Naquela noite, deveria estar ansioso para rever a ruiva do clube. Mas, pela primeira vez em anos, a vontade não veio. Eu só conseguia ouvir a frase martelando na minha mente:
“Eu não sou submissa.” Droga. Aquelas quatro palavras tinham o peso de um chicote. No meio da tarde, chamei Jeffrey ao meu escritório. Ele entrou com o jeito leve de sempre, espalhando energia. Sempre foi assim. Desde a adolescência, quando ainda éramos moleques dividindo férias na fazenda da família, ele já tinha esse riso fácil. Jeffrey não era apenas meu braço direito na empresa. Era meu primo. Meu amigo mais antigo. O único que sabia, de verdade, quem eu era fora dessas paredes. — Você viu a filha da Márcia? — disparei sem rodeios. Ele piscou os olhos, surpreso, e abriu um sorriso. — E não vi, menino? Um amor de pessoa! Soltei um suspiro pesado. — Um amor só se foi com você. Porque comigo… ela me deu cada cortada. Ele jogou a cabeça pra trás e riu com gosto. — Eu imagino! Garanto que você olhou pra ela com aquele seu olhar de lobo mau, não foi? Cruzei os braços, fingindo indiferença. — Eu só trombei com ela na entrada. Pediu desculpa, me olhou… e pronto. Mas não dá pra disfarçar: aquela mulher… até vestida de faxineira, parecia ter sido feita sob medida pra me tirar do eixo. Jeffrey ergueu a sobrancelha, debochado. — Mulher gostosa, né? Mas não é o meu tipo, você sabe. — É, eu sei— falei, deixando o silêncio pesar um instante. Ele se aproximou da mesa, se apoiando, com aquele ar sempre brincalhão, mas com fundo sério: — Ava é espirituosa. Igual a mãe dela. Eu adorei. Até mandei flores para a Márcia, pedi que fosse a Ava quem entregasse. Tomara que a Marcinha melhore logo, mas vou confessar: não reclamaria se a Avinha ficasse mais tempo por aqui. O nome ficou martelando na minha cabeça. Ava. — Ava, até combina comigo. Adán e Ava. Ele gargalhou, balançando a cabeça. — Não se iluda, primo. Aquela ali não é pro seu bico, não. Você gosta de mulher que se submete. E essa, nunca vai se submeter. — Até parece que você também frequenta o mesmo clube que eu — rebati, só pra provocar. Jeffrey estreitou os olhos, um sorriso malicioso se formando. — Pois é. Eu frequento. Mas a mesma fruta que você gosta, eu não como. Eu gosto da mesma fruta que a Ava gosta. Parei. Ainda que eu sempre soubesse da verdade, ouvir assim, jogado cru, ainda me fazia respirar fundo. Jeffrey nunca escondeu de mim quem era. Desde moleques, confidenciou em voz baixa, morrendo de medo da rejeição. Mas eu o abracei, sem pestanejar. Era meu primo. Meu amigo. E se eu escondia meu mundo de dominação entre paredes escuras de um clube, ele escondia a sua verdade dentro do armário. Talvez por isso sempre nos entendemos tão bem. Dois homens vivendo vidas paralelas, carregando segredos que não podiam ser expostos à luz do dia. — Eu vou ao clube porque lá eu encontro meus parceiros ideais. — Jeffrey falou, sincero. — Mas você, eu nunca entendi o que faz lá. Eu vou pra extravasar minhas frustrações. Agora você, primo, me diz, que frustração você tem? Fiquei em silêncio. Frustração. Essa palavra ecoou fundo. O problema não era a falta de mulheres. Eu tinha todas que queria. Não era a falta de dinheiro. Isso nunca foi questão. Era outra coisa. Algo que eu não sabia nomear. E, pela primeira vez em muito tempo, não consegui responder ao Jeffrey. Ele sorriu, como se entendesse meu silêncio. — Pois é. Pense nisso, Adán. Talvez a Ava esteja te mostrando uma frustração que você nunca percebeu que tinha. E eu soube, naquele instante, que ele estava certo.