz saiu mais baixa do que pretendia.
Ele se virou lentamente, os olhos fixos nos dela.
Ela respirou fundo. — Eu tenho medo de mim… perto de você.
A frase ficou suspensa no ar, densa, verdadeira.
— Então não foge — disse, baixo, como um segredo. — Às vezes, é no perigo que a gente se encontra.
Lívia sentiu a respiração acelerar.
Abriu a porta, sentindo o ar frio da chuva bater no rosto.
Ele sorriu, aquele sorriso lento que parecia saber mais do que devia.
Ela saiu sem olhar pra trás, mas podia sentir os olhos dele no reflexo do vidro do carro.
Enquanto subia para o quarto, ainda sentia o som da chuva se misturar à voz dele dentro da mente, como um feitiço sussurrado.







