Layla
Se eu pudesse arrancar um pedaço da minha memória, teria escolhido aquela noite próxima ao ponto de ônibus. O beijo. A raiva. O arrepio que me perseguiu até o travesseiro.
Desde então, minhas horas são um campo de batalha: de um lado, a voz da razão dizendo que Kaleo é só um louco perigoso, um predador que gosta de ver suas vítimas tremerem, do outro, meu corpo me lembrando que eu não tremi de medo. Tremi de outra coisa.
Odeio admitir.
Na ONG, tento me distrair limpando gaiolas, catalogando remédios, sorrindo para crianças. Mas tudo volta. É como se cada corredor me lembrasse do tom dele… rouco, ameaçador, mas com uma fissura que me prendeu por segundos demais.
Sarah percebe, claro. Ela sempre percebe.
— Você está com a cabeça em outro planeta. — comenta, entregando uma caixa de petiscos de cachorro — Quer dividir a viagem ou prefere pagar taxa de excesso de bagagem?
— Estou só cansada. — Abro a caixa como quem abre um cofre — É normal.
Ela cruza os braços, aquele olhar de amig