Eveline havia voltado brevemente à mansão Avelar naquela tarde. Lucas e Beatriz a receberam com os olhos cheios de esperança. — Você voltou? — perguntou Lucas, correndo para abraçá-la. — Por hoje. Mas prometo que, assim que o papai Daniel melhorar, estarei com vocês todos os dias. Beatriz a abraçou pelas pernas, sem dizer nada. Apenas se aninhou. Naquele gesto, Eveline entendeu o peso da sua ausência. Aqueles dois corações pequenos também eram dela. E estavam sofrendo. Ela contou uma história curta para os dois antes de voltar ao hospital. Deixou um bilhete em cada travesseiro. Um desenho de coração e a promessa de uma tarde no jardim em breve.No hospital Daniel dormia mais calmo naquela noite. A sedação havia sido retirada aos poucos, e embora o corpo ainda estivesse fraco, a consciência voltava em ciclos. Eveline permanecia ao seu lado, mas agora com menos angústia no rosto. O pior tinha passado. Ao menos fisicamente.Durante os dias em que ele esteve sedado, Eveline fez o po
A manhã seguinte trouxe um ar mais leve ao hospital. Pela primeira vez em dias, Daniel foi autorizado a ser transferido da UTI para um quarto de recuperação. A enfermeira avisou Eveline com um sorriso gentil enquanto ela tomava um café rápido no refeitório.— Ele está bem estável. Vai se recuperar melhor agora com menos aparelhos ao redor.Eveline sentiu um alívio discreto atravessar o peito. O pior, de fato, parecia ter passado. Com a ajuda de Clara, ela o acompanhou até o novo quarto, onde a luz entrava de maneira mais suave e as janelas mostravam um pedaço do jardim interno do hospital.Daniel, ainda pálido, sorriu ao ver o espaço mais arejado.— Quase um spa... — brincou.Eveline sorriu, se aproximando.— E com direito a enfermeiras que te trazem suco e pantufas personalizadas.Clara ajeitou os travesseiros com naturalidade e, após alguns minutos, deu espaço para que eles conversassem a sós.— Você precisa descansar, mas queria dizer uma coisa... — Eveline disse, com a voz baixa.
Na manhã seguinte, Clara chegou cedo ao hospital. Trazia consigo um livro novo e um suco fresco. Daniel estava acordado, mais disposto, com os olhos fixos na janela.— Trouxe companhia literária e vitamina C — disse ela, com aquele sorriso leve que já era familiar.— Já virou hábito, hein? Vai acabar me estragando — brincou ele.Ela se sentou ao lado da cama, e conversaram por mais de uma hora. Falaram da rotina na clínica, de pequenos casos curiosos, do futuro.Em dado momento, Daniel ergueu uma sobrancelha com leveza:— Seu namorado ainda anda com ciúmes do hospital?Clara desviou o olhar, riu baixo.— André agora é passado. E nem era ciúmes do hospital. Era de mim sendo quem sou... perto de quem me entende.Daniel não comentou. Mas a resposta dela o atravessou com uma força silenciosa. Havia algo ali — não dito — que ficou suspenso no ar.Pouco depois, Eveline chegou com um sorriso gentil. Gabriel havia ficado na mansão com a nova babá, e Lucas e Beatriz estavam em casa, já que era
A caneta escorregava entre os dedos finos de Eveline Rocha. O papel à sua frente tremia como se denunciasse o que ela não podia dizer em voz alta. Aquela não era uma assinatura de amor. Era um contrato de resgate. Resgate financeiro — não emocional.Sentada à mesa da sala de jantar, Eveline parecia pequena demais para a gravidade daquela decisão. A jovem de pele alva e cabelos negros como a noite encarava o documento com os olhos cor de mel marejados. Seu coração batia tão alto que podia jurar que os outros escutavam.Mas ninguém escutava nada naquela casa.Seu pai, Júlio Rocha, estava de pé ao lado da lareira, com os braços cruzados e a expressão fria como mármore. Desde que a fábrica da família — uma tradicional tecelagem herdada do avô de Eveline — começara a falir, ele já não a olhava como filha. Era uma moeda de troca, e nada mais.— Assine de uma vez, Eveline. Não temos o dia todo — disse ele com voz áspera, sem tirar os olhos do relógio de bolso que herdara como um troféu de te
Eveline observava, pela janela do carro, as vastas paisagens da fazenda, a estrada de terra, ainda um pouco empoeirada pela recente chuva, parecia não ter fim. O coração dela batia acelerado, mas ela tentava controlar as emoções. Era a primeira vez que estava indo para lá, e apesar de tudo, uma sensação de ansiedade misturada com curiosidade dominava seu corpo.Ela não sabia bem o que esperar. As palavras de seu pai, Júlio, ecoavam em sua mente: "Este casamento é sua salvação, Eveline. A nossa única chance." Ele e a madrasta, Claudia, tinham apostado tudo naquele matrimônio. Marcus Castelão não era apenas rico — ele era a última tábua de salvação para os negócios em ruínas da família Rocha. Eveline nunca pensou que um casamento, tão frio e imposto, pudesse ter algo de bom.Ela chegou à fazenda por volta do final da tarde, o céu tingido de laranja, como um aviso de que a noite estava prestes a cair. Quando o carro parou, não havia ninguém à porta esperando por ela, nada que lembrasse u
O jantar foi silencioso.Eveline sentou-se à mesa longa, comendo sob o olhar atento de Maria e os poucos funcionários que transitavam discretamente pela casa. Marcus não apareceu para comer com ela. A mesa, embora farta, parecia um palco vazio. Nada ali era acolhedor, e cada mordida parecia feita por obrigação.Depois do jantar, Maria levou-a de volta ao quarto. As malas já estavam no lugar, as roupas cuidadosamente organizadas no armário. A noite estava quente, e uma brisa morna entrava pela janela, balançando levemente as cortinas.Eveline trocou-se por uma camisola leve de seda vermelha, que Claudia fizera questão de colocar no fundo da mala. O tecido macio grudava em seu corpo como uma segunda pele, destacando sua silhueta. Ela hesitou em se olhar no espelho, mas o fez. Pela primeira vez, se viu com os olhos de um homem. Um homem como Marcus.Será que ele me deseja? Ou só me escolheu pelo ventre?Bateu à porta. Um toque firme. Ela se sobressaltou.Maria entrou.— O senhor Marcus e
O corpo de Eveline ainda tremia. A primeira vez deixara marcas que ela jamais esqueceria. Marcus, mesmo com seu jeito contido e palavras frias, havia sido intenso, dominador... e surpreendentemente carinhoso durante o ato. Mas, assim que seus corpos se separaram, a distância entre eles voltou a se instalar.Ela observava de lado, deitada nua entre os lençóis, o homem que agora se levantava da cama, recolocava a camisa e virava de costas.— Você pode ficar aqui. Amanhã, Maria irá te mostrar o resto da casa. — A voz dele voltou ao tom seco, formal. Quase impessoal.Eveline sentou-se lentamente, os cabelos caindo sobre os ombros nus, os seios ainda sensíveis. A frieza dele depois de tanta entrega era como um tapa.— É só isso? — a pergunta escapou de seus lábios sem que ela planejasse.Marcus virou-se devagar, os olhos verdes a examinando como se ponderasse cada palavra.— O que você esperava?Ela baixou os olhos, engolindo o gosto amargo do silêncio que se seguiu. Ele não disse mais nad
O sol entrou tímido pela janela, iluminando o quarto silencioso. Eveline despertou sozinha. A cama estava fria ao seu lado.Nenhuma carta. Nenhuma palavra.Levantou-se em silêncio, vestiu-se e desceu para o café da manhã. Maria já a esperava na cozinha com frutas frescas e pão caseiro.— O patrão saiu cedo para a lida com os assuntos da fazenda. Disse que tinha muito o que resolver hoje.— Ele... falou algo sobre mim? — Eveline perguntou, tentando soar indiferente.— Apenas que você deveria se sentir em casa — respondeu Maria, sorrindo com doçura. — Mas eu conheço aquele homem... tem coisa no coração que ele tenta esconder.O dia passou devagar. Eveline passeou pela fazenda, caminhou entre as árvores e acabou encontrando o jardim nos fundos da casa principal. Estava um pouco descuidado, mas ainda assim havia rosas, lavandas, jasmim... o cheiro a abraçou como um carinho silencioso. Ela sorriu.Ali, com a terra entre os dedos, ela sentia paz.No fim da tarde, ouviu o som dos cascos dos