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Mirela vestia o uniforme das funcionárias da mansão Azevedo. Não muito longe dela, um menino deixava a sala completamente bagunçada.

Ao ver Cecília entrar, Mirela se afastou de Vinícius e sorriu com delicadeza:

— Bem-vinda, senhora. Fui enviada pela Sra. Isadora para cuidar do Sr. Lucas.

Cecília mordeu o lábio com força. Até respirar doía.

Como ele tinha coragem? Como Vinícius ousava trazer os dois para dentro da casa deles?

Percebendo a tensão no rosto da Cecília, Vinícius se apressou em explicar:

— Amor, te mandei mensagem à tarde. Acho que você não viu. O Lucas Azevedo foi adotado pela mamãe num orfanato. Ela disse que sentiu uma ligação especial com ele.

Mas toda a dor que Cecília tinha dentro de si já havia sido gritada naquela sala de reuniões.

O que restava agora era raiva. Raiva fervendo no peito, queimando sem parar.

Estavam todos tirando ela por idiota.

— Vinícius... — A voz dela tremia. — Você fez tudo isso só pra me ferir?

Vinícius franziu a testa, surpreso com a reação dela.

— Bebê, não fica assim...

— Você sabe que a família Azevedo precisa de um herdeiro.

E eu te vi sofrendo tanto por aquele bebê que perdemos. Foi por isso que aceitei o pedido da mamãe.

— Mas se você não quiser, eu mando levarem o garoto embora agora mesmo!

Todos sabiam: Vinícius amava Cecília profundamente. Ela era, sempre, sua prioridade absoluta.

Como agora. Se Cecília não quisesse, ele seria capaz de mandar embora até o próprio filho sem pensar duas vezes.

E era justamente isso que fazia Cecília se sentir ainda enojada.

Cecília estava prestes a dizer tudo o que guardava no peito, quando o menino fez um beicinho e começou a chorar aos berros.

— Você é má! — Gritou Lucas, com a voz aguda. — Papai, por que você está com essa mulher má? Você não ama mais o Lulu?

O choro estridente ecoou pela sala, fazendo a cabeça de Vinícius latejar.

— Lucas! — Gritou Vinícius, furioso. — Quem te ensinou a falar essas bobagens?

Virou-se para os empregados, o olhar cortante.

— O que vocês estão esperando? Levem o Sr. Lucas pro quarto agora!

Três funcionárias se apressaram em conter o menino, que continuava gritando e esperneando, até que conseguiram levar ele para longe.

Mirela parecia completamente perdida. Se aproximou depressa e disse, aflita:

— Sr. Vinícius, a culpa foi toda minha. Por favor, não brigue com o Sr. Lucas.

Enquanto falava, lançou um olhar cheio de mágoa e doçura para Vinícius, um olhar tão carregado de sentimento que podia desarmar qualquer um.

Vinícius suspirou, o tom de voz suavizado:

— Não estou bravo com ele. Ele é só uma criança, não entende o que diz. Vai lá cuidar dele.

Cecília observava tudo. E, por dentro, só sentia mais frio.

Sem dizer uma palavra, se afastou de Vinícius e subiu as escadas. Ele a seguiu de perto, mas a porta se fechou bem na sua cara.

Ficou parado ali, ansioso, e ainda assim tentou manter a calma.

— Amor, a culpa é toda minha. — Disse ele, encostado à porta. — Amanhã cedo eu mando o menino embora.

— Se você não quiser que eu fique, tudo bem. Só... descansa um pouco, tá bom? Amanhã a gente conversa.

Do outro lado da porta, Cecília escorregou até o chão. Ouviu os passos dele se afastando, e percebeu que o coração já não doía, estava dormente.

Mandar o menino embora? Como se o sangue que corre entre pai e filho pudesse ser apagado assim. A verdade é que quem devia ir embora... era ela.

Não respondeu. Trancou a porta por dentro.

Se sentou no chão gelado, encostada à madeira fria. E quando os últimos ecos dos passos dele sumiram, desabou.

Se sentia exausta. Por dentro e por fora.

Não sabia quanto tempo havia se passado. O som de notificação do celular a tirou do torpor. Cecília deslizou o dedo pela tela, os movimentos lentos, automáticos. Era um pedido de amizade de uma conta desconhecida... Mirela.

[Sra. Azevedo, se expulsou o Sr. Vinícius do quarto, não venha reclamar que ele procurou a mim.]

As pupilas de Cecília se contraíram. Se levantou de imediato e saiu do quarto. Lá no fim do corredor do segundo andar, uma luz fraca escapava pela fresta da porta do escritório.

A porta estava entreaberta. E por aquele vão, chegou até ela uma voz feminina, sedutora:

— Vinícius... Você me machucou...

O grunhido dele veio em seguida, rouco e ríspido:

— Tá com medo de dor e mesmo assim me chama? Você já tem um filho e continua se oferecendo...

Cecília congelou. Todo o sangue do corpo parecia ter virado gelo.

Ele nem sequer esperou amanhecer.

Dentro do cômodo, Mirela arfava, tentando controlar os gemidos.

— Vini... Eu só queria te fazer sentir melhor... Vi como a sua esposa te tratou... Só quis te consolar.

— Você é cheia de desejo. Não inventa desculpa. E escuta bem: se quer que o Lulu continue na família Azevedo, não encosta mais na Cecília.

Cecília não conseguiu ouvir mais nada. Nem sabia como saiu dali.

Quando percebeu, já estava de volta ao quarto. Correu para o banheiro, se jogou sobre a pia e vomitou.

O estômago se contorcia, a dor vinha em ondas. Demorou até conseguir se levantar.

Ergueu os olhos para o espelho. O que viu foi uma mulher em frangalhos.

Mas as lágrimas... Essas já tinham secado. Ela era Cecília Lacerda. Filha da família Lacerda. Orgulhosa. Inquebrável. Jamais deveria ter se rebaixado assim.

Não sabia quanto tempo ficou no banheiro.

Mas só quando o céu começou a clarear, saiu de lá. Voltou para a cama.

Dessa vez, ela não o queria mais.

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