Passei um momento em choque após a senhora Elis exigir que me casasse com Tarso. Eu não estava acreditando. Levantei-me do sofá e fiquei em silêncio por alguns minutos. Só assim a voz voltou.
— A senhora está brincando, não é, senhora Elis? Eu e Tarso não temos nada a ver um com o outro. Não tem outra maneira? — pergunto, surpresa, e a senhora Elis me interrompe. — Não tem, Emília. O acordo foi feito anos atrás, que um dia eu cobraria tudo o que investi em você e na Alicia. Caso não aceite o que estou impondo, dê adeus ao seu cargo geral dos hospitais Navarro e à residência da Alicia em um dos melhores hospitais dessa cidade, que você sabe muito bem que não há melhor do que o meu hospital. — Eu aceito. A senhora sabe da gratidão que tenho por apostar tão alto em mim e na Alicia, e não serei ingrata a tal ponto. O que vou ter que fazer? Sabe que Tarso vai recusar o casamento com uma desconhecida! — pergunto, aflita. — Você é uma garota de ouro, Emília. Você é meiga, linda, doce, educada, paciente. Irá consertar a vida torta que Tarso leva, e, com o seu jeito, irá conquistá-lo — a senhora Elis fala, tranquila. — Senhora Elis, ninguém tem o poder de mudar ninguém — falo, pondo as mãos nos olhos em tamanho desespero. — Mas vai tentar — a senhora Elis fala, exaltada. — E se eu não conseguir consertá-lo? Vi no jornal o quanto ele tem personalidade forte, é destemido — falo, andando de um lado para o outro. — Olha só, Tarso já te chamou atenção. Isso é um bom sinal. Eu só quero ver Tarso longe das páginas policiais, e agora essa missão é sua. Elis beija o meu rosto e sai, andando lentamente, deixando-me totalmente intrigada. Olho novamente a foto do Tarso e fico pensando como vou fazer para esse homem mudar, o que as pessoas irão falar de mim, desse casamento com Tarso, que tem uma bela ficha pela polícia. Mas existe a hipótese de ele não aceitar. E, se aceitar, onde vamos morar, como vamos viver? A minha cabeça está cheia de interrogações. Pensei tanto que quase perdi a hora do trabalho. Ao chegar nele, visto o melhor sorriso, como sempre fiz na vida. Não posso sofrer por antecipação, até porque, não faz bem para o meu coração. Entro no meu escritório, e a minha assistente começa a trazer alguns documentos. Os pensamentos sempre voltam às palavras da senhora Elis. Alicia entra de uma vez no meu escritório. — Emília, o Castro não quis nem olhar na minha cara! — Alicia fala, e ela me conhece muito bem e sabe que aconteceu algo. — Senta, minha irmã. Conte-me o que aconteceu — falo, desanimada. — Emília, sou sua irmã. Sei que você não está bem. Por favor, me conta agora o que aconteceu. Nunca escondemos nada uma da outra. — A senhora Elis me procurou, e chegou a hora de pagar tudo o que ela fez por nós. — Ela tirou você da administração dos hospitais? Ninguém nunca vai cuidar tão bem disso aqui como você, Emília — Alicia fala, indignada. — Não é isso, Alicia. Ela exigiu que eu me case com Tarso. — Ela ficou louca? Aquele cara é o maior problema. A senhora Elis não está batendo bem da cabeça — Alicia levanta-se. — A senhora Elis está ótima, Alicia. Quem não estava éramos nós duas, quando vivíamos naquele orfanato, e ela nos resgatou de lá. Enfim, se ele aceitar, serei apresentada como noiva dele. Alicia, eu choro porque não sei o que me espera, entende? Mas não me arrependo de ter assinado aquele documento. Olha, você, Alicia, é independente, tem a sua profissão. Eu vou ficar bem! Estou preparada para tudo o que vier, porque sou uma mulher forte. — Emília, como tenho orgulho de você! O mundo desabando sobre você, e eu chorando por um homem que não me quer. Sabe o que eu acho mais lindo em você, Emília? Que tudo o que você toca, aonde chega, tudo resplandece. E não será diferente na vida do Tarso. — Lindas as suas palavras. Estou bem, Alicia. Recebo o abraço dela, e ela enxuga as minhas lágrimas e me conforta. Retorno para o meu trabalho. Faço questão de ir visitar hoje o departamento oncológico daqui. Como é bom dar força a quem está precisando de afago em meio a tantos problemas! É bom ver que tem pessoas se curando aqui no hospital. Após essa visita, tenho reuniões para ajustar alguns detalhes de novos projetos, e um deles é a construção de mais uma unidade hospitalar. Sempre que posso, olho as notícias para saber se Tarso foi solto, e ele não foi, o que me faz entender que ele não aceitou. Mas não comemorei, porque a senhora Elis não ia me propor algo assim se ele não aceitasse. Não almocei. Tentei voltar os meus pensamentos somente para o trabalho. Estou à frente do meu computador, e Allan chega. — Olá, Emília, como está? Não te encontrei no restaurante. — Estou sem fome, Allan, mas estou bem. O seu plantão, como foi hoje? — pergunto. — Foi ótimo, mas estou triste porque o meu irmão foi preso. Ele foi embora muito cedo. Não tive mais contato com Tarso. Sempre que falávamos nele, a mamãe desconversava. — Entendo, Allan, a sua tristeza, mas agora ele voltou, e vocês terão todo o tempo do mundo para se unir novamente. — Quando terminar o meu plantão, vou visitá-lo na cadeia. — Com certeza, o seu irmão irá ficar feliz com a sua visita — falo, triste. Allan sai, e posso ver o quão profundas são as cicatrizes dessa família e o quanto vou ter trabalho em juntar os cacos deixados pelo tempo. Eu não nasci para desistir. Não posso desistir. Enquanto trabalho, peço forças a Deus, e nada da senhora Elis me ligar para falar se Tarso aceitou essa loucura imposta por ela. Trabalhei até a noite, e o celular, enfim, tocou. Era quem eu pensava ser, a senhora Elis. Criei coragem e atendi o celular. — Senhora Elis! — Tarso aceitou o casamento. Em dois dias, casará com ele. Amanhã, compre um vestido de noiva tradicional. Ele exigiu um casamento tradicional, com direito a cerimônia na igreja, dama de honra e muitos convidados — a senhora Elis fala, pausadamente. Fiquei muda do outro lado da linha, não acreditando no que acabei de ouvir. Só falta ele exigir noite de núpcias e que eu durma na mesma cama que ele. Fiquei vermelha só em pensar. — Emília, está viva do outro lado da linha? — a senhora Elis pergunta. — Estou, sim — falo, desanimada. — Já sabe o que fazer. Emília, antecipe-se. Tem que estar pronta nesses dois dias. Amanhã, conversaremos para dar mais detalhes. A senhora Elis desliga o telefone, e fico completamente nervosa. Dois dias é muito pouco para um casamento assim. Em se tratando de Tarso, não sei o que esperar. Já estou com medo desde agora, mas não posso demonstrar.