Cheguei na empresa e fui direto à recepção.
— Bom dia! — falei, com meu melhor sorriso. A recepcionista me olhou como se eu tivesse entrado no prédio errado. — Pois não? Em que posso ajudar? — Aonde é que eu posso pegar a vassoura? — soltei, sem rodeios. Ela arregalou os olhos. — Como assim? — Sou a substituta da Márcia. — respondi, simples, como quem fala “sou dona do prédio”. — Ah… é… claro. — ela gaguejou, apontando para um canto. — Beleza, obrigada. Agora vou vestir a minha roupa de faxineira. Não é a versão mais glamourosa de mim, mas eu não vim aqui para desfile. Vim aqui para limpar. Minha função é essa, né? A mulher me olhou sem saber se ria ou se me fuzilava com os olhos. Eu completei, só pra deixar marcado: — E pode ficar tranquila: mesmo com o pé furado, eu garanto que até de muleta eu faço o serviço. Acho que ela me achou meio maluca, porque mal cheguei e já tava fazendo piada. Mas eu sou assim mesmo: melhor rir da vida do que chorar. Peguei o carrinho de limpeza, organizei os produtos e segui em direção ao escritório principal. E foi aí que aconteceu. Eu trombei com um armário humano no meio do corredor. Sério, parecia esculpido em pedra. Quase dois metros de altura, terno sob medida, olhar que me mediu de cima a baixo como se eu fosse sobremesa. Ele passou a língua nos lábios. Eu quase revirei os olhos. Pronto, mais um achando que brasileira é convite aberto. — Desculpa. — falei seca, desviando rápido. — Já tô indo. Tô aqui pra limpar, não pra virar brinquedinho. Quase caí de bunda com o impacto, mas, sinceramente? Ainda bem que bunda é o que não me falta. Como toda boa brasileira, se eu fosse pro chão, tinha amortecedor de sobra. Pedi licença, empurrei o carrinho e entrei no escritório principal. Claro, o armário humano veio atrás. Pronto. Agora deu. O que esse grandalhão quer atrás de mim? Me virei com o pano na mão. — Eu posso lhe ajudar em alguma coisa, senhor? Porque eu preciso fazer meu serviço, e o senhor aí atrás de mim parece sombra. Posso ajudar em alguma coisa? Ele não respondeu. Só me olhava. — Então tá. Senta aí e espera o chefe chegar, que eu vou trabalhar. — rebati, virando as costas. Fui direto pro banheiro. Limpei pia, espelho, vaso… e quase caí pra trás quando vi o lixo. — Camisinha… — murmurei, pegando com a pá. — Uma, duas, três! Pelo amor de Deus, esse patrão vem aqui pra trabalhar ou pra fazer sexo? Balancei a cabeça, terminei a faxina e voltei pro escritório. O homem estava sentado no sofá, firme, o olhar grudado em mim. Continuei arrumando a mesa, mas quando me virei, percebi: o safado não tirava os olhos da minha bunda. Revirei os olhos e soltei: — Tá sujo aqui atrás? Porque eu não tô menstruada, não. O senhor me desculpe, mas ficar olhando assim já tá se tornando inconveniente. E outra: o senhor é mudo ou é surdo? Ele arqueou a sobrancelha e, finalmente, falou: — Cadê a Márcia? Endireitei a postura. — Minha mãe está doente. Licença por esgotamento físico e emocional. Eu vou substituí-la durante um ano. — Você é filha da Márcia? — Sim. Sou filha da dona Márcia. — E como ela está? — Vai ficar bem. Eu e minha irmã estamos nos revezando. Eu cubro os empregos dela, minha irmã cuida dela em casa, e eu e meu pai seguramos as despesas. Fechei a gaveta da mesa com força. — Agora, se o senhor me dá licença, já terminei meu serviço e preciso ir pro próximo escritório. Ele sorriu de canto. — Obrigado. Ficou tudo muito bem-feito. Igualzinho ao trabalho da sua mãe. Foi nesse momento que eu caí de verdade. Literalmente. Tropecei no balde e sentei de bunda no chão. Olhei pra cima, pro rosto dele, e quase engoli a língua. Aquele homem não era funcionário nenhum. Aquele homem era o dono. — Gente do céu, — murmurei, sem acreditar. — Eu discutindo com o chefe!