A luz suave da manhã invadia o quarto pelas frestas da cortina branca, e Alicia acordou com a respiração quente de João em sua nuca. Ele a abraçava por trás, os corpos ainda colados, melados de prazer e suor da noite inesquecível. Por um instante, ela fechou os olhos e sorriu sozinha, sentindo o calor da pele dele contra a sua. Mas logo a realidade bateu: ela não sabia o nome dele. Nada além do que seu corpo havia aprendido durante a madrugada.
Com cuidado para não acordar ele, Alicia deslizou para fora da cama. Pegou o vestido jogado no chão, vestiu às pressas, recolheu os sapatos e, sem olhar para trás, saiu de fininho do quarto de hotel.
Ao chegar no quarto onde estava hospedada com as amigas, foi recebida com uma mistura de alívio e zombaria.
— Olha quem apareceu! — disse Marisa, rindo alto. — A sumida!
— E aí, o grisalho era tudo aquilo mesmo ou foi só efeito do álcool? — completou Júlia, segurando uma xícara de café.
Alicia jogou os sapatos no canto do quarto e se jogou na cama de solteiro, exausta, mas com o coração disparado.
— Ele era... inacreditável — murmurou, virando-se de lado. — Mas eu nem sei o nome dele.
— Como assim, mulher?! — as duas falaram ao mesmo tempo.
— Juro! A gente não trocou muitas palavras além de... bom, vocês imaginam.
Marisa gargalhou. — Sensacional. Você achou o homem da sua vida e nem sabe o nome dele. Essa vai pro grupo da família!
— Ele era diferente, sabe? Tinha algo nele... — Alicia murmurou, com o olhar perdido no teto. — Parecia que me conhecia sem precisar dizer nada.
Enquanto isso, no quarto do outro hotel, João acordava devagar. Estendeu a mão no espaço ao lado e encontrou apenas o lençol amassado e frio. Franziu a testa. Ela havia ido embora.
Se sentou na beirada da cama, passou a mão pelo rosto e suspirou. Por mais estranho que parecesse, ele queria ter acordado ao lado dela. Queria olhar nos olhos dela sem aquela penumbra cúmplice da noite anterior. Saber seu nome, ouvir sua voz sem ser entre gemidos e suspiros. Talvez até trocar telefone... qualquer coisa.
Mas tudo que ele sabia dela era que morava na mesma cidade que ele, no Brasil. Um detalhe solto demais no meio de tudo.
Antes que pudesse sequer tentar traçar um plano para procurar por ela ainda ali na Grécia, o celular vibrou na mesinha.
— Droga — murmurou ao atender. A notícia do outro lado da linha era urgente: precisaria voltar ao Brasil naquele mesmo dia, no próximo voo.
Sem tempo para pensar, João se levantou, se vestiu às pressas e chamou o serviço de quarto para fechar sua conta. Enquanto o carro do hotel o levava para o aeroporto, ele olhou pela janela, tentando ignorar o vazio estranho que crescia dentro de si.
Alicia tinha sido uma tempestade inesperada. E agora, tudo que restava era o rastro do furacão — e a sensação de que havia deixado algo importante para trás.
Dias depois...
O som das unhas de Duda batucando no balcão da recepção misturava-se ao leve barulho do ventilador girando no consultório iluminado de Alicia Carvalho. Era uma manhã comum, e a agenda estava cheia. Exatamente do jeito que ela gostava.
— Alícia, o seu paciente das nove chegou, tá um gato, viu? — avisou Duda, a secretária, com o sorrisinho maroto de sempre.
— Duda, foco no prontuário e menos nos tanquinhos dos pacientes, por favor — respondeu Alicia, ajeitando o jaleco branco e prendendo os cabelos num coque meio bagunçado.
— Mas qual o problema de unir o útil ao agradável? — brincou Duda, dando uma piscadinha.
Alicia riu e entrou na sala de atendimento. Recebeu o paciente com seu carisma profissional, ouviu sobre seus objetivos, ajustou o plano alimentar e fez todas as orientações com atenção. Era apaixonada pelo que fazia. Cada nova meta de um paciente era uma pequena vitória pessoal. Mas... entre um atendimento e outro, os pensamentos fugiam.
Grisalhos... olhos intensos... aquela pegada firme...
Ela sacudiu a cabeça disfarçadamente.
Chega, Alicia! Isso foi há meses. Já passou...
— Alícia! — a voz animada de Brenno, o office-boy do prédio, ecoou da porta. — Trouxe os papéis que você pediu e um bolo de banana da dona Carmem, pra adoçar sua manhã.
— Brenno, você é um anjo que usa tênis colorido e espalha purpurina por onde passa! — ela respondeu, abrindo os braços para um abraço.
— E você, meu amor, precisa urgentemente de um date! — disse ele, entregando os papéis. — Faz uma semana que você tá com cara de quem vê o sol e pensa num homem...
— Talvez porque eu vi o sol nascer com um. E nunca mais vi nem o nome dele — disse Alicia, rindo, mas com um fundo de verdade.
Brenno arregalou os olhos.
— Gata! O famoso caso de verão?
— Caso de verão, de lua cheia, de perdição total. Só sei que ele era mais velho, charmoso... e sumiu.
— Ai, que delícia de sofrimento! Me conta isso direito na hora do café! — pediu ele, todo empolgado, antes de sair rebolando pelos corredores.
No fim do expediente, Alicia fechou a última ficha do dia e se encostou na cadeira, exausta. Seu consultório era seu orgulho, sua conquista com muito esforço. Mas, mesmo rodeada de realizações, amigos e trabalho, ela ainda sentia falta... de algo. Dele.
— Talvez eu nunca mais veja aquele homem. Talvez tenha sido só isso: uma noite.
Mas seu coração não parecia muito de acordo com essa ideia.