Marcus ainda se recuperava da visita devastadora de Sabrina.Assim que ela saiu do escritório, com os saltos ecoando pelo corredor, Helena, aflita, surgiu à porta.Seus olhos ansiosos e a expressão fechada denunciavam o turbilhão de pensamentos que lhe corria pela cabeça.— Marcus — ela entrou, fechando a porta atrás de si —, pelo amor de Deus, o que aconteceu? O que aquela víbora veio fazer aqui? — perguntou, baixando a voz, mas carregada de indignação. — Você costumava dispensá-la em dois minutos! Agora recebe ela assim, dentro da nossa casa?Marcus soltou um suspiro cansado, passando a mão pela nuca como se buscasse forças para falar.Sentou-se na poltrona diante da lareira apagada e encarou a mãe com olhos opacos.— Ela veio... — começou, a voz rouca. — Ela veio dizer que talvez esteja grávida.Helena arregalou os olhos, levando as duas mãos à boca, em choque.— Pelo amor de Deus, Marcus! — exclamou, abafando o grito. — Como você pôde deixar isso acontecer?Marcus fechou os olhos,
O nono mês de gravidez trouxe a Eveline uma serenidade que ela não imaginava possuir. A barriga alta, firme, era agora um símbolo vivo da transformação que atravessava seu corpo e sua alma. Gabriel estava quase pronto para vir ao mundo, e cada pequeno movimento dele fazia seu coração vibrar em uma mistura de alegria, ansiedade e, no fundo, um leve medo do desconhecido.A casa da Família Avelar respirava esse clima de expectativa. Daniel organizava tudo com extremo cuidado: revisava malas de maternidade, revezava plantões na clínica para poder ficar mais tempo em casa, e não desgrudava de Eveline sempre que podia.As crianças, Lucas e Beatriz, viviam empolgados. Cada dia trazia novas perguntas sobre o bebê, sobre o irmãozinho que logo nasceria. Lucas queria ensinar futebol a Gabriel. Beatriz queria ensiná-lo a desenhar flores. Eveline sorria com o entusiasmo deles, sentindo que, de certa forma, já formavam uma verdadeira família.Numa tarde de céu azul e vento suave, Clara apareceu par
O sol tímido começou a invadir o quarto, lançando raios dourados pela cortina entreaberta. Eveline sentiu o calor suave na pele antes de abrir os olhos.A primeira coisa que notou foi o peso acolhedor do braço de Daniel envolvendo sua cintura, seus corpos encaixados com delicadeza, como peças de um quebra-cabeça feito sob medida.Daniel já estava acordado, mas permanecia imóvel, respirando o perfume adocicado dos cabelos dela, sentindo o calor de seu corpo junto ao dele.Um sorriso suave se formou nos lábios dele. Aquele era o tipo de felicidade que nem todo dinheiro ou sucesso poderiam comprar.Ele a beijou suavemente na nuca, sentindo-a se remexer levemente sob seu toque. Depois deslizou a mão até sua barriga alta, acariciando-a com ternura.— Bom dia, meus amores — sussurrou.Eveline virou-se devagar para encarar Daniel. O olhar dele era puro, sincero, cheio de uma esperança quase juvenil.Ele acariciou seu rosto com a ponta dos dedos e, com a voz rouca pela emoção contida, disse:
Eveline acordou devagar, sentindo o peso confortável de Gabriel em seu ventre, agora imenso e firme.Um sorriso tranquilo brotou em seus lábios. Estava nos últimos dias da gestação — e, embora a ansiedade a rondasse, havia também uma paz difícil de descrever.Depois de se arrumar com cuidado — optando por um vestido leve de algodão azul claro —, Eveline foi até os quartos de Lucas e Beatriz para ajudá-los a terminar de organizar as mochilas antes da escola.— Tia Eve! — Lucas exclamou, com um sorriso maroto. — Hoje tenho prova de matemática! Você acha que vou bem?Eveline se abaixou com dificuldade e arrumou a gola da camisa dele.— Tenho certeza de que vai ser o melhor da turma, campeão.Beatriz, com um vestido rodado cor-de-rosa, veio até ela segurando uma fita de cabelo.— Coloca pra mim? — pediu com aqueles olhos brilhantes de esperança.Eveline prendeu a fita nos cabelos dourados da menina, sorrindo com ternura. Cada pequeno gesto fazia seu coração aquecer.Depois de acompanhá-lo
A madrugada ainda cobria a cidade com seu véu silencioso quando Eveline acordou com uma dor diferente, profunda e ritmada no baixo-ventre. Não era como as contrações de treinamento que vinha sentindo — era real, intensa, e carregava consigo a promessa do encontro tão esperado.Ela levou a mão à barriga, acariciando a curva arredondada com ternura. Gabriel se mexeu levemente, como se também soubesse que havia chegado o momento.— Está na hora, meu amor — sussurrou com a voz embargada.Daniel, sempre atento, percebeu a movimentação e correu até o quarto. Vestido de maneira casual, mas com olhos treinados e coração ansioso, se aproximou dela num gesto instintivo de proteção.— As contrações começaram? — perguntou com calma, embora a preocupação transparecesse em sua voz.Eveline apenas assentiu, incapaz de responder enquanto outra onda de dor a atravessava.Com eficiência e carinho, Daniel a ajudou a vestir-se, pegou a bolsa de maternidade previamente arrumada e a conduziu ao carro. No c
Marcus estacionou o carro diante da clínica particular, os dedos crispados no volante. O dia estava nublado, como se o próprio céu compartilhasse do peso que carregava nos ombros.Ele não queria estar ali. Não queria encarar Sabrina, nem reviver a noite que mal conseguia lembrar. Mas sabia que precisava pôr um fim definitivo naquela história.Por Gabriel. Por Eveline. Por si mesmo.Respirou fundo, tentando acalmar o turbilhão dentro do peito, e saiu do carro.A recepcionista o conduziu até uma sala discreta. Sabrina já o aguardava, elegantemente vestida, com o sorriso cínico que ele tão bem conhecia.— Achei que ia desistir — provocou ela, cruzando as pernas com afetação.Marcus manteve a expressão fria.— Vim porque quero encerrar isso. De uma vez por todas.Ela ergueu uma sobrancelha, divertindo-se com a tensão dele.— Não tem nada para encerrar, Marcus. Estou grávida. Você vai ter que aceitar.Marcus respirou fundo, controlando o impulso de sair dali.— Quero um exame. Agora. Feito
A caneta escorregava entre os dedos finos de Eveline Rocha. O papel à sua frente tremia como se denunciasse o que ela não podia dizer em voz alta. Aquela não era uma assinatura de amor. Era um contrato de resgate. Resgate financeiro — não emocional.Sentada à mesa da sala de jantar, Eveline parecia pequena demais para a gravidade daquela decisão. A jovem de pele alva e cabelos negros como a noite encarava o documento com os olhos cor de mel marejados. Seu coração batia tão alto que podia jurar que os outros escutavam.Mas ninguém escutava nada naquela casa.Seu pai, Júlio Rocha, estava de pé ao lado da lareira, com os braços cruzados e a expressão fria como mármore. Desde que a fábrica da família — uma tradicional tecelagem herdada do avô de Eveline — começara a falir, ele já não a olhava como filha. Era uma moeda de troca, e nada mais.— Assine de uma vez, Eveline. Não temos o dia todo — disse ele com voz áspera, sem tirar os olhos do relógio de bolso que herdara como um troféu de te
Eveline observava, pela janela do carro, as vastas paisagens da fazenda, a estrada de terra, ainda um pouco empoeirada pela recente chuva, parecia não ter fim. O coração dela batia acelerado, mas ela tentava controlar as emoções. Era a primeira vez que estava indo para lá, e apesar de tudo, uma sensação de ansiedade misturada com curiosidade dominava seu corpo.Ela não sabia bem o que esperar. As palavras de seu pai, Júlio, ecoavam em sua mente: "Este casamento é sua salvação, Eveline. A nossa única chance." Ele e a madrasta, Claudia, tinham apostado tudo naquele matrimônio. Marcus Castelão não era apenas rico — ele era a última tábua de salvação para os negócios em ruínas da família Rocha. Eveline nunca pensou que um casamento, tão frio e imposto, pudesse ter algo de bom.Ela chegou à fazenda por volta do final da tarde, o céu tingido de laranja, como um aviso de que a noite estava prestes a cair. Quando o carro parou, não havia ninguém à porta esperando por ela, nada que lembrasse u